A direita anunciou o fim do ciclo sem contar com o retorno de Cristina

Depois de duas vitórias em 20 anos – Mauricio Macri na Argentina e o Legislativo na Venezuela – a direita latino-americana já considerava uma virada do jogo na região. Mas o retorno de Cristina Kirchner, ao anunciar sua candidatura ao Senado e o lançamento de uma coalizão de esquerda, parece desestabilizar novamente as peças do xadrez.

Por Mariana Serafini

Cristina Kirchner - Telám

Depois que o candidato apoiado por Cristina perdeu as eleições presidenciais em 2015, ela se refugiou em sua terra natal, na Patagônia, prometendo voltar. E o fez em grande estilo, ao lotar com mais de 25 mil pessoas o estádio do Clube Arsenal Sarandí, em Buenos Aires, para anunciar lançamento da Unidade Cidadã, uma coalizão de partidos de esquerda cujo objetivo é barrar o avanço do neoliberal Maurício Macri.

Em meio à crise econômica que abala a Argentina, com os mais altos índices de inflação e desemprego dos últimos anos, Macri se vê ameaçado ao receber a notícia deste retorno triunfante de Cristina que neste sábado (24) anunciou sua candidatura ao Senado para as próximas eleições.

O anúncio balançou as estruturas do governo Macri e acendeu a esperança de uma retomada de fôlego do chamado “ciclo progressista” da América Latina. No Senado, Cristina será a principal líder da oposição e certamente vai pavimentar seu caminho de retorno à presidência em 2019. Além disso, será peça chave para tentar barrar as reformas e reajustes impopulares do presidente que atingem diretamente os argentinos mais pobres.

É justamente entre os argentinos mais pobres que o eleitorado de Cristina se consolida. Não à toa, a imprensa local tem feito comparações com Eva Perón. Desta vez, porém, com a bagagem de dois mandatos presidenciais e uma articulação invejável com outros líderes da esquerda latino-americana.

A contraofensiva que a direita não esperava

O fortalecimento político de Cristina não mexe só no xadrez argentino, mas também no cenário regional. Até porque a coalizão Unidade Cidadã parece pender mais à esquerda que a anterior, Frente Para a Vitória. Desde que Hugo Chávez assumiu a presidência da Venezuela em 1999 e deu início ao ciclo progressista, a direita teve apenas duas vitórias: Maurício Macri na presidência da Argentina e o Legislativo na Venezuela. Fora isso, para desestabilizar o tabuleiro, recorreu a três golpes de Estado: Manuel Zelaya em Honduras (2009), Fernando Lugo no Paraguai (2012) e Dilma Rousseff no Brasil em 2016.

Quando o jogo parecia estar pendendo novamente à direita, o Equador mostra que os anos de avanços populares podem garantir a continuidade do ciclo, afinal, nas últimas eleições presidenciais, em abril passado, o candidato eleito foi o vice-presidente de Rafael Correa, Lenín Moreno.

Com a implementação do Acordo de Paz entre as Farc e o governo da Colômbia, 2018 pode ser o primeiro ano da guerrilha na disputa eleitoral oficial. Lugo pavimenta seu retorno à presidência do Paraguai pós-golpe, depois de cumprir um mandato como senador. Já no México, pela primeira vez desde 1994, os zapatistas apresentaram uma candidatura à presidência, trata-se de Marichuy, uma médica indígena. Além disso, com o desastre do governo neoliberal de Enrique Peña Nieto, o candidato progressista Andrés Manuel López Obrador, do partido Morena, tem aparecido em segundo lugar nas pesquisas eleitorais.

Ainda neste ano acontecem as eleições no Chile e o Partido Socialista, da atual presidenta Michelle Bachelet, tenta continuar no cargo. A candidata mais provável é Isabel Allende, filha do ex-presidente Salvador Allende. Para fechar, a esquerda Brasileira debate a conjuntura para retomar as rédeas nas eleições de 2018. O retorno de Cristina desde o sul pode levar a uma nova onda e depois de uma década e meia de reformas, o ciclo deve seguir seu curso.