GGN: Mesmo tentando poupar Aécio, delator revela o que está por vir

Apesar de clara intenção da mira do depoimento de Claudio Melo Filho, ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht, ser a cúpula do PMDB e do governo Michel Temer, sendo apenas o presidente citado 43 vezes nas 82 páginas de delação à Lava Jato, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) não conseguiu sair ileso do primeiro dos 77 delatores da empreiteira na investigação.

odebrecht-psdb - Reprodução GGN

No documento, Melo Filho tenta explicar aos procuradores da República e delegados da Polícia Federal como funcionava os repasses de caixa 2 da empreiteira aos políticos, seguindo a superplanilha da Odebrecht, encontrada em apreensões desde março deste ano. Isso porque o nome do delator era relacionado diretamente a parte desses repasses, em anotações nos arquivos.

Foram em dois momentos que o nome de Aécio Neves apareceu nos relatos. Na primeira vez, é uma acusação direta ao senador José Agripino Maia (DEM-RN), e Aécio teria pedido à companhia o repasse de R$ 1 milhão ao parlamentar, como contrapartida de apoio da sigla na eleição presidencial de 2014.

O delator conta, ainda, que entrou em contato direto com Agripino, por meio de seus telefones celulares, marcando um encontro realizado em seu gabinete, na Ala Afonso Arinos do Senado. Á época, apesar de Agripino não estar se candidatando a cargos nas eleições de 2014, o repasse foi feito, entre os dias 13 e 17 de outubro daquele ano.

"Além disso, quando a mídia ventilou que, em eventual vitória de Aécio Neves na campanha presidencial de 2014, o Senador José Agripino poderia ser postulante ao cargo de Ministro de Minas e Energia, estive com o parlamentar", completou Claudio Melo Filho.

O segundo trecho de citação direta do primeiro dos delatores da Odebrecht em referência a Aécio é sobre seu codinome. No capítulo "explicação sobre outros pagamentos identificados em planilhas relativa a pagamentos nas eleições de 2010", o ex-diretor da empreiteira tenta se abster de acusações diretas ao senador tucano, mas não nega que os apelidos realmente faziam referência a esses políticos.

"Há algumas informações constantes nas planilhas da empresa, que relacionam, de alguma forma, meu nome a pagamentos que supostamente foram realizados a pessoas identificadas por diferentes codinomes, os quais não reconheço e posso afirmar que não participei de eventuais tratativas e nem de qualquer fase da formalização dos pagamentos", diz a delação.

Um deles era o "Mineirinho", que é Aécio Neves. O fato de Cláudio Melo não ter sido o responsável da companhia por intermediar esses repasses o impossibilitou de esclarecer detalhes dessas transações, como ocorreram e quais interesses estava envolvidos.

"Após ter ciência de que a planilha associava meu nome aos pagamentos associados aos codinomes acima, soube internamente que se tratava, de fato, de um erro contido na planilha, e que os autores dos pagamentos já haviam sido identificados e que seriam esclarecidos pelos responsáveis", completou o ex-executivo.

Por outro lado, ao confirmar que o apelido era uma referência ao tucano, basta recorrer aos dados da superplanilha da Odebrecht para se chegar a conclusões preliminares dessas remessas.

No pedido de busca e apreensão realizado na 26ª fase da Operação Lava Jato, denominada Xepa, Mineirinho foi apontado no documento como receptor de R$ 15 milhões entre 7 de outubro e 23 de dezembro de 2014. A entregas teriam sido feitas em escritório de Belo Horizonte, em Minas Gerais.

A autorização do pagamento teria sido feita pelo diretor superintendente da Odebrecht Infraestrutura para Minas Gerais, Espírito Santo e Região Norte, Sérgio Neves, à então secretária do Setor de Operações Estruturadas (denominado pela Lava Jato como o departamento da propina), Maria Lúcia. Em delação, a ex-funcionária já admitiu operar em "contabilidade paralela" a mando de seus superiores.

Em resposta, a assessoria de imprensa do PSDB de Minas afirmou que os R$ 15 milhões foi o total doado pela Odebrecht à campanha do PSDB em 2014, e que foi declarado à Justiça Eleitoral.

Entretanto, além das referências nas planilhas ao codinome, Aécio também foi arrolado diretamente naquele momento de apreensão dos documentos. O parlamentar tucano também é incluído nos pagamentos feitos no ano de 2010, aparecendo como beneficiário de R$ 120 mil da empreiteira.

Em março, quando as informações vieram à tona, o senador disse em nota que era preciso "com serenidade" separar "o joio do trigo" nesses documentos.

A revelação da primeira das delações apresentam o sinal verde para o que virá dos depoimentos dos outros 77 executivos da Odebrecht. Isso porque já se sabe, desde julho deste ano, que os delatores da companhia não tinham receio de mencionar o senador tucano nos acordos.

Mas, de lá para cá, muitas mudanças e negociações ocorreram do lado dos investigadores da Lava Jato, até que o aguardado acordo de delações e leniências fossem fechados, apenas no fim deste ano.

E não será só o parlamentar, candidato derrotado nas eleições à Presidência de 2014, que estará na mira dos depoimentos da Odebrecht. Todas as frentes do partido devem ser atingidas: além de Aécio, o ministro de Relações Exteriores e o mais próximo do governo Temer, José Serra, e o governador de São Paulo, outro postulante às eleições presidenciais, Geraldo Alckmin.

Em relação a este último, a Folha já divulgou reportagem na última sexta-feira (09), mostrando o teor das acusações, confirmando que o governador é mesmo o "Santo" das planilhas e teria recebido R$ 2 milhões em dinheiro vivo para as suas campanhas de 2010 e 2014 ao Estado de São Paulo.

Com relação à Alckmin, o TSE não registra nenhuma doação direta da Odebrecht à conta de campanha do candidato tucano, tanto em 2010, quanto em 2014. O único registro é de doação oficial da Braskem, um dos braços da empreiteira, na quantia de R$ 100 mil para o ano de 2010.

Ainda, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também poderá sofrer as consequências do que se considera o maior acordo da Lava Jato. Isso porque, ainda no início de novembro, um laudo da Polícia Federal levantava suspeita sobre o repasse da Odebrecht de R$ 975 mil ao Instituto Fernando Henrique Cardoso entre dezembro de 2011 e dezembro de 2012.

As quantias foram divididos em "mesadas", 11 pagamentos de R$ 75 mil e um de R$ 170 mil. O Instituto recebeu da construtora um total de pelo menos R$ 975 mil, segundo os registros de contabilidade da empreiteira.

Informações sobre os beneficiários tucanos de repasses ilegais deverão ser esclarecidas por outros delatores da companhia. Enquanto isso, a Procuradoria-Geral da República quer investigar o vazamento do depoimento de Claudio Melo Filho. Vazamentos, por serem ilegais, podem gerar a anulação do acordo.