Feminicídios na Itália: uma mulher assassinada a cada 72 horas

O feminicidio constitui atualmente um problema grave na Itália, onde uma mulher é assassinada a cada 72 horas.

Protesto contra feminicídio em Roma, Itália

O presidente Sergio Mattarella qualificou de 'inaceitável, uma ferida para toda a sociedade' a violência contra a mulher, conduta que degrada a dignidade humana, reflexo do abandono dos valores de nossa civilização baseada na igualdade de todas as pessoas e os cidadãos.

Todos os esforços e as ações destinadas a combater a violência de gênero devem estar firmemente apoiados, sobretudo aquelas iniciativas orientadas a apoiar às vítimas e aos filhos que sofrem também as consequências de atos tão degradantes.

Para Paola Dei Nicola, juíza de investigações preliminares do Tribunal de Roma, feminicídio e máfia, são mais do mesmo, têm o mesmo valor cultural, social e criminoso e como tal devem ser tratados.

Paola considerou que o Estado deve fazer iguais esforços para enfrentar o assassinato de mulheres, como os que realiza contra a máfia, pois o feminicídio se vê como um fato comum, entronizado na sociedade como 'algo inevitável', lamentou.

"Não existe consciência cultural, social e política frente ao problema e as mulheres vítimas de violência se encontram em um contexto de silêncio, rejeição e negação, como ocorre com a máfia", precisou Paola, autora do livro, 'A Juíza, uma mulher na magistratura'.

Em 70% dos 116 feminicídios ocorridos na Itália neste ano, as mulheres denunciaram anteriormente ao agressor, mas "muitas vezes os acontecimento produzem-se e são analisados isoladamente", denunciou.

Também é objeto de estudo, e devia ser de maior atenção, o que se costuma chamar preconceito cultural, que ante um ato de violência ninguém intervém nem denuncia o caso pelo aquilo de "não imiscuir-se na vida privada das pessoas".

Ainda que também, como ocorre em outras latitudes, sobretudo quando a legislação ao respeito é débil e não protege como tal às mulheres, se dão os casos de mulheres que calam diante dos atos de violência e assédio de seus maridos, e inclusive chefes e temem desde perder o posto de trabalho, até a tutela dos filhos.

Todavia mais que isso, encaminhar nesta sociedade um processo por violência constitui um ato tormentoso para qualquer mulher, pois a chamada avaliação da credibilidade da vítima é com frequência bem mais perspicaz, intrusiva, específica e profunda que para qualquer outro tipo de delito, mais ainda em casos como estes, ocorridos com frequência em recintos fechados, sem testemunhas.

Sucede também que a cada denúncia se vê como um fato isolado, não há um rastreamento um "assédio aos atos de violência", daí que a cada três dias ocorra um assassinato feminino na Itália.

Até onde se conhece, a última mulher privada da vida foi morta nesta quinta-feira (24), uma peruana de 29 anos estrangulada por seu marido (italiano de 56) diante de seus filhos, porque não podia aceitar a "afronta" dela deixá-lo.

Outro que matou a mulher, suas duas filhas e depois se suicidou para que sobre elas não pesassem suas dívidas por jogos de azar.

Armas brancas e de fogo, estrangulamento e incineração são os meios e métodos mais utilizados nos crimes.

São 116 histórias diferentes de assassinatos, a maioria no norte de país (53,4%) e no seio da família (75,9%) vítimas com uma média de idade de 50,8 anos, crimes cometidos por homens em 92,5% dos casos.

Por regiões, a Lombardía tem o maior número de vítimas com 20, seguida de Véneto (13), Emilia Romaña (12), Toscana (11) e Lazio e Piemonte, 10 cada uma.

Na família, 88 mulheres assassinadas o que confirma o contexto principal do feminicídio, seguido dos menos frequentes entre conhecidos (6,0%), delinquência comum (4,3), disputas na comunidade (2,6) e nas relações econômicas ou de emprego (1,7%).

A figura familiar de maior risco é a mãe, com 14 vítimas (16,3%) neste ano, cujos filhos terminam órfãos, abandonados, traumatizados pelo resto de suas vidas e, em alguns casos, também assassinados.

Nos últimos 15 anos, as chamadas vítimas secundárias na Itália ascenderam para 1.628, menores protegidos por um fundo para desabrigados devido um ato de feminicídio, como crianças que perderam a ambos os progenitores, 118 em 2015, cifra superior ao ano precedente.

Segundo dados do Instituto de Investigação Econômica e Social citados pelo diário La Repubblica, no período 2000-2015 em Itália produziram-se mais de 2.800 feminicidios, deles 1.740 nos últimos dez anos.

O tema atinge maior relevância neste Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher, aprovado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1999 para que a cada 25 de novembro o mundo repudie todas as formas de violência contra a mulher.

Neste sábado (26), as mulheres italianas tomarão praças e avenidas para reclamar seus direitos como cidadãs e maior respeito a sua integridade física e dignidade humana, ali em cartazes e as vozes estarão os rostos das vítimas do feminicídio reclamando justiça e exigindo, "Basta já!".