Cláudio Ferreira Lima: Avalanche neoliberal

“O orçamento público passa o máximo possível ao controle do Executivo. Os gastos sociais são diminuídos até onde não puder mais, e as receitas públicas tiradas, sobretudo, dos impostos que pesem mais sobre quem ganhe menos”.

Por Cláudio Ferreira Lima*

Pobres pagam mais impostos que ricos no Brasil

Instalou-se no Brasil a mais eficiente fábrica de desigualdade de que se tem notícia. Trata-se do neoliberalismo, que, à falta de contraponto da esquerda, seriamente abalada pelas experiências malsucedidas do socialismo, frutificou nos Estados Unidos e na Europa e se espalhou pelo mundo.

Desembarcou aqui via Consenso de Washington, com Collor; ganhou impulso com FHC, mas perdeu fôlego nos governos Lula e Dilma. Agora, porém, como numa avalanche, penetra, articula-se e deita raízes na Academia, no mundo editorial, na Imprensa, nas áreas mais estratégicas do governo e em toda a parte.

Nada mais sintomática que a constatação de Delfim Netto, segundo a qual o Nobel de Economia, de 1969 a 2016, “não revela alguém que tenha, de fato, contribuído para melhorar o bem-estar da humanidade, como é o caso dos agraciados com o Nobel de Física, Química e Medicina” (O Nobel de Economia, CartaCapital, 26/10/2016, p. 41).

Ora, Delfim, os premiados neste mundo neoliberal são, em geral, neoliberais, a serviço da acumulação pela acumulação sem limites do capital. Nele, o Estado, “para não atrapalhar”, reduz-se ao mínimo, e, como falta o humanismo, “construir uma sociedade livre, justa e solidária”, um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (art. 3º da Constituição), só pode soar estranho para ele.

Política fiscal e finanças públicas tornam-se mordomos da plutocracia dominante.

O orçamento público passa o máximo possível ao controle do Executivo. Os gastos sociais são diminuídos até onde não puder mais, e as receitas públicas tiradas, sobretudo, dos impostos que pesem mais sobre quem ganhe menos.

Para o déficit público, faz-se superávit primário (receitas maiores que as despesas, exclusive as financeiras), que assegure o pagamento de gordos juros, de modo que a dívida, essa conta de pouca transparência, tem servido mais como ganhos de uma minoria que complemento do financiamento do Estado.

Nesse contexto, a PEC 241, que tramita no Senado, com a abdicação do Orçamento pelo Congresso, a restrição na educação e saúde e a redução da proteção social, retrata fielmente tudo isso. Para completar, estão ainda a caminho, na mesma linha, as reformas previdenciária e trabalhista.

Claro que é urgente sanear as finanças. Mas não na forma proposta, em que a fatura vai quase toda para a classe assalariada (a média que foi massa de manobra no impeachment, inclusive) e a que nem isso é.

A quem recorrer? No atual quadro político-institucional, só nos restam as nossas próprias forças. E não será fácil. Mas como a luta mais nobre da humanidade é por uma sociedade mais livre, justa e humana, por meio da construção de novo projeto que tire lições dos erros do passado e da concomitante formação das alianças para concretizá-lo, será possível recomeçar. Esse é o caminho a trilhar.

*Cláudio Ferreira Lima é Economista


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