Boa parte das delações se refere a pessoas do governo, diz procurador

Em entrevista à agência Reuters, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, da força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF) na Lava Jato, disse repetidamente que "não há acordo com a Odebrecht, nem com indivíduos nem um acordo (de leniência) com a empresa", mas depois afirmou que o conteúdo das delações pode agravar a crise política, já que envolvem pessoas que já foram ou são do governo de Michel Temer (PMDB).

Procurador da lava Jato

Num discurso político e cheio de codificações, Lima afirmou não ter “confiança absoluta em fechar um acordo, porque estamos num ambiente de instabilidade institucional no Brasil".

“Não sei se há interesse do governo federal em que essas colaborações se efetivem… Boa parte do que é falado nessas colaborações, e não estou falando só da Odebrecht, se refere a personagens políticos que foram ou são do governo", declarou o procurador.

As declarações cifradas do procurador reforçam a tese de intervenção do governo Temer para “estancar a sangria” da Lava Jato, ou seja, manter a seletividade das investigações mantendo o foco no PT e livrando o PMDB e demais partidos que articularam o golpe contra o mandato da presidenta Dilma Rousseff. Recentementeo ministro da Justiça, Alexandres de Moraes, disse durante um ato de campanha do PSDB em São Paulo, em que era cobrado sobre a realização de ações da Lava Jato, que todos podiam ficar tranquilos, pois a Polícia Federal iria fazer operações naquela semana. Dias depois foi deflagrada operação que prendeu o petista e em-ministro Antônio Palocci.

As especulações em torno de um acordo de delação premiada com a Odecrecht aumentaram depois da publicação feita pela Folha de S. Paulo, dando conta de que dois executivos da empresa confirmaram o pagamento de R$ 23 milhões em caixa dois para a campanha do tucano José Serra (PSDB), ministro das Relações Exteriores de Temer.

Apesar de negar que exista um acordo de delação com a Odebrecht, Lima disse que está mais otimista agora de que um acordo será obtido do que há alguns meses.

Por outro lado, os advogados da Odebrecht afirmaram, em um comunicado, que não podem falar sobre negociações em andamento com os procuradores, ou seja, há um acordo em andamento.

Carlos Fernando afirmou também que as negociações de delações "são muitos complexas, demoram muito para terminar porque envolvem muitos fatos, muitas pessoas".

Abuso de autoridade

O procurador aproveitou o espaço para criticar o projeto da Lei de Abuso de Autoridade, defendido pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Com o objetivo de combater a banalização das prisões preventivas, a lei visa responsabilizar criminalmente juízes e investigadores que decidem prender um suspeito ou fazer acusações e essas decisões fossem anuladas por instâncias superiores.

Para Carlos Fernando, a lei é uma ameaça às ações promovidas pelas investigações da Lava Jato. Ele argumenta que "estão, na verdade, desincentivando que as pessoas investiguem, é muito simples".

"Não tem realmente proteção em relação a sua investigação e não ser ameaçado pelo poder político, e isso vai impedir que novos casos apareçam. Por que eu vou arriscar e fazer isso se eu ganho o mesmo salário no final do mês se eu não fizer absolutamente nada?".