Livro aponta papel do setor financeiro em distorções da taxa de câmbio

Em janeiro, a mídia noticiou com alarde a desvalorização do real frente ao dólar. A moeda norte-americana foi cotada a 4,16 reais, maior valor desde a criação do Plano Real. Mas a situação logo mudou e, em junho, o dólar teve o maior recuo mensal em 13 anos, chegando a valer 3,21 reais. Os altos e baixos da moeda brasileira são frequentes e têm impacto direto na vida das pessoas. O livro Taxa de Câmbio e Política Cambial no Brasil, do economista Pedro Rossi, ajuda a entender essa história.

livro Pedro Rossi

A obra, publicada pela FGV, será lançada em São Paulo nesta quarta (03), às 18h30, na Livraria da Vila, em Pinheiros. Na ocasião, haverá um bate-papo sobre o tema do câmbio com os economistas Luiz Carlos Bresser-Pereira, Antonio Corrêa de Lacerda, Laura Carvalho, André Perfeito e Ricardo Carneiro, além do próprio autor.

No livro, Rossi, que é professor da Unicamp, explica as razões de a taxa de câmbio brasileira ser das mais voláteis do sistema internacional, algo que traz prejuízos ao desenvolvimento, ao acarretar consequências negativas para o setor produtivo e, consequentemente, para o emprego. Além disso, atinge diretamente a vida das pessoas, uma vez que o câmbio afeta, por exemplo, a inflação e os preços dentro da economia nacional.

“O real é a moeda que mais oscila diante do dólar nos movimentos da liquidez internacional, quando comparada às principais moedas do sistema. Porque a taxa de câmbio é tão volátil? O livro trata dessas questões. Vai fazer uma construção institucional, vai mostrar o que é a taxa de câmbio, as teorias sobre a taxa de câmbio, e tratar dos elementos importantes para explicar essas distorções financeiras”, diz o autor, ao Vermelho 

O trabalho aponta como a formação cambial tem sido influenciada pelas forças do mercado financeiro e pelas altas taxas de juros praticadas no país.

“[O livro] é uma abordagem sobre a taxa de câmbio no Brasil, a partir das instituições e dos agentes. É uma discussão sobre o câmbio, mas que não é no abstrato, é a partir das formas concretas pelas quais a taxa de câmbio se forma. E essa pesquisa identifica o papel do setor financeiro na distorção da taxa de câmbio, os movimentos de especulação e arbitragem, que fazem com que a taxa de câmbio brasileira não reflita os fundamentos, necessariamente, e seja, sistematicamente, distorcida pelas forças de mercado”, detalha Rossi.

Ele cita os elementos que fazem a moeda brasileira muito suscetível à especulação e a taxa de câmbio ser muito volátil. O primeiro aspecto é a existência de uma taxa de juros muito alta, que atrai o capital especulativo de curto prazo – as operações de carry trade, em que os investidores pegam emprestado em uma moeda que tem juros baixos e aplicam em outra moeda, com juros mais elevados, em busca de um ganho especulativo. “A taxa de juros é importante para explicar o montante de recursos que entra e sai no curto prazo, nessas operações especulativas”, afirma.

Segundo ele, o outro elemento que explica essa volatilidade é “a institucionalidade do mercado de câmbio do Brasil”, que seria muito suscetível a esses movimentos de especulação. “O mercado é permeável à especulação porque tem uma liquidez muito grande nos mercados de derivativos, então é muito fácil a aplicação de recursos por estrangeiros”, aponta. De acordo com ele, “qualquer um pode entrar no país e, facilmente, apostar na moeda brasileira, seja para valoriza-la ou desvaloriza-la”.

O professor da Unicamp diz que os prejuízos dessa oscilação são “enormes”, já que o câmbio é algo que afeta todo mundo. “É o preço da moeda brasileira em relação à moeda estrangeira, que é referência para todo um espectro de bens e serviços que a gente consome. E quando varia a moeda brasileira em relação à estrangeira, varia também esse conjunto de bens e serviços que a gente consome. Isso afeta tudo: a nossa riqueza, a distribuição de renda, a competitividade entre alguns setores da economia”, enumera.

O tema é central no debate econômico do país e ajuda a compreender alguns problemas enfrentados, por exemplo, pela indústria nacional. Embora alguns comemorem a valorização do real frente ao dólar, porque barateia viagens internacionais e faz os produtos importados invadirem as prateleiras verde-amarelas, esse movimento tem efeito nefastos para a economia de forma geral. É o que mostra o exemplo dado por Rossi.

“No supermercado, os produtos importados podem ficar mais baratos se o câmbio apreciou-se, ou mais caros se depreciou-se. Então, no curto prazo, em geral, o consumidor é beneficiado com uma valorização cambial. Mas, no longo prazo, o consumidor pode perder o emprego, porque o produto importado está entrando e tirando competitividade das empresas brasileiras, que correm o risco de quebrar”, explica.

Nesse sentido, além de afetar o padrão de consumo, o câmbio influencia a inflação, evidentemente, a estrutura produtiva e os empregos. “E uma taxa de câmbio que varia muito cria um ambiente macroeconômico que não é muito propício ao investimento produtivo. Um empresário que vai investir quer ter uma previsibilidade do preço que ele vai vender o produto, do retorno que pode ter. Diante de um preço chave da economia – que é o câmbio – muito volátil, ele fica sem saber, sem ter previsão muito acurada sobre sua lucratividade, o custo de seus insumos ou como o mercado vai se desenhar no futuro”, completa.

De acordo com ele, essa instabilidade prejudica, portanto, o investimento produtivo e o planejamento de longo prazo da economia brasileira.

O livro do professor da Unicamp trata também da política cambial, defende uma atuação mais ativa do Banco Central e indica caminhos para uma maior regulação do mercado, que reduza distorções.

Para o economista Yoshiaki Nakano, o livro é leitura obrigatória para quem quer entender o assunto. “Está na cabeça da maioria dos economistas, ortodoxos e heterodoxos, que a taxa de câmbio é determinada pelo fluxo cambial. Esse livro desfaz esse lugar comum e mostra como a taxa de câmbio no Brasil decorre de uma complexa interação entre o mercado de derivativos e o mercado à vista e mostra como a especulação cambial tem um papel fundamental nessa formação”, avalia.

“Um livro inteiro sobre a taxa de câmbio! Isto é ótimo, porque é uma raridade. Os economistas ainda não se deram conta do papel estratégico da taxa de câmbio e do déficit em conta-corrente; só pensam em taxa de juros e déficit público. Pedro Rossi não cai neste erro. Um livro que defende uma política cambial ativa! Isto é melhor ainda, porque os países em desenvolvimento precisam dramaticamente de uma política cambial, que a ortodoxia liberal rejeita”, escreve Bresser-Pereira sobre a publicação.

Serviço

Lançamento do livro “Taxa de câmbio e política cambial no Brasil”
Bate-papo com Pedro Rossi (autor), Luiz Carlos Bresser-Pereira, Antonio Corrêa de Lacerda, Laura Carvalho, André Perfeito e Ricardo Carneiro
Quarta-feira (3), às 18h30
Na Livraria da Vila
Rua Fradique Coutinho, 915 – Pinheiros – São Paulo