Dilma vai recomendar plebiscito sobre novas eleições em carta

Em entrevista à BBC Brasil e BBC Mundo, a presidenta eleita Dilma Rousseff destacou que é preciso “lutar” pela realização de um plebiscito que consulte a população sobre a necessidade de uma eleição presidencial antecipada. Ela contou que divulgará nesta semana os detalhes de sua proposta, em carta direcionada ao povo brasileiro e ao Senado.

Dilma em entrevista

Dilma Rousseff contou que divulgará ainda esta semana os detalhes de sua carta aos brasileiros e ao Senado. “Estou defendendo um plebiscito porque quem pode falar o que eu devo fazer não é nem o Congresso, nem uma pesquisa, ou qualquer coisa. Quem pode falar é o conjunto da população brasileira que me deu 54 milhões e meio de votos”, afirmou.

Além disso, a presidenta explicou que pretende comparecer pessoalmente para fazer sua defesa quando o caso for julgado pelo plenário do Senado, entre final de agosto e início de setembro. “Eu quero muito ir. Depende das condições. Como o presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski, presidirá [o julgamento], acredito que haverá condições”, afirmou.

Plebiscito

A realização de um plebiscito depende de aprovação do Congresso – mesmo que Dilma consiga retornar à Presidência, não poderia convocar a consulta sozinha, teria que contar com a aprovação pelo Congresso, onde o PMDB de Temer e Eduardo Cunha tem maioria.

Na entrevista, a presidenta Dilma reconheceu essa dificuldade, mas ressaltou que é necessário apenas o apoio da maioria simples dos congressistas (metade dos presentes na sessão) para convocar um plebiscito.

“Acredito que nós temos que lutar para viabilizar o plebiscito. Pode ser difícil passar [no Congresso], a eleição direta foi também. Nós perdemos quando nós defendemos as Diretas Já [campanha pelo voto direto em 1984] e tinha milhões de pessoas nas ruas. Perdemos num momento e ganhamos no outro”, afirmou.

Questionada sobre se a antecipação da eleição poderia criar mais instabilidade política, Dilma respondeu: “Essa argumentação foi a última que a ditadura militar fazia. ‘Sabe por que a gente não pode fazer eleição? Primeiro, porque causa instabilidade política; segundo, o povo não é capaz de votar e escolher devidamente; terceiro, nem sempre a maioria é lúcida’. Essas três razões nos deram 20 anos de ditadura”.

Temer não teria esse ato de grandeza de renunciar

Questionada pela BBC Brasil se cogitaria propor um acordo para antecipar as eleições, com a renúncia simultânea dela e de Temer, Dilma respondeu que “seria muita ingenuidade da nossa parte [acreditar] que ele teria grandeza de renunciar”.

Impeachment é golpe

A presidenta Dilma reafirmou que o processo de impeachment é um “golpe” porque não haveria crime de responsabilidade que justifique sua cassação. Já os que a acusam dizem que ela cometeu ilegalidades na gestão das contas públicas.

“Quando você tem um julgamento de um presidente sem crime de responsabilidade, nada mais oportuno do que esse presidente gentilmente sair da pauta. Não renuncio. Eu volto para o governo e faço um plebiscito. É essa a proposta. Não tem hipótese de eu fazer esse gesto tresloucado: renunciar”, afirmou.

“Eu acho que eu vou ser conhecida também como a primeira [presidente] mulher que, apesar de tudo, não deu um tiro no peito, e também não renunciei”, reforçou, afastando a sombra de Getúlio Vargas, presidente que se matou em 1954 com um tiro no peito, após forte pressão para que deixasse o governo.

Nova rotina

Dilma contou à BBC que, mesmo afastada do comando do país, ela tem se dividido entre compromissos no Alvorada, visitas à família em Porto Alegre e viagens pelo país custeadas por uma “vaquinha” que já arrecadou quase R$ 800 mil na internet.

Sua agenda inclui encontros com movimentos sociais, parlamentares e muitas entrevistas – no dia anterior, quinta-feira, havia recebido a imprensa japonesa.

Autocrítica

Sobre as denúncias de corrupção envolvendo o seu partido, a presidenta afastada disse que o PT havia sido “contaminado pela política tradicional” e precisava “fazer uma autocrítica”.

Dilma repetiu: ”O maior processo de corrupção recente no mundo foi o estouro da bolha financeira. Nada envolveu mais dinheiro, mais malfeito e processos irregulares de controle. (…) Não é algo trivial descobrir a corrupção. (…) A característica principal da corrupção é agir às escuras, escondendo suas práticas corruptas, é esconder e criar toda uma cumplicidade e não deixar traços”.