Guadalupe Carniel: Libertadores sem brasileiro vale menos?

Em plena quarta, dia sagrado para todo futeboleiro, a principal emissora do país que é considerado a pátria de chuteiras resolve passar…um jogo claro. Mas, ao invés da final da Copa Libertadores, a maior competição do continente, passa Santos e Gama.

Jogadores do Atlético Nacional comemoram conquista da Libertadores da América de 2016

Ok, as equipes na final continental não são brasileiras, mas então por que se muda a grade apenas para passar a final da Champions ou da Uefa League? Nem são equipes brasileiras, às vezes o brasileiro está no banco, as vezes nem tem brasileiros atualmente na equipe, mas exibe-se do mesmo jeito.

A europeização passa pela nossa cultura e pelo nosso futebol. Desde que o futebol desembarcou aqui a ideia era a de ser uma moda voltada à elite, com produtos como camisas de seda bem passadas, lenços segurando os calções e alguns times até com gravata, além de mensalidades altas para poder selecionar o público que frequentava os clubes e praticava o esporte.

O que acho absurdo é manter isso. Um dos meios que nos informa e transmite a cultura, adentrando nossas vidas e adicionando novos hábitos são os veículos de comunicação, acha que é melhor passar um jogo europeu, porque devemos nos enquadrar no padrão europeu, usar as camisas, o modo de torcer (só o que eles querem mostrar, claro, porque o mosaico é legal, mas a festa e as brigas e as cervejadas do lado de fora ninguém mostra, porque isso é selvagem, isso não condiz com o modelo a ser seguido).

Nos aproximam da Europa e nos distanciam da América Latina. A mesma América Latina que conseguiu acabar com a lógica dominante-dominado ao dar ao futebol graça, improvisação e grandes jogadores que transformaram a história. Mas nos é vetado ser melhor do que o europeu.

Não vejo brasileiros se declarando latinos, para a maioria parece algo pejorativo. Já passou da hora do Brasil descobrir a América Latina. E também no futebol. A América Latina não é feita só de Argentina, Brasil, Uruguai e vez ou outra o Chile.

Ontem uma equipe colombiana jogou contra uma equatoriana. No Brasil pequenas notas sobre os jogos. Na TV aberta é como se a competição nem existisse. Ontem pela primeira vez um venezuelano conquistou a taça mais importante do continente: Guerra, que foi fundamental na equipe.

Enquanto o jogo entre Santos e Gama rolava com o público habitual atual nos estádios brasileiros, o estádio Atanasio Girardot se pintou de verde e branco, tomado por 50 mil pessoas e contou com alguns hinchas especiais: os jogadores da campanha de 1989, dentro os quais René Higuita que fez os torcedores emocionados cantarem “ole, ole Rene, Reneeee’’.

O jogo em si não foi tão digno de uma final com acontecimentos épicos e reviravoltas, foi o esperado: durante os primeiros 25 minutos, o Atlético pressionando o tempo todo e com 19 segundos já mandou uma bola no travessão com Borja. Aos oito veio o grande tento: em cobrança de falta de Torres, a zaga equatoriana se confundiu e a bola bateu na trave, sobrando no rebote pata Miguel Borja só meter para dentro das redes.

O time equatoriano parecia perdido em campo e não oferecia perigo, só vez ou outra em ligações diretas. O melhor jogador do Independiente foi sem dúvidas o goleiro Azcona, que evitou que o Nacional ampliasse o placar aos 30 em forte chute de fora da área de Torres. Ainda aos 33, Moreno deu uma caneta e cruzou para Berrío, mas Azcona espalmou.

As únicas boas chances equatorianas foram aos 34 com Jose Ângulo que bateu por cima do gol e no primeiro minuto do segundo tempo com Uchuari que deu um chapéu em Bocanegra, mas foi muito bem cortado num carrinho de Henríquez. Depois ocorreu o esperado: o Atlético foi capo e ditou o ritmo de jogo, tendo mais quatro boas chances, não sofrendo tanta pressão e administrando o tempo, como fez em todas as outras partidas.

A final pode não ter feito jus à campanha, mas não há como questionarmos o fato de que o Nacional merecia ser campeão. Em 14 partidas fez 33 pontos, tendo a campanha mais perfeita da Libertadores. Pode não ser uma equipe memorável como as do Boca, São Paulo, mas merece respeito e tem seu valor. Teve a melhor defesa, o melhor ataque, o maior artilheiro desta edição, Borja, com cinco gols nos momentos mais importantes da competição. E se reclamavam que o Nacional só ganhou uma Libertadores graças ao “Papá” Escobar, agora a teoria cai por terra. Parabéns Nacional, pode comemorar que a América é verde!