Requião quer o povo na discussão e na definição de um destino

O pemedebista Roberto Requião é um político como poucos no Brasil. Filiado ao PMDB desde o início de sua trajetória política, o parlamentar apimenta suas entrevistas com afirmações irônicas e às vezes jocosas. Mas sem dúvida, a sua principal característica é o discurso franco e de posição firme em defesa da democracia e dos interesses nacionais. Sua trajetória política não deixa dúvida sobre qual lado ele está.

Por Dayane Santos

Roberto Requião - Moreira Moriz/Agencia-Senado

Natural da capital paranaense de Curitiba, Requião iniciou sua vida política no PMDB, sendo eleito ao primeiro cargo eletivo como deputado estadual 1982. Formado em Direito pela Universidade Federal do Paraná e em Jornalismo pela PUC-PR, o senador sabe muito bem dosar o tom das palavras e, inclusive, acrescentar a acidez que lhe é peculiar.

Requião concedeu entrevista ao Portal Vermelho na última quarta-feira (29). Por telefone, sua voz rouca, que por vezes falhava durante a entrevista, era um sinal de que o debate no Senado – que entre outras pautas trata do pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff – é intenso.

Ele é um dos parlamentares que defende como saída para a atual crise política do país a realização de um plebiscito sobre novas eleições. Sobre o processo de impeachment, reafirmou que “não houve crime de responsabilidade” e se há “crime temos que afastar todos os governadores eleitos”.

“Estamos tentando trazer a discussão e aproveitar essa insatisfação, esse descontentamento e desconforto, que é evidente no Senado da República”, enfatizou Requião, classificando como “um erro” a decisão daqueles que buscam o caminho meramente eleitoral para enfrentar a crise política atual, em detrimento do abandono da consulta popular e da unidade nacional.

“É um erro porque estamos sacrificando o processo democrático que nós conquistamos no Brasil. Estamos tentando trazer a discussão e aproveitar essa insatisfação, esse descontentamento e desconforto que é evidente no Senado da República”, ressaltou.

Aliás, vale destacar que essa busca meramente eleitoral iniciou precocemente. Pouco depois da posse da presidenta Dilma, já se lançava candidaturas para 2018, antecipando um debate que só serviu para insuflar os inconformistas derrotados nas urnas.

Dilma deve assumir a bandeira do plebiscito

O senador reforça que o debate deve ser encampado pela presidenta Dilma e que ela deve ampliá-lo com os senadores e com a sociedade. “Hoje nós podemos derrubar [o impeachment] tendo como foco o Senado da República… Nós estamos tentando resgatar o espaço democrático no Brasil e levar o povo a uma discussão. Não vou garantir que numa eleição direta vamos eleger um governo popular, democrático e nacionalista, mas nós vamos resgatar o espaço de discussão e de consciência política permanente.”

Requião defende que esse processo de debate nacional com o povo resulte em um governo de coalizão nacional “com todas as forças políticas”.

“Achamos que existe a possibilidade trazermos essa gente toda, compondo mais do que 30% do Senado, derrubando o impeachment com o compromisso da Dilma de mudanças da política econômica, não para uma gastança irresponsável, mas por um modelo nacionalista. E para a formação de um governo com essas forças nacionalistas, democráticas e populares, de transição fazendo uma grande discussão nacional por meio de um plebiscito em que perguntaríamos ao povo se ele quer constituinte, nova eleição ou uma reforma política. E nós seguiríamos esse espaço.”

O senador faz questão de reafirmar que, diante da profunda crise política que o país enfrenta, “o mais importante é a abertura de um espaço para uma grande discussão nacional que politizaria essa discussão”.

“Estamos sendo governados hoje pela sala dos banqueiros e dos corredores das embaixadas que geopoliticamente querem tomar conta da nossa economia. Isso num momento em que o neoliberalismo quebrou a Grécia. Está liquidando a Espanha, prejudica a Itália, Portugal e pede asilo no Brasil, onde um grupo de pessoas por falta de esclarecimento político – e acho que por trás disso está a vaidade e o desejo do poder sem espírito público – está sendo manipulado. Por isso, temos que botar o povo nessa discussão. Não é ‘fora Temer’. Não é ‘volta querida’. É colocar o povo na discussão e na definição de um destino”, reafirmou.

Temer multiplica em 10 os erros de Dilma

Ainda sobre o governo Temer, Requião afirma que “está multiplicando por 10 os erros da Dilma”.

“[Temer] Está sendo controlado por um ‘deus ex machina’. Agora, isso tudo está causando um brutal desconforto, inclusive um desconforto ético quando se ouve falar nas comissões de ‘gorjetas’, embora não provadas, numa parte muito grande dos senadores”, disse ele. A expressão “deus ex-machina”, de origem latina, se refere ao expediente da tragédia grega para solucionar casos complicados, o qual fazia de súbito aparecer um deus para explicar como se devia proceder naquela situação, já que o autor não sabe o que fazer.

“Temer simplesmente, vaidosamente, assumiu a Presidência e está sendo conduzido pelas forças que o levaram a isso… E para sustentar o seu governo fez uma aliança em que coloca o ministro na Educação, sem perguntar se o cara sabe ler ou escrever. Ele simplesmente indaga qual é a influência dele na base eleitoral da Câmara. Eu não estou falando especificamente do Mendonça. Nem sei se ele sabe ler ou escrever, mas isso vale para todos os ministros e para a formação do governo Temer.” 

PMDB de Requião

Questionado sobre sua permanência no PMDB, apesar de tantas divergências políticas ao longo de sua trajetória dentro da legenda, Requião explica: “O PMDB não é um partido entreguista. Ele não é o partido do José Serra da Chevron e da Shell… Não tenho porque sair. Partido você constrói e não reclama. Você não quer um partido pronto e acabado. Partido é uma obra em construção. E todos os outros que estão por aí, são iguais ou piores que o PMDB, do ponto de vista programático e ideológico. Então, não há a opção de saída”.

Ele destaca que o PMDB que o levou a se filiar foi o partido das classes populares. “Era um partido desenvolvimentista e nacionalista. Era um partido democrático popular e nacionalista. Democrático porque achava que a opção pela democracia era a única opção viável e transformadora no mundo. Popular porque vinculava aos interesses do povo brasileiro, uma vez que as elites, pelo seu comportamento e sua formação cultural, se assemelhavam às elites de outros países. E nacionalista porque a questão nacional se confunde com a questão democrática e popular. Nacional no Brasil é o povo. E a democracia é o instrumento disso. Esse era o meu PMDB”, frisou.

Ele avalia que, apesar dessa representatividade, o “PMDB não chegou a se constituir como um partido político de verdade”.

“Embora o estatuto fosse esse, ele era uma frente democrática. E uma frente se caracteriza por se opor à alguma coisa. O PMDB era a frente contra a ditadura. ‘PMDB, você sabe o porquê’, era o slogan do partido no Brasil inteiro. Mas ele nunca se constituiu como um partido programático, democrático, popular e nacionalista. Agora, derrubou a ditadura. E quando caiu a ditadura ele não chegou a se constituir como um partido, mas ele tem uma capilaridade nacional monstruosa. Ele é a grande oportunidade para se construir um partido no Brasil.”