Penélope Toledo: Cartão vermelho para a homofobia

Cinquenta, pessoas foram assassinadas pelo simples fato de serem homossexuais. No massacre em uma boate LGBT em Orlando (EUA), um atirador cerrou fogo contra a multidão de mais de 300 indivíduos. O motivo, segundo seus próprios pais, foi a fúria por ter visto dois homossexuais se beijando. O que isto tem a ver com o futebol? Tudo!

Pro Penélope Toledo*

Coligay: torcida organizada gremista LGBT foi pioneira nas arquibancadas do Brasil

Primeiro porque a intolerância ao amor entre pessoas do mesmo sexo, é igual. Gays são hostilizados nas arquibancadas e qualquer comportamento que no imaginário popular remeta à homossexualidade, coisas banais, como por exemplo homens usarem brincos e acessórios análogos, é condenado e proibido. Demonstrações públicas de afeto, como acontece com os casais heteros, então, são terminantemente vetadas.

Por conta disso, torcidas organizadas gays foram criadas, abrangendo os principais clubes do Brasil. A Coligay, do Grêmio, é a pioneira, fundada em 1977 por frequentadores da boate LGBT Coliseu. Na sequência vieram a Flagay do Flamengo (1979), que chegou a ter 40 mil participantes; a Raposões Independentes, do Cruzeiro e a Galo Queer, do Atlético-MG.

Jogadores

Também há censura sobre o que acontece com quem está dentro de campo. Emerson Sheik, por exemplo, foi bombardeado por ter publicado uma foto em que dava um selinho no amigo. “Viadinho” e “Aqui é lugar de Homem” foram algumas das faixas expostas por torcedores.

Richarlyson foi outro alvo das perseguições e há rumores de que foi proibido por colegas de elenco de assumir publicamente a sua homossexualidade. O que se sabe é que, pressionado, o jogador precisou ir a público várias vezes reforçar sua heterossexualidade.

Mundo

A homofobia faz igualmente vítimas mundo afora. O alemão Thomas Hitzlsperger representa uma geração que teve que esperar se aposentar para “sair do armário”. Mesmo sendo conhecido por seus chutes fortes, não conseguiu desmistificar o esteriótipo do “gay fraquinho”.

Às vezes o preconceito tem desfechos trágicos, como no caso de Justin Fashanu, o primeiro jogador britânico a assumir sua homossexualidade. Acusado de abuso sexual, se suicidou em 1998 e deixou uma carta de despedida declarando que por ser gay, jamais seria julgado de forma justa.

Finais dramáticos não são raros às vítimas da homofobia. Segundo o relatório do Grupo Gay da Bahia (GGB), a mais antiga entidade do gênero do Brasil, 318 gays foram mortos no país só em 2015, crescendo de 115% em relação a 2010. O Brasil é o “campeão” mundial destes assassinatos.

A estimativa é que a cada uma (!) hora, um homossexual sofra algum tipo de violência, de acordo com a Secretaria Nacional de Direitos Humanos. Isto no que se refere a agressão direta, porque há, ainda, aquela que é velada, como a proibição da união civil entre pessoas do mesmo sexo, a dificuldade de adoção de filhos e a proibição do uso do nome social, dentre outras.

Sobre a homofobia

Violência não é só matar cinquenta pessoas. Este é o extremo, o ápice. Mas até que se chegue nele, inúmeras formas de violência se multiplicam no dia a dia, fora e dentro do futebol.

Sabe aquele grito de guerra que chama jogadores de “bicha”? Sabe aquele deboche sugerindo que torcedores de tal clube sejam “viados”? Sabe aquelas zoeiras folclóricas que, poxa, “fazem parte do futebol”? Pois é, não são brincadeiras inocentes como parecem.

Porque sem querer, a gente acaba disseminando o preconceito, associando homossexualidade a algo degradante e construindo consensos sociais de intolerância. Portanto, se tem homossexuais sendo assassinados, é porque por detrás disto há uma sociedade que legitima, passiva ou ativamente.

E quer saber? A verdade é que não afeta a vida de ninguém se “João ama Joaquim”, mesmo se João e Joaquim forem torcedores ou jogadores do seu clube de futebol. Quem tem que receber cartão vermelho não é o amor, seja lá entre quem ele for, mas sim a homofobia.