Decretos que fundamentam pedido de impeachment não feriram lei

Em coluna na Folha de São Paulo, a economista Laura Carvalho destaca que o pedido de impeachment de Dilma Rousseff não está relacionado ao escândalo de corrupção na Petrobras e nem mesmo tem como foco as pedaladas fiscais. Centra-se, sim, em seis decretos de abertura de créditos suplementares. Segundo ela – diferente do que diz a oposição -, tais decretos não aumentaram o total de despesas que poderia ser executado por cada órgão. Não infringiram, portanto, a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Decretos suplementares

No texto, Laura menciona documento em que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, explica a decisão de aceitar o pedido de impeachment. “Não se pode permitir abertura de um processo tão grave […] com base em mera suposição de que a presidente da República tenha sido conivente com atos de corrupção”, reproduz a economista.

Ela cita também outra declaração de Cunha, que trata das tais pedaladas: “os fatos e os atos supostamente praticados pela denunciada em relação a essa questão são anteriores ao atual mandato", disse Cunha. A economista então conclui que o foco do pedido de impeachment é mesmo, portanto, a denúncia de que a presidente assinou em 2015 seis decretos de abertura de créditos suplementares cujo valor seria incompatível com o cumprimento da meta fiscal.

Para Laura, “hoje, a base legal do golpe parece importar pouco”. Ela explica que o Orçamento é elaborado quase meio ano antes da sua execução. E, caso uma ação orçamentária tenha obtido autorização inferior àquela que seria necessária, ministérios e demais Poderes podem solicitar a abertura de créditos suplementares.

Na Folha, ela detalha: “os decretos de 2015 totalizaram R$ 95 bilhões, dos quais R$ 92,5 bilhões foram compensados com o cancelamento de outras dotações orçamentárias e R$ 708 milhões referiram-se a despesas financeiras que não entram no cálculo do resultado primário, de modo que a denúncia aplica-se apenas ao valor restante, de R$ 1,8 bilhão. Desse total, cerca de 70% destinaram-se ao Ministério da Educação para itens como Ciência Sem Fronteiras, universidades federais e hospitais de ensino”.

De acordo com ela, tais decretos não ampliaram o total de despesas que poderia ser executado pelos órgãos. “O que os decretos fizeram foi possibilitar a realocação interna de recurso entre rubricas, já que o limite total para a execução de cada órgão foi definido pelos decretos de contingenciamento”, escreve. Segundo a economista, R$79,8 bilhões foram contingenciados em 2015, o maior montante desde o início da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Utilizando trechos da música Futuros Amantes de Chico Buarque, Laura encerra seu texto com um pedido aos futuros visitantes de um Brasil submerso: “peço que evitem confundir os bem-intencionados na luta contra a corrupção com aqueles que buscavam assaltar o poder sob qualquer pretexto para abafar investigações ou para garantir que os trabalhadores continuassem a pagar o pato da crise econômica”.

Laura Cardoso é professora do Departamento de Economia da FEA-USP com doutorado na New School for Social Research (NYC).