Pesquisa mostra que setor privado ignora ações afirmativas

Amostra divulgada nesta quinta (28) em São Paulo revelou que apenas 4, de 53 empresas ouvidas na capital paulista, tem ações de promoção da igualdade racial. Quando se trata de políticas de gênero são 9 empresas. Os dados estão na pesquisa “Perfil Social, Racial e Gênero dos 200 principais fornecedores da Prefeitura de São Paulo, que a realizou em parceria com Instituto Ethos e patrocínio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). 

Por Railídia Carvalho

Pesquisa mulheres e negros no mercado de trabalho perfil social racial PMS e instituto ethos - Carlos Romero

Apesar de incluir pessoas com deficiência e com mais de 45 anos, o foco da pesquisa foi o contexto das desigualdades raciais e de gênero no mercado de trabalho de São Paulo, analisados a partir de dados da Relação Anual de Índices Sociais (Rais). Das 200 empresas procuradas apenas 53 responderam os questionários.

Mercado desigual

“A desigualdade tem gênero e, sobretudo, tem cor. Mas pelo que a pesquisa mostra não há o entendimento das empresas de que deva existir políticas para negros e para mulheres”, concluiu o professor Hélio Santos, um dos redatores da pesquisa.

A desigualdade apontada por Hélio não parece sensibilizar diretores, supervisores e gerentes que responderam à pesquisa. Entre 78% e 88% deles considera adequada as sub-posições ocupadas por mulheres e negros nas corporações.

Informações da Rais apontam que apesar de as mulheres serem maioria (52,6%) da população da cidade de São Paulo são os homens que ficam com 54% dos postos de trabalho enquanto a presença dos não negros em posições executivas excede em dez vezes a dos negros.

Ainda de acordo com a pesquisa, a mulher negra é o segmento mais vitimizado pela discriminação no mercado de trabalho. Fica para elas as ocupações que exigem menos qualificação enquanto as mulheres brancas representam, por exemplo, 15,89% dos cargos como diretoras. Neste nível apenas 1,62% de mulheres negras está presente.

Referência

Mesmo sendo uma cidade de maioria branca, segundo pesquisa do IBGE de 2010, São Paulo é o município brasileiro que reúne o maior número de negros: São 4 milhões. A pesquisa ser realizada no principal centro financeiro e econômico do país pode sinalizar movimentos do mercado de trabalho em outros municípios brasileiros.

De acordo com o diretor do Instituto Ethos, Jorge Abrahão, a pesquisa alerta para o reconhecimento do problema e é fundamental para mobilizar as empresas. “Nesse momento vimos a maior cidade do Brasil identificando e mapeando dados. Esse mapear passa mensagens. Esse tipo de ação tende a melhorar e qualificar o gestor”, disse Abrahão.

O Ethos realiza desde 2001 pesquisa no recorte de raça e gênero em empresas de todo o Brasil. Em março sairá nova pesquisa de perfil social e racial das 500 maiores empresas do Brasil. A partir dos dados de pesquisas anteriores, Abrahão afirmou que é perceptível uma evolução na diminuição da desigualdade de gênero e raça mas não é suficiente.

Mais políticas

“Nesses mais de 10 anos as mulheres saíram de 5% de presença nos cargos executivos para 13% e os negros de 1,5% para 5% . Mas a permanecer esse crescimento assim as mulheres vão demorar 60 anos para representarem nas empresas o que representam na sociedade e os negros vão demorar 150 anos. Nós não podemos nos conformar. É preciso fazer uma inflexão nessa curva para podermos avançar”, avaliou Abrahão.

Ele defendeu propostas “mais fortes de indução de políticas”  e sugeriu que a prefeitura de são Paulo seja esse provocador da indução porque tem políticas afirmativas em vários segmentos.

“As empresas públicas estão a frente das empresas privadas. E nós estamos aprendendo com as públicas. E a indução de uma prefeitura com a simples pergunta aos fornecedores se tem políticas de promoção de igualdade racial e gênero pode induzir uma transformação”, disse.

Cidade Afirmativa

O secretário da Promoção da Igualdade Racial de São Paulo, Maurício Pestana, que encomendou a pesquisa, afirmou que a iniciativa é o início de um esforço para tornar a cidade de São Paulo uma referência do negro no mercado de trabalho.

Ele lembrou que em 1986 , no início da carreira de cartunista, ele produziu uma cartilha que abordou pela primeira vez o tema do negro no mercado de trabalho. “Essa referência é a marca que queremos deixar na gestão. A marca do desenvolvimento econômico e da inclusão social na cidade de são Paulo”, ressaltou. De acordo com ele, a prefeitura de São Paulo é a que mais inclui negros entre as instituições da América Latina.

A Vice-prefeita de São Paulo, Nádia Campeão, lembrou que a criação das secretarias de políticas para mulheres e de promoção da Igualdade racial foram as primeiras iniciativas de Haddad após ser eleito. Segundo Nádia, é indiscutível o compromisso do prefeito com o enfrentamento à discriminação de gênero e racial.

“O nosso grande desafio nacional é o combate à desigualdade. É o grande problema que nós temos e essa pesquisa faz com que a gente veja com toda clareza a necessidade de jovens, mulheres e homens, sobretudo negros, de ascenderem a cidadania ingressando nas universidades e nas empresas”.

Para ela os dados servem para iluminar as ações que devem ser criadas e fortalecidas na cidade e que pode se transformar em referência para outros municípios e países.

Brasil sem discriminação

O ministério das mulheres, direitos humanos e igualdade racial foi representado por Luciana Ramos que destacou a importância das secretarias de igualdade racial e políticas para mulheres no enfrentamento às desigualdades e na implementação do estatuto da igualdade racial, por exemplo.

Através do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir), o ministério das Mulheres, Direitos humanos e Igualdade racial tem incentivado, através de fomento, municípios e estados a criarem as secretarias nos segmentos.

“O racismo acontece lá, no dia a dia na localidade e é, a partir desses órgãos que acontecem políticas como essa pesquisa da prefeitura de São Paulo e instituto Ethos, projetos de capacitação, geração de renda e de cotas”, argumentou Luciana.

Ela lembrou que recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) serão direcionados para ações de inclusão da população negra no mercado de trabalho, sobretudo às mulheres negras. Luciana elogiou a pesquisa nas empresas privadas que, na opinião dela, vem para subsidiar e fortalecer as políticas afirmativas que existem. “As cotas nas universidades precisam vir acompanhadas de um mercado de trabalho, de possibilidade de um emprego em que as pessoas possam entrar”, defendeu.

No dia 25 de janeiro o Conselho Participativo de São Paulo tomou posse e pela primeira vez as mulheres são maioria no órgão. Elas somam 55% do total dos representantes. A secretária de políticas para mulheres Denise Mota Dau informou que foi criado um fórum de mulheres em todas as subprefeituras da cidade e está sendo construído o conselho municipal de políticas para mulheres.

“Não podemos tratar igual quem já tem menos oportunidades. As políticas afirmativas são para acelerar a superação da desigualdade”, disse Denise.