"Ao rever meta fiscal, governo prioriza manter gasto social"

Na última terça (27), o governo anunciou uma revisão na meta fiscal, que prevê agora um déficit primário de R$ 51,8 bilhões, o equivalente a 0,9% do PIB. Para o economista Lécio Morais, com o anúncio, a gestão age de forma transparente para se adequar a um novo cenário econômico. E sinaliza, assim, que não está refém da ortodoxia e prioriza a manutenção dos gastos sociais, que beneficiam não só a população mais pobre, mas também ajudam a atividade econômica.

Por Joana Rozowykwiat

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Segundo o economista – que é mestre em ciências políticas e assessor de políticas econômicas da liderança do PCdoB na Câmara dos Deputados –, por razões alheias ao governo, o país teve sua situação agravada muito além do previsto no programa de ajuste e passou por uma rápida retração da economia. E isso teve com repercussões na arrecadação federal, que ficou muito abaixo do esperado. Nesse novo cenário, foi necessário rever a meta fiscal, sinalizando agora a existência de um déficit primário, que é quando as despesas do governo são maiores que as receitas, mesmo sem contar os juros da dívida pública.

Morais cita, entre os fatores inesperados que pesaram nessa retração, os impactos da operação Lava Jato e da crise política na economia. “As investigações da Lava Jato desencadearam uma estagnação completa na cadeia produtiva de petróleo e gás e um choque forte na indústria da construção civil, que provocou um abatimento calculado entre 1 a 2 % do PIB”. Ele citou também a crise política, “que traz insegurança, com a oposição sempre trabalhando para as coisas ficarem piores, só com o objetivo de derrubar o governo”, disse.

Esses fatores, somados à crise internacional que derrubou preços das exportações brasileiras, tiveram então repercussões na economia, acarretando a mudança de curso na meta fiscal. “Era preciso se adequar à realidade, e assumir o déficit agora é o menor mal que poderia acontecer”, defende.

De acordo com ele, o governo indica, assim, que não pretende promover o ajuste às custas do povo. “O que o governo está fazendo é não agir com uma cartilha estritamente ortodoxa, que diz que, quando impõe objetivos, terá que cumpri-los a qualquer custo. Não iremos atingir objetivos a qualquer custo. [No atual cenário] um superávit é impossível, a não ser a um custo tão alto, que não estamos dispostos a pagar. O povo brasileiro não pode pagar um custo tão elevado só para manter o objetivo de uma política que foi definida no começo do ano e previa o superávit”, analisa.

Conforme defendeu Morais, para atingir o superávit, a população mais pobre sairia prejudicada. “O governo está dizendo agora que não vamos cortar mais, para não prejudicar esses programas, e que vamos dar um alívio para a economia, porque, se zerasse o déficit, esses 51 bilhões sairiam de onde? Dos programas sociais. E isso significaria que os beneficiários não teriam esse recurso para custear suas vidas, o que reduziria ainda mais também a atividade econômica. Esse é o significado da ação do governo”, declarou.

Para ele, na atual situação, o déficit não atrapalha o plano de ajuste determinado pelo governo e não é ruim. “Se está havendo uma redução forte na atividade interna, muito mais forte do que se previa, um déficit não é ruim. Nem é contrário ao ajuste fiscal, porque o que o ajuste pretende é uma redução da demanda e, com isso, você conseguirá controlar a inflação e reduzir a importação”.

Morais afirmou ainda que o déficit não significa um descontrole por parte do governo. “Não quer dizer que o governo está sendo perdulário ou irresponsável. Significa que o governo está preservando o mínimo indispensável de serviços públicos, para que a população continue sendo atendida, e também a transferência necessária de renda, para evitar uma situação de calamidade, essencialmente na população pobre”, colocou.

“E isso em nada faz com que a inflação continue, nem prejudica as contas públicas. E, jogando o equilíbrio para o ano que vem, reduz o sacrifício mais forte em cima do povo e da própria produção”, concluiu.