Pochmann: Com juros altos, BC se contrapõe a esforço fiscal do governo

Um dia após o Comitê de Política Monetária (Copom) anunciar a manutenção da taxa básica de juros em 14,25%, o economista Márcio Pochmann desconstruiu o discurso que embasa a defesa dos juros altos. Em entrevista ao Portal Vermelho, ele citou números que demonstram o equívoco de usar a Selic para reduzir uma inflação que nada tem a ver com a demanda. E criticou a política do Banco Central, que estaria na contramão do esforço fiscal promovido pelo governo.

Por Joana Rozowykwiat

Marcio Pochmann

“Estamos há 30 meses com a taxa de juros em trajetória crescente. A Selic saiu de 7,5% para 14,25%. Nesse período, tivemos uma inflação que saiu de 6,5% para 9,7%. Significa dizer que a elevação da taxa de juros não tem produzido resultados efetivos acerca do comportamento da inflação”, constatou o professor do Instituto de Economia da Unicamp, em conversa por telefone, nesta quinta (22).

Na verdade, segundo o economista, “estranhamente, há uma relação convergente entre aumento da taxa de juros e aumento da inflação”, destacou. “Se nós tomarmos o período anterior, de julho de 2011 a abril de 2013, tivemos leve queda na taxa de inflação e, no mesmo período, ocorreu uma queda na taxa de juros. O que estou querendo dizer é que o enfrentamento da inflação no Brasil, a partir da variação da taxa de juros, não produz resultados efetivos”.

Para entender a inflação brasileira

A explicação é simples. Como apontam vários economistas, a inflação brasileira não resulta da ampliação do consumo, o que exigiria, portanto, uma taxa de juros maior para cortar a demanda e, com isso, evitar que os preços subam. O aumento de preços no país, explicou Pochmann, é uma inflação de custos.

“A natureza da inflação atual é uma inflação de custos, provocada pela própria liberação dos preços administrados – como combustível e energia elétrica -, e também pela elevação de custos provocada pelo aumento de impostos e taxas – como é o caso que envolve as desonerações. Quer dizer, está aumentando o imposto para quem estava diante de uma tributação menor. Há o aumento da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico ) do combustível”, enumerou.

Pochmann citou ainda a própria taxa de juros elevada e a política cambial como fatores que têm pressionado os preços. “Há o próprio aumento da taxa de juros, que é componente de custos, especialmente para setores que dependem de endividamento, crédito. E, por fim, a natureza da inflação atual também decorre da taxa de câmbio, da política cambial, que provocou uma maxidesvalorização do real frente ao dólar e, por consequência, há um aumento de custos para setores que importam produtos”.

Um Banco Central gastador

E, para uma inflação que claramente é de custos, a taxa de juros pouco tem a oferecer como medida efetiva de combate à inflação, advertiu o professor. Segundo ele, nada justifica então a manutenção da Selic em um patamar tão elevado.

“A não ser a persistência dos equívocos do Banco Central, que tem tido uma atuação contrária àquela perseguida pelos ministérios da Fazenda e do Planejamento. Os ministérios da área econômica têm feito um esforço de corte de gastos públicos e de tentativa de elevação de receita, ao contrário do Banco Central, que tem tido um papel de gastador, em última instância, porque a taxa de juros, nesse patamar, impõe um aumento de gastos financeiros para pagar os juros da dívida, que só crescem”, criticou.

Pochmann, que é ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ressaltou que, em 2014, o pagamento de serviços da dívida comprometeu 5,7% do PIB. Por causa da política de elevação da taxa de juros, praticada pelo BC, em 2015, o pagamento de juros da dívida deverá representar cerca de 8,7% do PIB, ou seja, três pontos percentuais a mais.

E não é só isso. “No patamar atual, os juros dificultam a recuperação da economia e aprofundando a recessão, provocando mais desemprego e queda na taxa de lucro das empresas”, concluiu.