Flávio Dino: Sair da crise

Derrotamos a ditadura, acabamos com a hiperinflação e tivemos um ciclo de inclusão social. É preciso criar um diálogo responsável para não ameaçar as conquistas.

Por Flávio Dino*

Flavio Dino governador do Maranhão

Nos momentos de crise, há os que escolhem se esconder debaixo das copas das árvores até que as dificuldades cessem; aqueles que tocam fogo na floresta; e os que sobem até o alto das árvores para enxergar a solução dos problemas. Creio que esta posição é a melhor para os que colocam o interesse nacional no centro da ação política.

O Brasil venceu muitos obstáculos para finalmente chegar a um período de plena democracia política, estabilidade econômica e conquistas sociais. Nos anos 1980, com a liderança do PMDB de Ulysses Guimarães e Tancredo Neves, derrotamos a ditadura. Nos anos 1990, sob a hegemonia do PSDB de Fernando Henrique e Mário Covas, vencemos a hiperinflação. Nos anos 2000, com a direção do PT de Lula e Dilma, tivemos um ciclo de inclusão social. Essa trajetória está em jogo na hora presente.

Trata-se de constatar alguns fatos graves: o descrédito que atinge as instituições políticas; a volta da inflação em patamar acima do razoável; e a recessão e o desemprego. Precisamos que todas as lideranças políticas coloquem esses pontos em primeiro plano, unindo-se com uma pauta nacional, para a qual sugiro três itens imprescindíveis: respeito à autonomia do sistema de Justiça, preservação da governabilidade institucional e busca da governabilidade social.

Sobre a Justiça, é preciso separar a pauta da política da pauta da polícia. Ao mesmo tempo em que todos devem garantir que a polícia, o Ministério Público e o Judiciário apurem denúncias e combatam a corrupção com independência, é necessário que a política recupere seu papel insubstituível de organizar o processo decisório sobre o desenvolvimento do País. Discussões inúteis e inconstitucionais, do tipo "controle sobre as investigações", devem ser abandonadas.

Acerca da governabilidade institucional, não é razoável manter uma confusão generalizada ou defender teses juridicamente insustentáveis, como um impeachment por impopularidade, ainda que expressando uma maioria ocasional.

Impeachment no presidencialismo é sanção por crime de responsabilidade comprovada e dolosamente cometido pelo chefe do Poder Executivo. Não equivale à moção de desconfiança do parlamentarismo. Logo, defender a tese do impeachment presta-se exclusivamente a aprofundar a deslegitimação do Estado Democrático de Direito, já aguda como as pesquisas têm mostrado, com índices de alta reprovação para todos os Poderes da República.

Exatamente por conta do que tais pesquisas registram, precisamos de uma nova agenda de desenvolvimento, que rompa com as armadilhas do financismo dogmático e reconstrua a governabilidade social. O ajuste fiscal é necessário, mas isso não pode ser conduzido para um ciclo vicioso ladeira abaixo: mais juros, aumento da dívida, cortes de despesas públicas, recessão, menos arrecadação, e assim em movimento retilíneo uniforme até o abismo.

Um primeiro passo é deter a alta dos juros, que desencadeia tantos efeitos negativos. E aumentar tributos de quem pode e deve pagar mais: bancos, grandes fortunas e heranças milionárias.

Devemos sair da agenda que hoje aprisiona a esperança da nação. É hora de fazer com que o País retome sua capacidade de crescimento e isso só será possível quando suas lideranças encontrarem um caminho correto, que preserve as instituições democráticas, recupere a estabilidade econômica e avance na justiça social.

Construir um ambiente de diálogo responsável não significa abrir mão de convicções, e sim zelar pela normalidade saudável da alternância no poder, sem as rupturas cíclicas do passado. É hora de mais humildade e de menos intolerância.