Rivera, preso político nos EUA: ‘Espero sair incólume desse lugar’ 

Acaba de completar 34 anos na prisão, mas o prisioneiro político portorriquenho Óscar López Rivera afirma que, com a ajuda do presidente Barack Obama, espera "sair incólume” do cárcere, para "beijar a terra” assim que voltar para a ilha.

Por Por María Peña, La Opinión 

Óscar Rivera

López Rivera, de 72 anos de idade, purga uma condenação de 70 anos nos EUA após ser sentenciado por sedição, por seus vínculos com o extinto grupo independentista Forças Armadas de Libertação Nacional (FALN), e, desde 1998, está em uma prisão em Terre Haute (Indiana).

Em entrevista exclusiva por telefone o jornal La Opinión, López Rivera afirma que esteve a par dos atos de solidariedade dos últimos dias para exigir sua colocação em liberdade, e descreve seus planos de futuro para quando, finalmente, sair livre.

Isto se Obama conceder a solicitação de clemência, que permanece em revisão desde 2011 pelo Departamento de Justiça.

Do contrário, e se não intervir outro presidente na Casa Branca, o prisioneiro político com mais tempo em uma prisão estadunidense terá que esperar até 2023 para sair em liberdade sob palavra. Ainda que vítimas da violência da FALN se oponham à sua liberdade, a maioria dos portorriquenhos a apoia.

Você acompanhou os atos do fim de semana para exigir sua liberdade?

López Rivera: Fiz várias ligações e assim pude inteirar-me do que estava ocorrendo em Porto Rico e em Nova York. Deram-me um ‘play by play’ da caminhada em Porto Rico, da marcha em Nova York. Em Porto Rico, caminharam debaixo de chuva, quase celebrando a chuva, e pude escutar as palavras de ordem. Também falei com várias das mulheres que se reúnem em Porto Rico (no último domingo de cada mês) para me apoiarem.

Sei que há presidentes, vários Prêmios Nobel e grupos religiosos metidos nesse movimento. Isto, para mim, é algo muito bonito, muito emocionante. São esforços muito importantes e os agradeço profundamente.

O que tem sido o mais difícil da vida na prisão?

Estar preso nunca é fácil, mas existe saúde, boas energias e boas vibrações. O mais duro, para mim, é manter os laços familiares, essa distância que existe entre mim e a família.

Também a separação do povo, porque sempre trabalhei com a comunidade, algo que, verdadeiramente, desfrutava.

A prisão é um ambiente hostil, desumanizador, que nos rouba nossa fibra humana, mas luto para não me institucionalizar: mantenho uma rotina, uma agenda carregada, porque não quero dar meu tempo aos carcereiros. Leio muito – a leitura é um tempo sagrado – desenho, escrevo cartas, faço exercício e sempre busco laços com a minha família, com as pessoas de fora.

Você se mantém em contato com a sua família?

Mantenho uma boa comunicação com a minha filha, com a minha família. Quase todos os dias, nos comunicamos por telefone, por e-mail.

Estive 12 anos e quatro meses (quando fiquei em isolamento solitário), onde só podia fazer duas ligações de 15 minutos por mês, e, para a minha filha, o custo de viajar de Porto Rico para visitar-me onde eu estava era muito alto. A comunicação com minha mãe, com a família, era bem limitada. Minha neta tinha sete anos quando a pude abraçar pela primeira vez.

Você acredita que o presidente Obama lhe dará clemência antes que ele deixe a Presidência?

Vivo da esperança, nunca a perdi. Se (Obama) ele crê na justiça, se dá atenção e estuda o meu caso, ele pode oferecer clemência

O presidente Bill Clinton fez isso, mas não aceitei a oferta (de 1999) por duas razões: primeiro, porque quando a ofereceu excluiu vários dos meus companheiros e eu não deixo ninguém para trás, e, segundo, porque era uma liberdade com condições.

Qual a primeira coisa que fará quando regressar a San Sebastián?

Não gosto do otimismo ilusório, mas a primeira coisa que farei é beijar minha terra; estou há muito tempo longe do meu povo.

Minha família me faz falta, me fazem falta o arroz com ervilhas, os tostones… ah e o abacate. Também quero trabalhar em vários projetos no longo prazo. Gostaria de trabalhar para forjar a unidade da diáspora portorriquenha e Porto Rico. Que não nos vejamos como dois grupos separados, os 3,5 milhões em Porto Rico e os 5 milhões nos EUA, mas como uma só força, porque temos o coração grande e somos compassivos, e devemos cultivar isto. Gostaria de trabalhar em programas educativos, conquistar coisas factíveis para ganhar a confiança de que podemos avançar como povo.

Você tem sido comparado ao falecido líder sul-africano Nelson Mandela, e ele teve uma transformação na prisão. Qual é a sua?

Eu posso viver com a consciência tranquila. Sou veterano de guerra, estive no Vietnã, e considero que a vida humana é bem sagrada. Condeno a pena de morte, então, como posso apoiar a violência?

É preciso contextualizar a luta de Mandela contra o regime racista, o que ele fez e o processo evolutivo que ele teve, desde que ficou preso por 27 anos, até que saiu livre nos anos 1990. Ele mudou radicalmente (abandonou a luta armada), mas também conseguiu lutar pelos direitos da população negra… o governo terminou cedendo às pressões. Posso dar o exemplo da luta em Vieques. O povo portorriquenho conseguiu tirar a Marinha dos EUA de Porto Rico sem recorrer à violência e creio que isto indica que tem havido uma mudança.

Como você vê a crise atual em Porto Rico?

A crise dura muitos anos e em si é econômica, por causa da dívida, mas tem sequelas graves. Há uma fuga de cérebros, uma emigração forçada porque Porto Rico não oferece futuro à juventude. Porto Rico não está em condições de pagar a dívida, mas o capital humano é o mais valorizado que temos, e se as pessoas se veem forçadas a emigrarem, se perde a dinâmica do povo, da identidade nacional. Isso me preocupa.

O discurso político portorriquenho necessita se superar, que vá com a verdade adiante, que seja um discurso são, ético e que considere a dignidade do povo. Creio que como nação temos que transcender a mentalidade colonizadora, trabalhar pela reconciliação nacional, pela unidade, trabalhar no projeto de país.

Qual é a sua mensagem para o povo portorriquenho?

As visitas que recebo de líderes portorriquenhos me trazem muita esperança, energia. Agradeço, profundamente, a solidariedade que todos me expressam e quero seguir lutando pelo meu país, pela minha gente. Mantenho a cabeça erguida e espero sair incólume deste lugar.