Wadih: Gilmar Mendes fala muito, desrespeita seus pares e a sociedade

Em entrevista à Rede Brasil Atual, o deputado federal Wadih Damous (PT-RJ) rebateu mais uma declaração polêmica do ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes. “O ministro fala muito, com impropriedade, sobre diversos assuntos. Ele desrespeita os seus próprios pares e a sociedade brasileira ao reter indevidamente há mais de um ano os autos da ação que trata do financiamento empresarial das campanhas eleitorais”, diz o parlamentar.

Wadih Damous deputado federal PT-RJ

Ao site Brasil 247, Mendes declarou que “a OAB, na prática, foi laranja do PT" na ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 4.650, na qual a entidade sustenta que financiamento de empresas a campanhas eleitorais fere o princípio da Carta Magna segundo o qual "todo poder emana do povo e em seu nome será exercido". O julgamento foi interrompido em 2 de abril de 2014, por pedido de vista do próprio Mendes, quando estava 6 a 1 a favor da tese da OAB, e até hoje não foi devolvido ao Plenário da Corte.

Enquanto isso, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), conseguiu a aprovação de emenda que “constitucionaliza” a doação privada na quarta-feira 27, em processo legislativo também contestado por deputados no Supremo.

O presidente nacional da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coêlho, e o Colégio de Presidentes das Seccionais da OAB também reagiram à fala de Gilmar Mendes. "Essa afirmação descabida e desrespeitosa não está à altura da liturgia e educação que se aguarda de um dos membros do STF", diz Marcus Vinícius, em nota. “O que a sociedade aguarda do ministro Gilmar Mendes é seu o voto no julgamento que discute o financiamento de empresas nas eleições. É dever do ministro manifestar-se nos autos, não através de comentários caluniosos na imprensa”, afirmou o colegiado da OAB.

Para Wadih Damous, um dos signatários e mentores do mandado de segurança contra a votação imposta por Eduardo Cunha, ao contrário do que se apregoa a aprovação da emenda sobre financiamento privado não joga por terra o julgamento da ADI da OAB, para a qual uma emenda constitucional não pode suspender cláusulas pétreas.

Leia a entrevista do ex-presidente da OAB do Rio de Janeiro e presidente licenciado do Comissão Nacional dos Direitos Humanos da OAB federal.

Como o senhor recebeu a declaração de Gilmar Mendes de que a OAB é laranja do PT na ação contra o financiamento privado?

A fala é lamentável, desrespeitosa, o que aliás tem caracterizado ultimamente as manifestações do ministro Gilmar Mendes. O ministro fala muito, com impropriedade, sobre diversos assuntos. Fala sobre assuntos que vai julgar, o que é proibido pela Lei Orgânica da Magistratura. Ele desrespeita os seus próprios pares e a sociedade brasileira, ao reter indevidamente há mais de um ano os autos da ADI (4.650) da OAB que trata do financiamento empresarial das campanhas eleitorais.

Então, a fala do ministro merece todo o nosso repúdio. Além do mais ele tem de prestar atenção quando falar da OAB. A OAB é uma entidade da história do Brasil, que prestou e presta relevantes serviços à sociedade brasileira. O ministro Gilmar Mendes, quando se aposentar, dificilmente será lembrado pela posteridade. A OAB não, ela merece respeito, tem história e não pode ser desrespeitada.

O financiamento empresarial é objeto da ação da OAB e por outro lado foi aprovada a proposta, na semana passada, que tornaria inócuo o julgamento do STF. E ainda tem o mandado de segurança que deputados, entre os quais o senhor, impetraram no Supremo. Qual sua expectativa para o desfecho desse imbróglio?

Tem dois aspectos aí. Primeiro, a luta no Congresso não acabou ainda, porque são dois turnos de votação. Tem o Senado Federal também. Por mais difícil que seja, não acabou. Segundo: ainda que venha a prevalecer essa alteração que o Eduardo Cunha fez, no nosso ponto de vista isso não encerra a ADI da OAB. Por quê? A própria fundamentação do voto do relator (Luiz Fux), do julgamento que está 6 a 1, é no sentido de que os princípios da igualdade e democrático são desrespeitados com a previsão de financiamento privado. Os dois princípios são cláusulas pétreas, e nem uma emenda constitucional pode derrogar cláusula pétrea. E por outro lado, temos fundadas esperanças de que o mandado de segurança será acolhido pelo Supremo.

A ministra Rosa Weber foi designada relatora do mandado de segurança. Qual sua expectativa sobre o posicionamento da ministra?

Temos absoluta convicção sobre o direito que está sob apreciação da ministra Rosa Weber. Temos muitas esperanças de que ela conceda a liminar e suste o processo deliberativo dessa PEC. Não temos por que duvidar da capacidade e da sensibilidade jurídica da ministra.

O ministro Luiz Fux, relator no STF da ação da OAB interrompida por Gilmar Mendes, no último dia 29 negou seguimento a um processo contra a condução, por Eduardo Cunha, da inclusão de emenda sobre PPPs, justificando ser competência do Legislativo. Essa decisão pode se relacionar com o tema do mandado de segurança dos deputados contra a PEC do financiamento privado?

Não. A “causa de pedir” do nosso mandado de segurança (contra o financiamento privado) reside na Constituição, não é no regimento interno. O Supremo já tem uma posição firmada, quando se trata de questões relativas ao regimento interno o tribunal entende que se trata de assunto interna corporis e não interfere. Agora, no caso do mandado de segurança, o que nós estamos afirmando é que o devido processo legal legislativo foi desrespeitado por conta de violações de preceitos constitucionais. Não tem nada a ver com o julgamento recente que você citou envolvendo o ministro Luiz Fux.

Ainda sobre o mandado de segurança dos deputados contra a PEC do financiamento privado, é inquestionável que o processo legislativo de Eduardo Cunha violou cláusulas pétreas?

No nosso ponto de vista, sim. Vamos ver como o Supremo vai se manifestar.