Sinergia política impulsiona a dinâmica econômica Sino-Brasileira

Talvez nada esteja a moldando mais as vicissitudes na América Latina e Caribe do que o engajamento da China na região através dos compromissos assumidos na última década, que recentemente manifestaram se na visita oficial do premier chinês Li Keqiang a quatro nações sul-americanas.

Por Cui Shoujun e Gaio Doria*

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Esta viagem é parte integrante dos esforços contínuos dos chineses para promover a cooperação econômica e financeira, aumentar a confiança política, e aprofundar o intercâmbio cultural em todos os níveis.

O Brasil foi a primeira parada, não apenas pelo país ser a maior economia da América do Sul, mas também por ocupar posições proeminentes em diversos organismos intra-regionais e internacionais, como o Mercosul, o Brics, o G20, o Basic (um grupo para negociações sobre mudança climática constituído por Brasil, África do Sul, Índia e China). Ademais, está é a segunda vez em menos de um ano que uma liderança chinesa faz uma visita oficial ao país, o que denota claramente a importância estratégica que a China atribui as relações sino-brasileiras.

A presidenta Dilma Rousseff em entrevista ao jornal chinês China Business News fez eco as inciativas chinesas de maneira entusiástica. Como o próprio Premier Li colocou durante sua visita, esta relação bilateral é essencial, pois se trata de duas importantes economias emergentes e os maiores países em desenvolvimento dos hemisférios oriental e ocidental.

O propósito da vista de Li, além de anunciar investimentos nas áreas de energia, mineração, manufatura e infraestrutura, foi de renovar o Plano de Ação Conjunta entre os dois países. A renovação já havia sido anunciada pelo presidente Xi Jinping durante sua vista ao Brasil em julho de 2014, o plano foi estendido até 2021. O novo documento pode ser considerado como um avanço no plano político e um passo concreto na definição e implementação de áreas importantes de cooperação, em especial na cooperação cientifico-tecnológica.

O comércio bilateral é o principal motor por detrás da dinâmica econômica sino-brasileira. A China é o principal parceiro comercial do Brasil, enquanto o Brasil é o maior parceiro comercial da China na América Latina. As estatísticas apontam que o comércio bilateral cresceu 13% em termos de valor de 2001 até 2013.

O ganho é mútuo, pois enquanto a China adquire recursos naturais desta relação de comércio, o Brasil se beneficia como uma forte demanda dos seus produtos exportados. Como diversos estudos apontaram, a razão principal pela qual o Brasil conseguiu escapar, relativamente intacto, da crise global de 2008 foi devido as compras chinesas e a entrada de receita na balança comercial. Grandes companhias brasileiras beneficiam-se substancialmente da demanda chinesa. A Vale tornou-se uma das maiores companhias mineradoras do mundo. A Petrobras, não apenas assistiu a uma explosão de produtividade e exportação, mas também a entrada de investimentos chineses. A Embraer abriu sua primeira fábrica de aviões no exterior na China, o país asiático tornou-se seu principal consumidor, atrás apenas dos Estados Unidos.

Contudo, a desaceleração do crescimento econômico da China, a queda dos preços das commodities, juntamente com problemas internos do Brasil arrastaram para baixo o crescimento da economia brasileira. Em 2014, a taxa de crescimento econômico foi de apenas 0,1 %. Neste sentido, a visita de Li Keqiang poderá dar um grande impulso para a economia, pois foi afirmado que a demanda de importação chinesa continuara estável no longo prazo. Além disso, a entrada da carne brasileira no mercado chinês certamente expandirá a pauta de exportação e trará novas receitas para o Brasil.

O motor secundário nessa relação bilateral é o investimento. O projeto ferroviário transcontinental ligando o Oceano Atlântico com o Oceano Pacífico através do Brasil e do Peru foi endossado pelo premiê chinês. Quando concretizado, permitirá ao Brasil receber e enviar produtos através do Pacífico, diminuindo os custos de exportação e importação. Está é também um oportunidade chave para a China exportar sua tecnologia ferroviária e impulsionar o setor no contexto de desaceleração da economia doméstica chinesa. A conectividade territorial através desta região certamente funcionará como um catalisador para o crescimento econômico.

O investimento estrangeiro direto na América Latina caiu drasticamente no ano passado, com os investidores voltando suas atenções para outras regiões, fenômeno este, em grande parte explicado pelo mau desempenho econômico da região. De acordo com uma análise recente sobre o tema, o investimento de capital na região caiu 39 %, enquanto o número de projetos de investimentos diretos de tipo greenfield diminuíram 16% em 2014. Neste contexto, o investimento chinês fornece uma ajuda oportuna.

No ano de 2014, um grande mudança surgiu no setor de investimentos da China. Pela primeira vez na história, o investimento direto no exterior da China ultrapassou o investimento estrangeiro direto na China, tornando o país um exportador de capital. Embora a China seja apenas o 12º maior investidor no Brasil, o potencial a ser explorado é enorme.

Pode se argumentar que as relações China-Brasil estão em uma fase de transição. Ambos os lados estão engajados em superar o comércio de commodities e avançar para uma cooperação mais profunde em diversos outros aspectos. Os papéis que a China e o Brasil desempenham em instituições emergentes como o Asian Infrastructure Investiment Bank (AIIB) e o Banco de Desenvolvimento dos BRICS são sinais claros dessa tendência.

O Brasil foi o primeiro país a firmar uma parceria estratégica com a China no mundo. Como se trata de uma parceira de longa data, o Brasil irá desempenhar um papel chave nos planos chineses para a América Latina, não apenas na esfera econômica, mas também na política.

* Cui Shoujun é Diretor do Centro de Estudos Latino Americanos da Universidade do Povo da China (Renmin University of China) e pesquisador da Academia Nacional de Desenvolvimento e Estratégia.

* Gaio Doria é historiador pela Universidade Federal Fluminense, mestre em Economia Chinesa pela Universidade do Povo da China (Renmin University of China) e doutorando no Departamento de Marxismo na mesma universidade.