Ciência: Transformar o câncer avançado em doença crônica

Nos próximos 20 anos, o número de novos casos de tumores malignos deverá aumentar em todo o mundo, devido fundamentalmente ao envelhecimento da população, ao elevado número de fumantes – ativos e passivos – e aos estilos de vida pouco saudáveis.

Por Vivian Collazo Montano*, na Prensa Latina

Cimavax

Contudo, especialistas asseguram que em um futuro não muito distante o diagnóstico e o tratamento das mais de 200 enfermidades que se englobam sob a denominação de câncer experimentará uma autêntica revolução.

Os avanços da genômica e o conhecimento das alterações moleculares que cada tipo de neoplasia provoca têm aberto as portas ao desenvolvimento de novos fármacos com o objetivo de incrementar a sobrevivência e a qualidade de vida dos afetados.

As novas terapias baseadas em produtos biotecnológicos – anticorpos monoclonais e vacinas – podem transformar o câncer avançado em uma doença crônica, assinalou o doutor Agustín Lage, diretor do Centro de Imunologia Molecular (CIM) em Cuba.

São tratamentos voltados para a especificidade, a longa duração, a pouca toxicidade, o uso combinado e a factibilidade de aplicação, disse o especialista à Prensa Latina.

Em nível global, da totalidade de pacientes com tumores malignos, aproximadamente três por cento recebe alguma forma de imunoterapia, e a previsão é que na próxima década este tipo de terapia alcance 60%, assinalou.

Portanto, a pergunta hoje não é se a imunoterapia tem ou não resultados eficazes, mas por quanto tempo e em quais pacientes, pontuou o cientista.

Ele também manifestou que é necessário uma mudança no paradigma clínico e no enfoque desta enfermidade, quer dizer, considerar o câncer avançado como uma doença crônica, incurável, mas controlada.

“As pessoas perguntam sobre a cura dos tumores malignos; é verdade que alguns podem ser curados, mas a evolução da ciência vai no sentido da cronicidade, do controle, que é o que ocorre em doenças como a diabetes, a hipertensão arterial, a artrite”.

“São enfermidades tão incuráveis como o câncer, há tratamentos tão eficientes que as tornam controláveis, asseverou. Mas estamos seguros de que com as neoplasias ocorrerá o mesmo, e cada vez mais veremos pacientes com tumores compatíveis com uma boa qualidade de vida”, disse.

O cientista destacou que o peso da doença oncológica na população está mudando, não porque haja mais câncer, mas porque as pessoas vivem mais anos.

“Os tumores malignos, assim como outras enfermidades como as cerebrovasculares e cardíacas, aumentam com a idade, pelo que, na medida em que temos mais pessoas em idade avançada haverá maior prevalência de câncer”, afirmou.

“Ao mesmo tempo, os pacientes têm maior sobrevida, porque os tratamentos são melhores, resultado da atividade científica”, expressou.

O doutor Agustín Lage se referiu à vacina terapêutica CIMAvax-EGF, primeira deste tipo no mundo para tratamento do câncer de pulmão de células não pequenas, desenvolvida em Cuba por especialistas do CIM.

Ele manifestou que a biologia vai abrindo caminho. Vários ensaios clínicos são levados adiante em países da Europa e da América Latina, e cresce o interesse pelo produto, como o demonstrado por cientistas estadunidenses que recentemente visitaram a ilha.

CIMAvax-EGF, segurança e eficácia

As pesquisas científicas realizadas com a vacina têm demonstrado que o produto é efetivo e favorece a sobrevivência e a qualidade de vida, assegurou à Prensa Latina Elia Neninger, especialista em oncologia clínica e principal pesquisadora dos estudos clínicos do composto.

Ensaios realizados durante cerca de 20 anos permitiram demonstrar que o produto é seguro, e aumenta a sobrevida nos pacientes tratados.

Não obstante, considerou que a vacina deve ser aplicada somente em indivíduos diagnosticados com câncer de pulmão de células não pequenas em estágios avançados, uma vez que tenham terminado a primeira linha de tratamento com quimioterapia e apresentem uma resposta ou controle da doença.

“São eles os que melhor podem ser beneficiados”, asseverou.

“Existem vantagens para este grupo de pacientes e destes resultados se derivarão novas ações terapêuticas, como é o caso de um estudo realizado para analisar a concentração de EGF como preditor de resposta”, disse.

Neninger assinalou que para o desenvolvimento da vacina se buscou a melhor proteína transportadora e o melhor adjuvante, este último importado pela empresa francesa Seppic, que estimula e melhora a imunogenicidade, e se provaram distintas formulações e esquemas terapêuticos.

Além disso, declarou que a CIMAvax-EGF está registrada em Cuba desde 2008, encontra-se incluída no quadro básico de medicamentos, e em breve será incluída nos guias de tratamento de câncer.

Ressaltou que na atualidade se realizam outros ensaios de combinações e esquemas, assim como estudos para sua aplicação em outras localizações do câncer, como o de próstata, mas considerou que ainda há muito a pesquisar para melhorar a qualidade da terapêutica, afirmou.

O composto, que provoca una resposta imune e não tem efeitos severos, está registrado também no Paraguai e no Peru, onde foram tratados cerca de 100 pacientes, ressaltou o doutor Diego Venegas, diretor médico do Instituto de Inovação e Biotecnologia.

Os resultados obtidos no Peru são muito similares aos de Cuba, ou seja, o composto aumentou a sobrevivência das pessoas tratadas e melhorou sua qualidade de vida, declarou à Prensa Latina durante a 5ª Oficina Internacional CIMAvax-EGF, que recentemente teve lugar no Palácio de Convenções de Havana.

A vacina foi registrada no Peru em 2008, explicou Venegas, que destacou a importância de selecionar bem os pacientes nos quais se deve aplicar. “Somente assim o benefício será o esperado”, afirmou.

*Chefe da Redação Ciência e Técnica da Prensa Latina.