Educação Moral e Cívica foi pensada para sustentar valores da ditadura

“Para além de toda a violência, a ditadura provocou grande prejuízo sobre a educação e isso permanece ate hoje. A disciplina Educação Moral e Cívica foi um dos grandes projetos dos ditadores para construir valores na sociedade, adequados ao ideal de segurança nacional”, analisa o professor Cleber Santos Vieira, do Departamento de Educação de Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

General Costa e Silva - Reprodução

Vieira ajudou a organizar o debate sobre impactos da ditadura na educação para a Comissão Estadual da Verdade, da Assembleia Legislativa paulista. Segundo ele, a inserção da temática de direitos humanos na educação estava sendo debatida nos anos 1960, mas foi suprimida pela ditadura. Assim como outros projetos, como os de educação popular.

No início da década de 1960 havia muitos projetos de educação adulta popular como o ''De pé no chão também se aprende a ler'', com ideal participativo e cidadão, que foram destruídos para implementação de um modelo semelhante ao que existe hoje na Educação de Jovens e Adultos (EJA). Os idealizadores desses projetos acabaram presos e banidos.

''Foi um projeto sistemático e bem pensado para destruir a estruturação do ensino e projetos que estavam em curso'', afirmou Vieira. Ele destaca ainda a exclusão de conteúdos como História e Geografia, substituídos pela disciplina Organização Social e Política do Brasil (OSPB).

Anísio Teixeira, ministro da Educação do governo João Goulart, foi quem incluiu a OSPB no currículo, em 1962. A proposta de Teixeira era dar conhecimento de leis e questões políticas para que o povo pudesse interferir com melhores condições nas decisões da sociedade. ''A ditadura sugou a ideia e a colocou a serviço da doutrina de segurança nacional'', afirmou Vieira.

O pesquisador lembra que o projeto de educação da ditadura buscava ainda esvaziar o conteúdo crítico do currículo brasileiro. Não era só dentro da sala de aula, tinha de cantar o hino todo dia, por exemplo. E apesar do apoio do órgão americano de desenvolvimento da época – a Usaid –, não se apropriou de ideários como o a formação cidadã da população, extremamente comum nos Estados Unidos e na França, por exemplo.

Para a coordenadora de Direito à Memória e à Verdade da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, Carla Borges, a educação em direitos humanos é fundamental para evitar a repetição da historia. ''É importante dar pleno conhecimento a todos, mesmo aqueles que não passaram por isso. Todos ainda vivenciamos violência que vem desde então. Já se sabe hoje que naquele tempo também havia ações de higienização e extermínio. Educação e cultura são o caminho'', afirmou.

Para Carla, esse espaço na educação é muito importante porque a escola é um espaço de construção de memoria coletiva. Ela se disse preocupada ao ver pessoas em manifestações pedindo a volta da ditadura. ''É preciso fazer essa conexão entre passado e presente para que os jovens entendam e se interessem pelo tema'', afirmou.

Fonte: RBA