A Petrobras e o 13 de março, há 51 anos e agora

O “13 de março” que passou à história foi o do Comício da Central do Brasil, no Rio de Janeiro, em 1964. Tínhamos um governo de centro-esquerda, a esquerda dispunha de certa força e achava que tinha mais. O movimento social crescia.

Por Haroldo Lima*, para o Portal Vermelho

Marcha com deus em 1964 - Reprodução

Comando Geral dos Trabalhadores, Ligas Camponesas, Sindicalismo Rural, União Nacional dos Estudantes, Frente de Mobilização Popular, tudo pleiteando as “reformas de base”. Havia exageros e ilusões, mas nada que ameaçasse as instituições democráticas da época. O que existia mesmo era a esperança de que aquelas “reformas” dariam novo impulso ao país.

Os que usufruíam de privilégios sentiram-se ameaçados. Com a grande mídia, começaram a pregar o golpe. “Marchas” foram feitas supostamente para “salvar a democracia”. Três governadores perfilaram-se nessa cantilena. O governo americano engajou-se para “restabelecer a ordem” no hemisfério.

Quem estava no Governo tinha a impressão de ter o poder. Mas não tinha. Havia um “Almirante do Povo”, Cândido Aragão, comandando os Fuzileiros Navais, um “Marechal do Povo”, Osvino Alves, presidindo a Petrobras, um “dispositivo militar”, mais ou menos desconhecido. E só. O golpismo cresceu, capitaneado pelas forças mais retrógradas do país e, dezoito dias depois, o governo foi derrubado.

Para “salvar a democracia”, destruíram-na. E destroçada ela ficou por 21 anos. Os três “chefes civis” do Golpe foram alijados. O que governava São Paulo, Ademar de Barros, foi cassado e morreu no exílio. O que governava Minas terminou isolado na Oposição. E o principal deles, Carlos Lacerda, que governava o Rio, e que denunciava o “mar de lama”, foi preso em 1968. Parte da mídia golpista passou a funcionar com censores na redação.

O cotidiano mudou. Ao invés de passeatas, discursos, reivindicações, greves, essas coisas naturais à democracia, vieram “atos institucionais”, cassação de parlamentares e juízes, perseguições, intervenção em sindicatos, fim de eleições diretas, arrocho salarial, constituição outorgada, prisões, torturas e assassinatos.

A sociedade conseguiu por fim à ditadura, duas décadas depois e a preço elevado. Discutiu e votou uma Constituição, talvez a que defina mais “direitos” no mundo. Passou às eleições diretas. Chegou a eleger um presidente operário e depois uma mulher, fatos raros no planeta. O Brasil chegou a ser a 7ª economia do mundo, com uma novidade: retiramos da faixa de pobreza algo como 44 milhões de pessoas. Multidões tiveram, pela primeira vez, acesso regular a comida, a salário razoável, a carro, a casa própria, a universidade, a viagem de avião, isto que levou a colunista Danuza Leão a escrever, irritada, que corria o risco de “encontrar em Paris o porteiro do seu prédio”.

Problemas subsistem, outros surgiram, fruto da nova conformação social e das novas exigências. A maré dos negócios internacionais passou a ser de vazante. E o velho problema da corrupção reapareceu, só que desta vez com investigações liberadas e prisões de gente que sempre fez falcatrua e nunca foi presa.

A Petrobras, a maior empresa de capital aberto do mundo em produção de petróleo, que tem uma das maiores reservas de óleo do planeta e que descobriu e desbaratou uma quadrilha de facínoras que a saqueava, de repente é apresentada como uma empresa-problema, de pequeno valor, despertando em grupos externos interesses em sua privatização.

Após o “13 de março” de 1964, onde a Petrobras foi defendida, o golpismo recrudesceu, houve até movimentação de tropa estrangeira, e o Brasil foi derrotado, em 31 de março de 1964.
O “13 de março” de 2015 defende com destaque a Petrobras, orgulho de todos os brasileiros, que querem rigor na apuração e punição do esquema corrupto ali desmascarado, e a querem ilesa.

Diferentemente de 51 anos atrás, depois desse “13 de março”, o golpismo deve ser repelido com energia. Não poderemos brincar com nosso futuro, com a quebra das instituições democráticas, com um impeachment descabido da presidenta recém-eleita, com a volta do militarismo e coisas semelhantes. Tudo isso é amálgama de discurso antibrasileiro.

*Haroldo Lima é consultor de petróleo, ex- diretor geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, ex-deputado federal e membro do Comitê Central do PCdoB.