Rosane Rodrigues: Cooperação Sul-Sul e a diplomacia da Saúde

A Diplomacia da Saúde pode ser compreendida como um mecanismo que une ações e políticas com a ideia de que a saúde é um direito humano fundamental e de que sem ela não há desenvolvimento. Nenhum país pode ser considerado plenamente desenvolvido se sua população não dispõe de serviços médicos básicos.

Por Rosane Rodrigues, na Carta Capital

A cooperação internacional Sul-Sul tem sido primordial no combate ao câncer. - Foto: Marcos Santos/USP

Neste contexto, a cooperação internacional é peça-chave para que a Diplomacia da Saúde seja executada.

O conceito de cooperação internacional definido pelo Itamaraty é amplo e pode parecer longe do cotidiano do cidadão comum. Mas não é bem assim. A cooperação técnica internacional é estabelecida como um instrumento de desenvolvimento para auxiliar o país a alavancar mudanças estruturais nos campos econômico e social por meio de ações de fortalecimento institucional.

O entendimento central é transferir ou compartilhar conhecimentos, experiências e boas práticas por intermédio do desenvolvimento de capacidades humanas e institucionais.

Na área da saúde, em especial no combate ao câncer, a cooperação internacional Sul-Sul tem sido primordial. Hoje, uma pessoa pode ser tratada no Rio de Janeiro com um remédio cubano.

Cooperação contra o câncer

Segundo o Instituto Nacional do Câncer, Cuba é o único país da América Latina produzindo anticorpos monoclonais, que podem ser base de tratamentos de tumores malignos focados somente nas células doentes.

A cooperação científica entre Brasil e Cuba começou a funcionar em 2004 e é considerada fundamental para o tratamento contra o câncer. No ano anterior, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva visitou Cuba, ocasião em que foram assinados 12 instrumentos de cooperação em diversas áreas. A ideia da parceria é garantir o acesso de pacientes dos dois países a remédios e vacinas terapêuticas.

O ano de 2011 consolidou a parceria com quase 60 projetos de pesquisa e desenvolvimento. Um dos principais documentos é o que permite transferir tecnologia de Cuba para produzir o medicamento Heberprot-P, que pode reduzir em até 50% a amputação de pés em diabéticos. O diabetes causa a morte de cerca de 50 mil pessoas por ano no Brasil.

Mercosul e Unasul

O Instituto Nacional do Câncer, com sede no Rio de Janeiro, é designado pela Organização Mundial da Saúde como centro colaborador para o controle do tabaco na América do Sul. Mais do que um título, o Brasil assessora os países do Mercosul para a diminuição do tabagismo.

Há mais de 10 anos, as discussões dos ministros da Saúde do Mercosul incluem pesquisa e debate sobre o controle do tabaco. O Brasil foi o primeiro país da região a reconhecer a saúde como direito de todos e dever do Estado (artigos 196 a 200 da CF/88).

A Unasul, cujo tratado constitutivo foi assinado em 2008 e que engloba 12 países da América do Sul, tem, como propósitos basilares, um plano de integração regional mediante inclusão social, fortalecimento da democracia e redução das assimetrias.

Mais e mais, a saúde é protagonista e as estruturas em Redes do Conselho de Saúde da Unasul formam um caminho para estimular a cooperação e o desenvolvimento na região. Um dos oito conselhos da Unasul, o de Saúde, formado por ministros da Saúde dos Estados-membros, tem como foco fomentar a divulgação e o desenvolvimento de boas práticas de governança pública em saúde por meio de Grupos de Trabalhos e Redes Estruturantes.

Neste âmbito em 2010 foi criado o ISAGS-Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde. Com sede no Rio de Janeiro, é um centro de altos estudos e debates em políticas públicas. A ideia é disponibilizar para os membros do Conselho de Saúde práticas relevantes para a gestão, promover intercâmbios e estimular o conhecimento e as inovações.

Paralelamente, o Conselho tem seis redes estruturantes. Elas são intergovernamentais e favorecem a coordenação, a articulação e a superação das desigualdades. Podem ser classificadas como Redes de Informação (intercâmbio de políticas e programas de tecnologias e capacitação), Redes de Desenvolvimento (conhecimento e tecnologias), Redes de Divulgação (estratégias) e Redes de Ação (decisões práticas).

As Redes são espaços de cooperação técnicas e estimulam ações conjuntas. Uma delas é a RINC-Rede de Instituições Nacionais de Câncer, que funciona como um eixo de articulação e cooperação entre instituições públicas e programas para o controle da doença na região. O Instituto Nacional do Câncer da Argentina (Instituto Nacional del Cancer) foi criado em 2010 em Buenos Aires.

Há constante preocupação para formar e capacitar recursos humanos na região. Ademais, os grupos operativos possibilitaram a criação da Reblac-Rede de Biobancos da América Latina e do Caribe. Um biobanco é uma espécie de biblioteca que guarda um acervo biológico de doadores como células, tecidos e sangue. Encontrar um doador compatível pode ser um tiro no escuro, mas a chance de encontrar um doador de medula compatível cresce consideravelmente com a Reblac. Esse é um exemplo de como a cooperação internacional pode salvar vidas.

No Brasil, a Agência Brasileira de Cooperação é o principal órgão quando se trata de cooperação internacional. A ABC foi criada em 1987 com o apoio do PNUD ( Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e faz parte do Ministério das Relações Exteriores ( MRE).

Por meio da cooperação técnica, o Brasil fortalece suas relações com outros países com ênfase na integração política, econômica e social. É importante ressaltar que não se trata de uma moeda de troca ou uma forma de ganhos futuros. Quando se partilha conhecimentos ou ações, o benefício é geral. Benefício para o país que doa, para aquele que recebe e, principalmente, para a população.

Fonte: Politike/Carta Capital