São Paulo: Por que condenamos a nossa história?

Não raro, vemos comentários nas redes sociais e até matérias que tentam desqualificar os paulistanos. Há uma campanha de difamação que tem como objetivo pregar a alcunha de que todos os que aqui moram são egoístas e conservadores e fazem isso de maneira mais brutal: condenando a sua história. O efeito dessa campanha é devastador, porque sem valorizar a sua história, os paulistanos tornam- se anêmicos, sem autoestima, raízes e identidade. 

Por Ana Flávia Marx para o Vermelho-SP

Isso não quer dizer que a história do paulistano seja uniforme e sem contradições, mas essa história é antes de qualquer coisa, a de seu povo. É claro que a elite tem o seu papel nessa formação, mas não se sobrepõe a participação dos trabalhadores na construção da maior metrópole da América Latina.

E quem é esse povo?

Esse povo são os índios, que antes de Manoel da Nóbrega e José de Anchieta, líderes da missão jesuíta que tinha como objetivo de catequizar os índios do planalto, se estabeleceram no ponto mais alto e plano da colina, que tinha uma enorme clareira, não havia floresta e pela a sua altura dava para avistar as movimentações da linha da Santos-Jundiaí e da estação do Alto da serra a Santo André. O posicionamento do barracão dos jesuítas fez com que em 1560, Mem de Sá transferisse todos os habitantes da Vila de Santo André da Borda do Campo, fundada em 1553, para São Paulo de Piratininga.

Esse povo tem a marca do embate entre as tribos, como a que aconteceu no Conflito da Confederação dos Tamoios, em que os tupinambás intrigados com a aproximação dos portugueses com os guaianases atacaram a vila para acabar com a aliança luso-indígena.

O cristianismo também é um traço do paulistano, visto que a ocupação adquiriu forma policêntrica com diversas aldeias de jesuítas e de outras ordens eclesiásticas.

Os bandeirantes também deixaram a sua estigma. Por que não? Por que jogar na fogueira a história de homens que viviam sob as circunstâncias da época, mais de dois séculos antes da abolição da escravatura com a noção de justiça social de hoje? O marco das grandes expedições que partiram em sertões inexplorados da Colônia em busca de mão de obra indígena, pedras e metais preciosas e que ampliou o território nacional além das Tordesilhas é parte fundamental da história paulistana. Ou o paulistano não é desbravador, assim como eram os milhares de homens – sim não eram poucos, e sim milhares – que seguiam nas expedição de Fernão Dias Pais e Antônio Raposo Tavares?

São Paulo tem na sua constituição histórica a ousadia dos homens do campo, mercadores com recursos limitados que saíram daqui em busca de ouro nas minas.

Tem em sua consciência coletiva a ousadia dos migrantes que cruzaram o país em busca de dias melhores e junto com os trabalhadores paulistanos construíram grandes obras como a São Paulo Raiway, a Estrada de Ferro Sorocabana e a Calçada de Lorena, as obras em torno dos rios Anhangabaú e Tamanduateí, a construção das grandes indústrias.

A esperança de imigrantes que saíram de seus países também é notável no povo paulistano. A alegria expansiva dos italianos que vieram trabalhar nas indústrias, a sensibilidade e técnica agrícolas dos japoneses, o olhar atento dos bolivianos, a garra dos haitianos vão pouco a pouco ficando como vestígio na cultura da metrópole.

A história é implacável e dela não se apaga Nem mesmo o sangue de centenas de jovens que morreram durante o conflito da revolução constitucionalista de 32. Não devemos condenar a história, mas sim aprender com ela.

O paulistano é assim mesmo. Para você quem não é daqui, não importa. Daqui a pouco você já está se sentindo como se fosse, pois com toda essa história, não tem quem não se sinta em casa.