Blecaute: a mídia gritou “lá vem o lobo”

O blecaute que atingiu dez estados brasileiros e o DF ontem (19/1) foi efusivamente comemorado pela mídia hegemônica. Não é para menos, são no mínimo seis anos em que eles preveem em uníssono a iminente “falência” do sistema de geração de energia do país.

Apagão

Em novembro de 2009 a revista Veja, edição 2139, em matéria intitulada “Na idade das trevas” já garantia que era baixa “a confiabilidade do nosso sistema (de geração de energia)”. Em janeiro de 2013 a revista Época, em reportagem intitulada “Por que o risco de apagão é real”, vaticinava um apagão iminente e como sempre se apoiava em “especialistas” escolhidos a dedo: “Mário Veiga, da consultoria PSR, especializada em energia, teme que o país seja surpreendido ainda neste ano, quando o período das chuvas passar, entre abril e maio.” Veiga. que como vimos temia um apagão para maio de 2013, é o mesmo que em vários jornalões que circulam hoje (20/01) aparece triunfante, afirmando que tudo deve piorar. O que aconteceu no dia 19/1, pela duração e extensão, não pode ser caracterizado como apagão, mas para uma mídia que passou seis anos gritando “lá vem o lobo” e nada do lobo aparecer, qualquer gato do mato já é razão para uma festa.

Blecaute, o tom da mídia

O blecaute de 19/1, segundo nota oficial da Operadora Nacional do Sistema Elétrico (ONS), começou às 14:55 e às 15h45 a situação estava “totalmente normalizada”. A mídia hegemônica noticiou, no dia 20/1 da seguinte forma: “Apagão atinge 10 Estados e DF” (Folha de S. Paulo), “Falta de energia e de dinheiro mostra erros do governo” (Folha de S. Paulo), “ONS adota apagão preventivo” (Valor Econômico), “Falhas e calor provocam apagão em 3 regiões” (O Estado de S. Paulo), “Falhas no sistema e consumo podem causar novos apagões” (O Globo), e tome pau na “incompetência” do governo Dilma.

O apagão de FHC, o tom da mídia

O apagão de 2001 durou vários meses. A população foi obrigada a fazer racionamento, as contas aumentaram e por diversas vezes a luz foi cortada. Segundo cálculos do Tribunal de Contas da União (TCU) o Brasil perdeu 54,2 bilhões de reais com o apagão de FHC. A manchete do jornal A Folha de S. Paulo, edição 12/5/01 era: “Faltou alerta para o apagão, diz governo”, e no lead: “o coordenador da Câmara de gestão da crise de energia, Ministro Pedro Parente, culpou a ONS, que coordena a operação do sistema elétrico, pela desinformação do governo sobre a gravidade da crise energética (…) nem o presidente Fernando Henrique Cardoso nem os ministros tinham sido avisados da dimensão da crise”. A manchete da Folha edição 16/5/01 era: “Apagão é necessário, dizem elétricas”.

O apagão de FHC, o tom da mídia II

Manchete do jornal O Estado de São Paulo, edição de 13/5/01: “A crise energética, o que foi que deu errado”. No lead: “Durante quase duas décadas, até a segunda metade dos anos 90, os sucessivos governos mantiveram as tarifas de energia achatadas para conter a inflação, levando distribuidoras e geradoras à inadimplência”. Em toda a matéria da capa o jornal não faz uma única e solitária crítica ao governo. Não existe incompetência no gerenciamento, não existe imprevidência, privatização mal feita, nada disso, o tom é de completa justificativa. Não vamos maltratar mais o leitor com exemplos, todos monocórdios. A forma como a mídia hegemônica tratou a crise de energia ocorrida durante o governo neoliberal de FHC (crise real, abrangente e profunda) e a forma como trata um simples blecaute durante o governo Dilma, revelam toda a sordidez de uma impressa venal e cega de ódio ideológico.

O disfarce

O site Pragmatismo Político publicou matéria informando que o médico mineiro João Paulo Faria enviou carta para o presidente da Indonésia afirmando que os brasileiros "apoiavam o fuzilamento de Marco Archer" e que o pedido de Dilma para salvá-lo não refletia o pensamento do povo brasileiro. Ilustrando a matéria uma foto do médico com o colunista da revista Veja, Rodrigo Constantino. Todos conhecem gente que aplaudiu a execução do brasileiro Marco Archer na Indonésia. Para os que adoram a tese fascista de que “bandido bom é bandido morto” a Indonésia seria um exemplo a ser seguido. Hoje, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, edição de 20/1, o engenheiro Rogério Paez, que ficou oito anos no mesmo presídio que Archer na Indonésia, diz: “Nada na Indonésia faz sentido. Quem vende a droga é a polícia. Na maior boate de Bali te oferecem ecstasy. Na cadeia, tem todas as drogas. E, se o preso tiver dinheiro, pode conseguir de tudo”. Na verdade, “bandido bom é bandido morto” é consigna com a qual muito bandido poderoso se disfarça.

Cunha, o probo

A Folha de S. Paulo, edição 20/1, dá destaque à “denúncia” do deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ) de que o governo estaria oferecendo cargos em troca de votos para derrotá-lo na disputa pela presidência da Câmara. A Folha e a mídia hegemônica acabam de descobrir uma nova vestal da política, baluarte das práticas mais republicanas e avançadas: Eduardo Cunha. Realmente, a mídia não tem limites quando se trata de derrotar o governo.

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