Minha avó é magra, fashion e perfeita

Dilma Rousseff, presidenta do Brasil, tem 67 anos de idade. Já foi casada, é mãe de uma filha adulta e tem um netinho em fase de crescimento. A não ser pelo fato de ser economista e possuir o cargo mais alto da nação, Dilma se assemelha com as avós de muita gente: é uma senhora idosa que não se encaixa no padrão de beleza. Mas não são todos que consideram esses aspectos.

Por Jarid Arraes, na Revista Fórum

Dilma Rousseff inicia, aos 67 anos, segundo mandato de presidenta
Nossa cultura é terrível com as pessoas mais velhas. Os idosos são tratados como fardos inúteis, como se não pudessem mais realizar grandes feitos ou fazer escolhas marcantes em suas vidas. Para além dessa mentalidade comum de que a velhice é uma fase onde nada se pode ou sabe fazer, também vivemos em uma sociedade que repudia o envelhecimento e faz de tudo para negá-lo. Se a pessoa em questão for uma mulher, o preconceito é consideravelmente pior.
 
Ao contrário dos homens idosos, as mulheres mais velhas não podem se dar o luxo de manter o cabelo grisalho; enquanto Lula e Fernando Henrique Cardoso podem sair por aí com seus belos fios brancos, Marina Silva e Dilma Rousseff não gozam da mesma facilidade: elas precisam recorrer às tinturas caso não queiram virar manchete. Curiosamente, o que as pessoas consideram “desleixo com a aparência” frequentemente se torna sinônimo de “desleixo com a vida profissional”.
 
Por isso, para uma mulher ser respeitada minimamente em sua atuação profissional, sua aparência física deve atender a critérios rígidos: não pode ser gorda, pois gente gorda é associada a descontrole e preguiça; não pode ser grisalha, porque o “descuido” com o cabelo é visto como falta de zelo; e também não pode ser “feia”, porque ser feia para uma mulher imputa que nenhum homem a desejará. A ligação irracional entre o desejo sexual masculino e a efetividade da capacidade profissional de uma mulher é simplesmente incompreensível, mas o machismo não faz mesmo sentido, só se baseia na misoginia para existir e sai atropelando tudo o que encontra pela frente.
 
Dilma, mulher pública, não é tratada da mesma forma que as figuras públicas masculinas são tratadas. Homens públicos como Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, não são alvos de análises milimétricas de seus dentes ou de que terno estão usando. Na verdade, os políticos do sexo masculino têm o privilégio de uma vida fashion muito tranquila, já que paletó não tem que mudar de cor, estampa, textura e combinação a cada aparição. Mas Deus nos ajude caso Dilma reutilize o mesmo conjuntinho monocromático em duas ocasiões diferentes!
 
Se Dilma fosse mais jovem, certamente passaria por cobranças pesadíssimas. Mas sua idade também não é o suficiente para que “peguem leve” com a presidenta. Muita gente esquece que Dilma não é candidata a Miss Chefe de Estado e que não está recebendo a faixa presidencial para ser objeto decorativo. Nenhuma profissional do sexo feminino é decoração ou musa somente por ser mulher. A insistência nessas avaliações físicas é uma falta de respeito imensurável, que atinge todas as mulheres, de todas as idades.
 
Ainda precisamos superar a ideia de que toda mulher deve se apresentar de forma desejável para os homens, assim como temos que discutir a falta de respeito contra as pessoas idosas, que devem ter o direito garantido de envelhecer sem recorrer ao mercado da beleza e suas incontáveis cirurgias plásticas e intervenções estéticas. Às mulheres, o direito de envelhecer e trabalhar, recebendo a valorização e as críticas justas de acordo com o trabalho que desenvolvem; aos que se escondem sob títulos de comentaristas, um pouco de coragem para que assumam a mediocridade da atuação profissional que possuem sem tentar disfarçá-la com machismo e objetificação feminina.