Vladimir Sájin: Os jogos em torno do Irã

Os EUA poderão agravar as sanções contra a Rússia por causa de seus negócios com o Irã, anunciou a porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, Jennifer Psaki. Como poderá isso se refletir no decorrer das negociações do Irã com o sexteto negocial, cuja próxima rodada deverá se realizar provavelmente a 10 de dezembro?

Por Vladimir Sájin*, na Voz da Rússia

Bandeiras da Rússia e do Irã

O ano de 2014 foi o ano do renascimento das relações russo-iranianas praticamente em todas as áreas. Os presidentes de ambos os países Vladimir Putin e Hassan Rohani já se encontraram quatro vezes para elaborar uma estratégia para o desenvolvimento das relações bilaterais.

Não houve um mês em que ministros, políticos, diplomatas, outras personalidades oficiais ou empresários russos e iranianos não tenham conduzido conversações produtivas em diversas plataformas. Seu trabalho resultou na conclusão de acordos em diversas áreas, seja na investigação espacial, na área de energia nuclear pacífica ou os grandes planos para cooperação econômica e comercial.

Há dias o ministro do Desenvolvimento Econômico da Rússia, Alexei Uliukaiev, anunciou que num futuro imediato será realizado o programa “petróleo iraniano por troca de produtos russos”. O contrato poderá valer cerca de 2-2,5 bilhões de dólares anuais. A Rússia irá pagar pelo petróleo iraniano e o Irã irá gastá-los comprando produtos russos.

Além disso, está prevista a construção no Irã de indústrias de montagem de equipamento técnico russo. O importante é que ambas as partes estão negociando planos para alterarem seus pagamentos mútuos do dólar para o rublo e para o rial iraniano.

Esse desenvolvimento intensivo das relações russo-iranianas não agrada a Washington. Os EUA podem alargar as sanções contra a Rússia devido aos seus negócios com o Irã, anunciou a porta-voz do Departamento de Estado norte-americano Jennifer Psaki. Mas aqui surgem logo muitas dúvidas.

Em primeiro lugar, a Rússia não aprovou as sanções contra o Irã relacionadas com o petróleo e, por isso, juridicamente é completamente livre de ter negócios petrolíferos com Teerã.

Em segundo lugar, durante o ano de 2014, e depois da assinatura do plano de ação conjunto em Genebra entre o Grupo dos 5+1 e o Irã em novembro do ano passado, as sanções foram bastante aliviadas, inclusive as sanções unilaterais contra Teerã abrangendo o comércio de petróleo. Em resultado disso, o Irã aumentou bruscamente sua extração e exportação, o que lhe permitiu obter boas receitas petrolíferas: de US$ 30 a US$ 50 bilhões, de acordo com diversas fontes. O negócio da Rússia com o Irã está totalmente de acordo com a tendência mundial das relações com o Irã.

Em terceiro lugar, a posição do Departamento de Estado em relação ao negócio entre a Rússia e o Irã não tem muita lógica. Há dias, outra porta-voz oficial do Departamento de Estado, Marie Harf, declarou que o seu departamento iria apresentar, em futuras consultas com o Congresso, “razões fortes” contra a introdução de novas sanções contra o Irã.

Susan Rice, conselheira de Segurança Nacional do presidente Barack Obama, explicou que sanções adicionais dos EUA contra o Irã poderão “romper as negociações” acerca do programa nuclear de Teerã. O que é absolutamente correto. Mas as supostas sanções anunciadas por Jen Psaki contra a Rússia devido ao seu negócio petrolífero com o Irã seriam igualmente sanções contra o Irã, que são combatidas pelo Departamento de Estado contra o Congresso. Onde está a lógica do Departamento de Estado? Ou os seus funcionários não conseguem acertar uma posição única?

É possível que os estadunidenses não gostem do negócio russo-iraniano por uma razão apenas, ou seja, por uma questão de concorrência. O mundo empresarial (inclusivamente o norte-americano) aguarda com impaciência o levantamento das sanções contra o Irã para se atirar, com todos seus recursos disponíveis, a esse “bocado suculento” e promissor do mercado econômico e financeiro mundial. A Rússia já fez este ano muita coisa para não se atrasar na chegada a um Irã pós-sanções. Mas a concorrência não gostou.

Quanto às “negociações nucleares” propriamente ditas entre o Grupo dos 5+1 e o Irã, claro que existe uma influência indireta de diversos fatores sobre seu ambiente. Como dizem os filósofos, “tudo afeta tudo”. Mas o problema nuclear iraniano é tão importante que todos os participantes das negociações tentam de forma unida, sem ceder a provocações, manter a linha escolhida. Em um ano muito foi feito – foi criada uma base para uma solução definitiva do problema. Isso foi mérito de todos.

A vontade natural e compreensível da Rússia se fixar no espaço empresarial do Irã não tem qualquer reflexo na sua posição durante as “negociações nucleares”. Aliás, tal como a crise na Ucrânia. Isso é igualmente confirmado pelos peritos norte-americanos.

Assim, o conselheiro do secretário de Estado dos EUA para a não-proliferação e controle de armas Bob Einhorn declarou que “a delegação russa desempenhou um papel construtivo nas negociações realizadas, tendo proposto uma série de soluções construtivas e importantes”.

Nas negociações, que irão possivelmente se prolongar até 10 de dezembro, terão de ser resolvidas apenas algumas questões, se bem que bastante complexas: o quadro das capacidades do Irã para o enriquecimento do urânio, o algoritmo e o mecanismo para o levantamento das sanções ao Irã e o prazo de funcionamento do acordo final abrangente com o Irã, que está sendo elaborado.

O clima que se está estabelecendo em torno do Irã, e das negociações em geral, é bastante positivo. Seu êxito é possível.

Fonte: Voz da Rússia