O grito de liberdade que veio do Nordeste brasileiro

Zumbi é a figura emblemática reverenciada no mês de novembro, mês da consciência negra no Brasil. Palmares era um quilombo pertencente ao estado de Pernambuco no século 17. Para lá iam milhares de negros, índios fugidos da escravidão dos engenhos e fazendas. O quilombo de Palmares, comunidade de quilombolas localizada na serra da barriga com uma área de 27 mil quilômetros quadrados, área equivalente a do atual estado de Alagoas.

Por Fátima Teles*, para o Vermelho

Zumbi dos Palmares

Chegou a habitar Palmares mais de 20 mil habitantes, correspondendo assim a 20% da população total de Pernambuco à época. Foi o mais importante quilombo das Américas e de maior resistência à escravidão e ao domínio português.

Palmares era um estado dentro de outro estado, a colônia escravista

Sua força de trabalho e de luta eram tão grandes que incomodou ao reinado a tal ponto, que entre algumas invasões, a de 1694 por Domingos Jorge Velho, culminou com a derrocada de Palmares Zumbi, líder dos quilombos conseguir fugir ,mas é encontrado um ano após viver escondido nas matas palmarinas, através de um delator que sob tortura, expôs o lugar onde estava Zumbi e em 20 de novembro de 1695 mataram-no, sendo levado para Porto Calvo, decapitado e exposto em Praça pública.

Palmares formara uma organização econômica, social e política própria, contribuindo assim cada vez mais para a emancipação e autonomia dos negros.

Não podemos esquecer a figura de Dandara, companheira de Zumbi, guerreira, astuta e exímia lutadora de capoeira. Ganga zumba, primeiro líder dos Palmares fez acordo de paz com os portugueses, em 1677, ela analisou que aquele acordo “representava um retrocesso nas conquistas Palmarinas. Ela acreditava que a troca de terras- segundo o acordo, os quilombos seriam realocados para o vale do cacaú, pois a serra da barriga havia sido prometida aos senhores de engenho- representaria a morte de Palmares e a volta à escravidão”.

Zumbi tornou-se líder depois da morte de Ganga zumba e foi a mais insurgente guerreiro da história da luta contra a escravidão.

No século 19, houve um abolicionista que veio ser considerado o mais importante abolicionista da história do Ceará, Francisco José do Nascimento, Chico da Matilde, filho de pescador e descendente de escravos, bloqueou o tráfico negreiro do Ceará, contribuindo para que o estado do Ceará decretasse a abolição da escravatura em 1884, quatro anos da abolição no Brasil. Por essa bravura ele passou a ser chamado de Dragão do mar.

Do período colonial até meados dos anos trinta do século 20, o tratamento dado aos negros no Brasil era desumano, sem reconhecê-los como sujeitos de direitos.

Com o fim da escravidão em 1888, século 19, os negros ficaram livres, mas presos em sua liberdade. Não tendo para onde ir, uma vez que seus “donos” os alforriaram, ficaram em dezenas pelas ruas do Rio de Janeiro buscando os casarões abandonados para serem suas moradas, enquanto outros iam pegar os latões que chegavam com mercadorias nos portos e utilizavam esses latões para construírem os seus barracos nos morros, dando inicio ao processo de favelização até hoje existente. Ainda havia os que perambulavam doentes e morriam a mercê de sua própria sorte, pois não tinham direito à saúde.

A educação tem uma dívida histórica impagável com a etnia negra. Quantas gerações de Josés e Marias, negros e negras, não tiveram o direito à educação? Essa dívida está ligada aos quase quatrocentos anos de escravidão e exploração brasileira.

È imperiosa a luta pela qualidade na educação que contemple essa etnia e todo o povo brasileiro. Porém, nós sabemos que o país ainda permanece com uma grande concentração de renda nas mãos de poucas pessoas, sendo considerado um país com forte desigualdade social. Por isso, é necessária a lei de cotas, as ações afirmativas, a história da cultura africana e afro-brasileira nas escolas, para que através da educação, o negro tão estigmatizado, possa recuperar sua autoestima e não reproduza socialmente o preconceito e a discriminação contra si e com os outros. Para que a sociedade reconheça o negro, como sujeito de direito que é e o respeito dentro da sociedade como cidadão construtor da democracia no país. As cotas são ressarcimentos históricos diante da ausência de direitos.

Ainda somos um país racista, infelizmente.

Muitas foram as conquistas constitucionais, mas ainda há a discriminação com a etnia negra. Ainda quando numa conversa é mencionado o nome de uma pessoa negra, diz-se: ela é negra, mas é uma pessoa maravilhosa. Segundo Paulo Freire, essa é a maior prova de que ainda não houve superação do racismo, já que não pronuncia o nome da pessoa, esquecendo sua cidadania.

A educação é o meio para que a sociedade mude. Através do conhecimento, as pessoas irão alcançar o reconhecimento da luta e a exploração a que essa etnia foi submetida e acima de tudo se reconhecer como negro tendo orgulho da sua origem, contribuindo com a sua auto estima.

Aquele acontecimento do final de janeiro de 2014 no Rio de Janeiro, onde um jovem negro de classe menos favorecida foi amarrado a um poste depois de um assalto é a prova não só do racismo, mas da lembrança viva da escravidão e uma reprodução da mesma, instaurando a barbárie na sociedade brasileira já ébria pelos desmandos do capital.

A questão do racismo e da discriminação é uma questão cultural e traz resquícios da escravidão e da suposta liberdade à margem da sociedade, das ruas. A imagem que ficou é a de que negro e pobre estão ligados pelas veias da marginalidade, negro pobre está ligado pelas veias da vida bandida, da criminalidade.

Dessa forma tanto a sociedade, e ai incluindo a Justiça, ainda atua de forma injusta, tendo no negro, um criminoso, ainda que esse não seja e nem pareça. A banda o Rappa diz isso "todo camburão tem um pouco de navio negreiro", ou seja, a polícia está sempre pronta para prender os negros como forma de lembrar e manter a memória do pelourinho, da escravidão.

Palmares vive na luta contra o racismo e as novas formas de escravidão impostas pelo capital, ainda nos dias atuais.

Zumbi, presente!
Dandara, presente!
Dragão do mar, presente!

Referências

http://www.canoabrasil.com/dragao-do-mar.html
http://www.geledes.org.br/importancia-da-lei-10-639-para-erradicacao-racismo/#axzz3JQYcMvAi
http://www.andreazevedodafonseca.com/
http://www.historiabrasileira.com/biografias/zumbi-dos-palmares/
wwwcarosamigos.com.br/revoltaspopulares
Coleção caros amigos. Revoltas populares no Brasil. Fascículo 4-Palmares

*Fátima Teles é assistente social.