Com novas iniciativas, avançam diálogos de paz para Colômbia

Os diálogos de paz para a Colômbia adquiriram uma nova dinâmica na semana anterior com a incorporação das vítimas e a criação de dois grupos de trabalho para aprofundar na análise da origem conflito e as vias para sua solução.

Por Ernesto Lado Mellado*

Diálogos de paz Farc - Telesur

Iniciadas em novembro de 2012 em Havana, essas práticas contaram com a participação direta na mesa de conversações de afetados pela confrontação armada na Colômbia e a criação da Comissão histórica do conflito e suas vítimas, assunto crucial para o avanço de acordos.

Durante mais de cinco décadas, diferentes governos e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia-Exército do Povo (Farc-EP) têm tratado em diversas ocasiões de chegar a um acordo para pôr fim ao conflito que, segundo dados do Centro de cor Histórica da Colômbia, tem deixado 6,5 milhões de vítimas, entre elas 220 mil mortos e quase seis milhões de deslocados.

Nesse palco têm participado também outras guerrilhas e grupos armados associados ao narcotráfico, ao paramilitarismo e ao crime organizado em geral.

Outra importante iniciativa da mesa foi a instalação de uma subcomissão que adiantará as análises sobre o tema do fim da guerra e examinará os subpontos do cessar fogo bilateral e definitivo e o abandono das armas.

Ela é formada por membros do Exército e a Polícia Nacional, e civis do Escritório do Alto Comisionado de Paz e o Ministério da Defesa, bem como representantes das Farc-EP.

Ela funcionará de forma paralela, mas subordinada aos plenipotenciarios de ambas partes, para apoiar à mesa com a preparação de insumos e procedimentos sobre a base do estudo de experiências nacionais e internacionais.

É de um valor imenssurável que pela primeira vez representantes ativos das forças armadas das partes se sentem em igualdade de condições, a iniciar as discussões e intercâmbios sobre assuntos do processo, afirmaram as Farc-EP em um comunicado.

Também a delegação do governo de Juan Manuel Santos qualificou como necessária a presença de militares e polícias ativos nos diálogos, ao considerar que o "processo de paz se encontra em momentos decisivo, com possibilidades sérias de sucesso".

A Comissão histórica do conflito e suas vítimas, por sua vez, é formada por 12 especialistas e 2 relatores, todos de reconhecido prestígio no estudo do tema colombiano desde seus âmbitos do conhecimento.

Esse grupo aprofundará a origem e as causas do conflito, bem como fatores e condições para sua longa existência e os impactos mais notórios sobre a população, e sintetizará os assuntos mais importantes, de maneira autônoma e plural.

Os estudiosos, selecionados de maneira censensual pelas duas delegações de paz, prevêem entregar seu relatório à mesa em quatro meses.

As vítimas como protagonistas da paz

Chegamos com temores, mas o respeito e afeto recebidos deram-nos confiança, afirmou Nelly González, uma dos 12 integrantes do primeiro grupo de afetados que viajou a Havana e expôs suas vivências e propostas na mesa.

Para Nelly, a iniciativa dos representantes de ambas delegações de paz de receber às vítimas é o caminho mais correto, pois elas são "a coluna vertebral" desse processo.

Por sua vez, Ángela María Giraldo, qualificada como vítima das Farc-EP, instou aos colombianos a defender este esforço e ao entender como a única maneira de desenvolver o país e implementar políticas sociais que permitam superar a pobreza e a exclusão.

Para Constanza Turday o momento mais trascendental de sua vida ocorreu quando o comandante guerrilheiro Iván Márquez lhe pediu perdão. "Não foi um perdão mecânico, mas sim de coração", disse, e assegurou que isto lhe devolveu a confiança na possibilidade de encontrar caminhos para a reconciliação.

Alfonso Mora, cujo filho foi assassinado pela polícia, se pronunciou na contramão da implementação de medidas como o foro militar, que remete a tribunais militares os membros das forças de segurança implicados em delitos de lesa humanidade

Vários pediram um cessar fogo bilateral, que brinde garantias de continuidade às negociações, e o reconhecimento dos direitos dos afetados pela violência política da que têm sido vítimas organizações e pessoas progressistas em seu país.

Todos coincidiram em que não abrigam sentimentos de vingança nem ódio, mas o desejo de encontrar caminhos para a reconciliação, contribuir, com justiça, à construção da paz e garantir a não repetição de fatos como os que têm sofrido.

O encontro inédito na história destes processos foi qualificado como transcendental pelas delegações de paz encabeçadas por Humberto de la Rua (governo) e Iván Márquez (Farc-EP).

Para eles, essas recomendações serão fundamentais, junto com os milhares de depoimentos e propostas recolhidos nos foros desenvolvidos na Colômbia, para pôr fim ao conflito, construir uma paz estável e duradoura e conseguir a reconciliação.

Representantes da ONU nesse país, a Universidade Nacional e a Conferência Episcopal, realçaram a coragem, a sinceridade e o sentido propositivo dessas iniciativas, bem como o respeito e a humildade com que as partes em diálogo escutaram os depoimentos das vítimas e suas sugestões.

Essas três instituições foram as encarregadas de eleger, entre um universo de milhares de pessoas, a delegação de 60 representantes que viajará em vários grupos à Havana para expor seus pontos de vista na mesa.

Com estas novas ferramentas, os representantes de paz retomarão em setembro próximo as discussões sobre o sensível tema das vítimas e seus direitos e adiantarão as análises das vias para pôr fim ao conflito.

Em 21 meses destas práticas, foram obtidos acordos parciais nos pontos de reforma rural (maio de 2013), participação política das Farc-EP (novembro de 2013) e drogas ilícitas (maio de 2014).

*Jornalista da Redação Nacional da agência Prensa Latina