Argentina recorrerá a Haia e ONU por conflito com fundos abutres

A Argentina recorrerá aos organismos como o Tribunal de Haia e a ONU para resolver o conflito de especulação financeira que foi criado pelos fundos abutres, que violam suas leis e as normas internacionais.

Jorge Capitanich

Foi dessa forma que o chefe de gabinete do governo argentino, Jorge Capitanich, se pronunciou na manhã desta quinta-feira (31), responsabilizando também o poder judiciário dos Estados Unidos, por má praxis.

"Dizer que estamos em default (não pagamento de dívida) é uma patranha absurda", sentenciou o chefe de ministros, em seu escritório na Casa Rosada.

Capitanich informou que o governo "abre uma apelação diante do Tribunal de Haia sobre o processo de reestruturação da dívida, e vai abrir um debate na Organização das Nações Unidas (ONU) "a fim de regular a obrigatoriedade do acordo de maiorias sobre as minorias".

O funcionário criticou e responsabilizou àqueles da "comunidade internacional" que "avaliam a ação de grupos minúsculos que pretendem fulminar um processo de reestruturação da dívida soberana".

Depois de uma intensa negociação, o ministro argentino da Economia, Axel Kicillof, informou na noite de quarta (29) que os fundos abutres, o mediador Daniel Pollack e o juiz Thomas Griesa rechaçaram todas as ofertas de seu governo para encontrar uma saída viável.

O ministro viajou na terça-feira (29) a Nova York para presidir a equipe econômica que negociou com os fundos abutre e o mediador do juiz Thomas Griesa.

Kicillof explicou que seu governo colocou sobre a mesa várias ofertas razoáveis, mas "eles não atuaram com boa fé", criticou.

Esses credores representam só 7% de todos os detentores de bônus da dívida argentina e somente 1% desses fundos abutres, especificamente NML Capital e Aurelius, apresentaram o litígio legal na corte de Griesa.

Com os outros 93%, Buenos Aires vem honrando seus compromissos desde a primeira reestruturação da dívida em 2005 e a posterior em 2010.

Em virtude desses acordos de reestruturação nos quais os credores aceitaram cobrar 70% do total, o governo argentino não pode pagar outros detentores de bônus cifras superiores ao acordado nesses contratos.

Situação insólita

Kicillof propôs aos fundos abutre negociar uma reestruturação e ainda assim os benefícios para eles seriam de 300% acima do valor que pagaram pelos bônus, mas não aceitaram depois da confiança que lhes passou a decisão de Griesa.

Essa sentença congelou depósitos colocados pela Argentina em dois bancos estadunidenses para pagar seus credores.

"É uma situação insólita, incompreensível e absolutamente inusitada", disse e agregou que "o dinheiro depositado pela Argentina já é dos credores que estão exigindo agora que o juiz lhes permita cobrar".

"Exigimos que Griesa resolva e permita que cobrem porque o dinheiro é deles", mas o juiz não cedeu, argumentando que os fundos abutres que determinarão [o que acontece]. "Então onde está a insensatez, a intransigência?", questionou o ministro.

Kicillof fez questão de negar que a Argentina entraria em moratória pois é solvente monetariamente e tem liquidez de pagamento, como o demonstrou os US$ 650 milhões de dólares que destinou ao primeiro pagamento que fez há três dias ao Clube de Paris.

Kicillof insistiu que a Argentina não vai assinar nenhum compromisso que seja injusto nem comprometa o futuro do país, do povo argentino e nem seu bem-estar.

Por causa dessa sentença, agências de avaliação de risco financeiro declararam a Argentina em "default", que na prática significa a insolvência. "O país pagou mas o dinheiro foi retido, por isso não existe essa moratória, como querem acreditar que exista", destacou Capitanich.

Em relação à negociação de bancos privados argentinos com os fundos abutres pela compra dos bônus da dívida, o representante do governo disse que qualquer acordo entre privados é uma questão fora da esfera oficial, "mas devem respeitar os princípios essenciais do Estados", assinalou.

Ao mesmo tempo, a entidade "Convocatoria Económica y Social por Argentina", que agrega espaços políticos, sociais e intelectuais distintos, reuniu-se na quarta-feira para manifestar apoio ao governo.

"Nenhuma dívida é mais importante que a dívida com o povo", disseram. "Pátria sim, colônia não! Pátria sim, colônia não!, gritaram os milhares de pessoas reunidos em frente ao Cabildo, um edifício histórico localizado na Praça de Maio da capital argentina. Durante a época colonial, o edifício foi sede do Cabildo encarregado de representar a cidade frente à metrópole, com várias funções jurídicas e administrativas, além de servir de prisão.

Apoio do Brasil

Para o ministro da Economia do Brasil, Guido Mantega, a situação da Argentina se configura como um “impasse”, pois o mercado “já se adaptou” à crise.

“Acho que o mercado meio que se ajustou a um possível impasse. Não chamaria de default, chamaria de impasse. O mercado já se adaptou. Já precificou. Portanto, não terá no curto prazo nenhuma consequência maior”, disse.

Os fundos têm sido chamados de abutres, porque compraram papéis da dívida argentina a preços baixos depois da moratória de 2001 e entraram na Justiça para cobrar o valor integral, sem o desconto, como aceitaram os outros credores. A Justiça, então, concedeu aos fundos abutres o direito de receber a totalidade da divida (US$ 1,3 bilhão), sem desconto, e com os juros acumulados durante o longo processo.

Mas, para Mantega, a Argentina não pode ser considerada em default porque tem pago as dívidas, inclusive com o Clube de Paris (formado por 19 países), o que ocorreu recentemente. Isso mostra, segundo ele, que a Argentina não está dando um calote. “É uma situação sui generis. [É] uma situação excepcional, porque quem está impedindo ela de fazer os pagamentos é um juiz americano. Acho que ainda há uma margem de negociação.”

Com informações da Prensa Latina