EUA escondem provas que incriminam Kiev por abater avião

A espionagem dos Estados Unidos tem provas de que o avião da Malaysian Airlines foi derrubado na Ucrânia por tropas ao serviço do regime de Kiev e procura agora encontrar uma maneira de apresentar o fato, de modo a não implicar diretamente a junta resultante do golpe de Estado patrocinado pelos EUA e pela União Europeia.

Por José Goulão e Martha Ladesic, de Nova York, Mário Ramírez, de Washington, e Castro Gomez, de Donetsk, para Jornalistas sem Fronteiras

Avião abatido na Ucrânia - Jornalistas sem Fronteiras

Segundo fontes da Agência Central de Inteligência (CIA), a versão agora mais provável é a de que o autor do disparo foi um “desertor” do exército ucraniano. A versão oficial de Washington, difundida através da porta-voz adjunta do Departamento de Estado, Marie Harf, é a de que o avião foi derrubado por “rebeldes” do leste da Ucrânia com meios fornecidos pela Rússia. Como provas, a funcionária de John Kerry invoca vídeos circulando no Youtube e informações disponíveis nas redes socials. Marie Harf argumenta igualmente que “o senso comum” induz a responsabilizar os chamados “pró-russos”.

“Como é que o país que espiona todo o mundo, a começar pelos seus cidadãos e que tem satélites fiscalizando, a cada momento, cada metro de terra e mar, não tem registro de quem disparou um míssil com quase cinco metros de comprimento contra o vôo MH17?” – interroga John Isaacsson, jurista e ativista dos direitos humanos em Nova York.

“Ninguém consegue acreditar nisso; o que mais provavelmente está acontecendo é que as imagens registradas pelos satélites são inconvenientes para as teses que servem de base à propaganda dos Estados Unidos e dos seus aliados”, acrescentou Isaacsson.

A opinião do advogado nova-iorquino parece ter fundamento. Uma fonte do Departamento de Estado admitiu, a título meramente pessoal, que as informações em poder do jornalista Robert Parry, premiado repórter que desvendou o escândalo Irã-Contras, nos anos 1980, “faz bastante sentido”.

Parry divulgou dados obtidos por uma fonte – que “provou sempre ser bastante pormenorizada nas informações que transmite” – segundo os quais “as agências norte-americanas de espionagem têm imagens detalhadas de satélites mostrando que a bateria de mísseis que provavelmente disparou o engenho fatal parece estar sob o controle de tropas do governo ucraniano, envergando uniformes que parecem ser os dos soldados ucranianos”.

As explicações que estão sendo debatidas pelos analistas da CIA, segundo Robert Parry citando a mesma fonte, são as de que os soldados poderão ser “rebeldes” envergando fardas semelhantes ou então eram mesmo “soldados ucranianos indisciplinados e embriagados, uma vez que as imagens mostram garrafas espalhadas pelo local”.

John Isaacsson comentou que este tipo de explicações “poderiam, por absurdo, ser plausíveis se não estivéssemos no país, os Estados Unidos da América, que inventou armas químicas em poder de um governo para iniciar uma guerra e mudar um regime e que, já com este secretário de Estado, atribuiu um massacre com armas químicas a um governo, o da Síria, quando o crime foi cometido por aqueles que ele próprio apoia, por sinal terroristas islâmicos”.

O que a Casa Branca e o Departamento de Estado estão fazendo”, acrescentou Isaacsson, “é tentar que os dados a apresentar à opinião pública confirmem a tese de culpar a Rússia e os pró-russos pelo crime, mesmo sabendo que foram os seus aliados fascistas de Kiev que o cometeram”.

As congeminações da CIA, de acordo com as investigações de Robert Parry, incluem ainda a possibilidade de atribuir o derrube do avião a “rebeldes” que “se tivessem enganado, por inexperiência, na leitura dos dados dos radares, julgando disparar contra um caça ucraniano”. A mais recente versão das agências de espionagem é a de que o disparo pode ter sido feito por um “desertor” do exército ucraniano, razão pela qual envergaria a farda das tropas ao serviço de Kiev.

“Não acredito que uma imagem de satélite possa ter tantas leituras”, diz um assessor de um congressista em Washington. “O conhecimento destas peripécias em torno das explicações de fatos concretos é um descrédito para quem quer ser levado a sério. A única coisa que há a fazer é não dizer mais nada ou assumir a interpretação mais lógica de todas – foram tropas ucranianas que derrubaram o avião – e entregar os materiais às instâncias internacionais de inquérito, uma vez que os Estados Unidos defendem oficialmente que ele se realize. Nesse aspecto os russos estão sendo bastante mais sérios”, acrescentou o assessor.

O Ministério da Defesa russo apresentou em conferência de imprensa imagens e dados obtidos pelos satélites e radares de Moscou durante os últimos momentos de voo do avião. Essas informações confirmam a existência de pelo menos um caça na vizinhança do aparelho nos últimos minutos antes do desaparecimento dos radares e revelam a movimentação de bases de mísseis na região da tragédia.

Sem tirar conclusões sobre quem fez o disparo, o porta-voz do ministério russo, Igor Makuchev, sublinhou que a segunda aeronave no local pode ser um avião militar ucraniano – confirmando a informação divulgada poucos minutos depois do derrube na conta Twitter do controlador aéreo espanhol da torre de controle de Kiev – e que as movimentações de mísseis ocorreram em zonas sob controle do exército governamental ucraniano.

Makushev informou ainda que o aparelho foi desviado cerca de 14 quilômetros da rota em que seguia – provavelmente em consequência da presença da escolta militar – e que tentava regressar ao caminho original quando se deu o acidente.

O Ministério russo da Defesa informou que os dados e imagens serão entregues às entidades responsáveis pelo inquérito oficial. Entretanto, as milícias antifascistas de Lugansk e Donetsk enviaram as caixas negras que descobriram para a Malásia, país de bandeira do aparelho derrubado. As caixas negras que foram confiscadas pela polícia política fascista ucraniana continuam em seu poder.

Do lado norte-americano, a única posição oficial continua a ser a explicitada pelo Departamento de Estado, segundo a qual o aparelho foi derrubado pelos “rebeldes”, sob responsabilidade e com material russo. As provas que servem de base às autoridades do país onde se localizam as mais poderosas agências de espionagem mundiais são as que circulam no Youtube e nas redes sociais, além das deduções decorrentes “do senso comum”.

As duas principais provas invocadas são uma gravação de uma conversa entre milicianos antifascistas sobre o derrube de um avião e fotos de baterias de mísseis Buk regressando à Rússia depois do disparo fatal para o MH17. Peritos que as analisaram, citados inclusive pela comunicação social norte-americana, asseguram que se trata de falsificações. A gravação é uma colagem de comunicações feitas em momentos diferentes sobre assuntos diversificados.

Quanto às fotos das baterias de mísseis, várias fontes residentes e conhecedoras da região identificaram-nas como sendo captadas junto à localidade de Krasnoarmeisk, que está desde maio sob o controle das tropas governamentais. As testemunhas baseiam-se na existência de cartazes nas fotos identificando um stand de automóveis de Krasnoarmeisk, vendo-se em fundo um estabelecimento de materiais de construção na Rua Gorki, em Krasnoarmeisk. Esta localidade situa-se a 120 quilômetros da fronteira russa e a 80 quilômetros do local onde o avião foi abatido.

Fonte: Jornalistas sem Fronteiras