Diálogo é reavaliado, mas Israel busca estatuto discriminatório

Representantes dos EUA indicaram à mídia internacional que planejam enviar diplomatas a Israel e à Palestina para tentarem retomar as negociações, cujo prazo anterior terminou em 29 de abril. A Autoridade Nacional Palestina (ANP) já havia afirmado disposição para estender os diálogos se fossem discutidos os pontos centrais da questão. Por outro lado, o governo sionista discute tornar lei o estatuto de Israel como “lar nacional do povo judeu”.

Por Moara Crivelente, da Redação do Vermelho

Israel e Palestina em Jerusalém - Reuters

O Departamento de Estado dos EUA anunciou nesta segunda-feira (5) que pretende enviar diplomatas para tentar reativar o chamado “processo de paz”, cuja última rodada durou nove meses, entre julho de 2013 e 29 de abril, sem qualquer resultado e com o aumento significativo da ocupação israelense sobre os territórios palestinos.

Já nesta terça-feira (6), a Casa Branca informou que é a conselheira de Segurança Nacional dos EUA, Susan Rice, quem visitará a região, “liderando uma delegação estadunidense nas reuniões do Grupo Consultivo EUA-Israel” nesta quarta (7) e quinta-feira (8).

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De acordo com a agência palestina de notícias Wafa, o primeiro-ministro palestino Rami Hamdallah disse, nesta terça, que a retomada das negociações está condicionada pela libertação do último grupo de prisioneiros palestinos, que Israel manteve detido apesar do compromisso assumido para a retomada do processo, ainda em julho passado. Para Hamdallah, a libertação dos prisioneiros, que estão detidos desde antes dos Acordos de Oslo, do início da década de 1990, “não pode ser sujeita ao humor de Israel.”

Além disso, a ANP já havia estabelecido condições fundamentais para a volta à mesa de negociações, uma vez que mais um período de diálogos terminou sem qualquer avanço diplomático ou, ao contrário, com o aumento significativo da ocupação – com a construção recorde de novas colônias israelenses em territórios palestinos, por exemplo – acompanhado pela negligência dos Estados Unidos, que se apresentam como mediadores.

Entre as bases para a retomada das conversações está a necessidade de compromisso com a definição das fronteiras, que o governo israelense tem recusado discutir, uma vez que seu avanço colonizador já ultrapassou a linha internacionalmente reconhecida, após a Guerra dos Seis Dias, em 1967.

Extrema-direita e a discriminação politizada

Também citada pela Wafa, Hanan Ashrawi, membro do Comitê Executivo da Organização para a Libertação Palestina (OLP), disse nesta segunda que o governo israelense e a coalização de extrema-direita liderada pelo premiê Benjamin Netanyahu revelam “a verdadeira face do regime de segregação” de Israel, com base na discriminação, exclusão e rejeição do outro, além das graves violações do direito internacional.

Ashrawi deu declarações ao reagir à discussão avançada pelo governo israelense, impulsionada por Netanyahu, sobre a incorporação do estatuto de Israel como “lar nacional do povo judeu” na lei básica. A saga de Netanyahu pelo reconhecimento de Israel como “Estado judeu” é criticada amplamente, inclusive por aliados europeus e acadêmicos israelenses que rechaçam a manipulação identitária com propósitos políticos que radicalizam a questão.

Segundo o jornal israelense Ha'aretz, durante uma reunião de seu gabinete governamental, no domingo, Netanyahu disse pretender “ancorar” na lei o estatuto para que Israel continue sendo um “Estado judeu” mesmo que assine um acordo de paz com os palestinos. “Há quem não queira que Israel seja definido como lar nacional do povo judeu. Eles querem uma pátria nacional palestina a ser estabelecida ao nosso lado, e que Israel seja gradualmente tornado um Estado binacional judeu-árabe, dentro das nossas fronteiras reduzidas.”

Netanyahu disse que “Israel dá direitos iguais completos para todos os seus cidadãos," mas que "é o lar nacional de apenas um povo, o povo judeu.” Durante todo o período das últimas negociações, o premiê alegou que a recusa dos palestinos em reconhecer Israel como “Estado judeu” está "na raiz do conflito". A extrema-direita israelense busca apresentar a questão, de forma manipuladora, como a disputa religiosa por uma terra sagrada, o que é considerado fator eficaz de mobilização em apoio da sua posição.

Governo busca avançar na institucionalização do racismo

São inúmeros os críticos a esta instrumentalização da narrativa étnica-religiosa, denunciada por intelectuais como os historiadores Ilan Papé, Shlomo Sand e Zeev Sternhell, que disse, em entrevista o jornal italiano l'Unità, no domingo (4), que pedir aos palestinos o reconhecimento de Israel como “Estado judeu” é pedir que reconheçam a sua derrota cultural e histórica.

Para Sternhell, assim como para os outros críticos da empreitada de Netanyahu e sua coalizão extremista, a proposta baseia-se na discriminação étnica institucionalizada, que apenas tornaria regulamentado o regime de segregação já evidente, que discrimina os não judeus. Além disso, a tática forma parte de uma estratégia política que forneceu as bases para a colonização imperialista da Palestina antes e que mantém “justificada” a ocupação israelense sobre os territórios palestinos atualmente.

Ashrawi também afirma que a proposta de regulamentação da definição do país como “lar nacional do povo judeu” reflete “o comportamento racista de Israel e a discriminação contra o povo palestino, contido em um conjunto de leis racistas aprovadas pelo Parlamento israelense (Knesset), o único corpo legislativo que decreta leis e regulações que violam o direito humanitário e os princípios internacionais que ilegalizam o racismo.”

“As tentativas de institucionalizar os conceitos de ocupação, colonização e apartheid, de obliterar a presença do povo palestino e abolir o seu direito de retornar à sua pátria não são mais do que fúteis e sem sentido, fadadas a fracassar em nível local e internacional,” concluiu Ashrawi.