Após Israel suspender diálogos, palestinos anunciam alternativas

A Organização para a Libertação da Palestina (OLP) anunciou a candidatura a mais 63 convenções internacionais, nesta segunda-feira (28). A decisão foi tomada no domingo (27), após o anúncio feito por Israel sobre a suspensão das negociações. O enviado especial dos EUA, Martin Indyk, deixou a região, e o chanceler estadunidense, John Kerry, que se apresenta como mediador, alertou o aliado de que Israel “pode se tornar um Estado de apartheid”.

Por Moara Crivelente, da Redação do Vermelho

Palestina - Reuters

O Conselho Central da OLP reuniu-se no domingo à noite para finalizar uma sessão de dois dias sobre o próximo passo, enquanto se aproxima o prazo final para as negociações com Israel, esta terça-feira (29). A decisão sobre recorrer à Organização das Nações Unidas (ONU) vem sendo contemplada devido à falta de avanço diplomático e à expansão da ocupação israelense sobre os territórios palestinos, inclusive durante o período de nove meses acordado para as negociações, em julho de 203. Já no início do mês, a ONU e os países depositários de instrumentos fundamentais para o direito internacional iniciaram a adesão da Palestina a várias convenções.

Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP) – órgão de autogoverno criado no início da década de 1990, em acordo com Israel, para partilhar a gestão dos territórios palestinos ocupados – disse que a alternativa vem em “momento apropriado”, de acordo com o chefe da delegação palestina para as negociações, Saeb Erekat, em declarações à rádio Voz da Palestina.

O Conselho Central da OLP também decidiu pedir ao Conselho de Segurança das Nações Unidas que condene a construção de colônias israelenses em territórios palestinos e as ações de violência contra os palestinos em Jerusalém – inclusive com o dano a igrejas e mesquitas, em especial a importante Al-Aqsa. Além disso, pedirá aos Estados membros da ONU que boicotem as companhias e instituições que cooperam com a ocupação, ou seja, que operem nas colônias ou comercializem com elas.

“Queremos que a ocupação tenha um grande custo a Israel em termos políticos e internacionais,” disse uma autoridade palestina citada pelo jornal israelense Ha’aretz. De acordo com a fonte, os palestinos estão embarcando em uma nova posição. “Nos últimos anos, a estratégia de Israel foi arrancar da AP toda a autoridade, exceto a de pagar salários para a continuidade da coordenação securitária [com Israel] e para que a divisão entre a Cisjordânia e a Faixa de Gaza pudesse ser mantida. Agora, começamos a reconciliação [entre o Fatah e o Hamas] e a unificação da autoridade, e nosso próximo passo será recorrer à ONU.”

Ocupação e disputas em Israel

Outra resolução do órgão aborda uma das questões centrais na polêmica com o governo israelense do premiê Benjamin Netanyahu, que criou uma nova barreira para as negociações: a exigência que os palestinos reconheçam Israel como “Estado judeu”. O Conselho Central votou pelo rechaço completo à demanda.

Personagens como o ministro da Economia Naftali Bennett, do partido racista e colonialista Lar Judeu, que forma parte da conturbada coalizão de governo de Netanyahu, voltou a decretar o fim de uma era de negociações. Para o ministro do partido ortodoxo, Israel deve anexar a Área C, ou seja, quase 60% da Cisjordânia, que ficou sob o controle militar e administrativo israelense, e dar "autonomia" para os territórios A e B, administrados pelos palestinos ou de gestão partilhada com Israel (encarregado da parte militar), segundo os acordos do início da década de 1990.

Apesar disso, o Conselho também decidiu manter a porta aberta para a retomada das negociações com Israel, com base nas resoluções internacionais e com a condição de que o governo israelense suspenda a construção de colônias na Cisjordânia palestina. Os palestinos exigem o cumprimento dos compromissos assumidos ainda na década de 1990 por Israel – como a retirada das suas tropas e a demarcação das fronteiras, além da libertação dos prisioneiros detidos antes daquele período, listados ainda em julho, quando a atual rodada de negociações foi anunciada.

Entretanto, partidos como a Frente Popular de Libertação da Palestina (FPLP) e outras expressões populares e políticas são contrários à continuação das conversações com Israel, devido à demonstração reiterada e patente sobre o descompromisso com a diplomacia, a transferência deliberada da culpa pela falta de avanço aos palestinos e à expansão da ocupação israelense.

Suspensão das negociações e condenação a Israel

O governo israelense decidiu suspender as negociações após a OLP e o Hamas – que estavam em disputa e afastados há sete anos – terem assinado um acordo de reconciliação, na semana passada. O acordo inclui a realização de eleições e a reintegração do partido islâmico que governa a Faixa de Gaza à organização, composta por mais de 10 partidos, reconhecida como o “único representante legítimo do povo palestino” desde o início da década de 1990.

O Hamas é classificado por Israel como “organização terrorista”, o que é usado para a “justificação” das suas frequentes incursões e operações militares contra a Faixa de Gaza, com bombardeios aéreos e invasões terrestres, assim como do bloqueio completo que impôs sobre o território litorâneo, deixando quase dois milhões de palestinos isolados e vulneráveis à violência, com movimento restringido e acesso limitado a bens básicos.

De acordo com o Ha’aretz, o secretário de Estado dos EUA John Kerry deve retomar o assunto para buscar mediar a volta às negociações apenas na próxima semana. O enviado especial Martin Indyk tem estado em Israel e na Cisjordânia nos últimos meses, quando a possibilidade de extensão do prazo para as conversações vinha sendo discutida. A AP mostrou-se disposta a prorrogar o processo até o fim do ano, embora o governo israelense não demonstre a mesma disposição, sobretudo pela atuação destrutiva da extrema-direita e de partidos ortodoxos extremistas.

Após a reconciliação entre OLP e Hamas, os EUA emitiram uma “advertência” sobre o novo governo a ser formado, que só será reconhecido caso “rejeite a violência, reconheça o direito de Israel à existência e cumpra os compromissos assumidos”, exigências que não têm sido feitas ao aliado israelense, o que garante a extensão da ocupação sobre a Palestina e a sua perpetuação. Além disso, a reintegração do Hamas à OLP é um passo fundamental na sua inclusão ao processo diplomático e de fortalecimento dos palestinos, que trabalham por um governo de unidade nacional.

Segundo Kerry e a chefe da diplomacia da União Europeia, Catherine Ashton, entretanto, caso os palestinos “cumpram essas demandas”, Israel não terá motivos para evitar a volta às negociações. Kerry chegou a dizer, em uma reunião com representantes europeus, russos e japoneses, na sexta (25), que se a solução de dois Estados não for acordada, Israel arrisca tornar-se um “Estado de apartheid”, denúncia feita há anos pelos palestinos e pelos movimentos de apoio à sua luta por libertação em todo o mundo.

O governo israelense rechaça de forma efusiva a denúncia – que tem  sérias consequências frente ao direito penal internacional, se julgada – e os aliados estadunidenses têm sido sistematicamente negligentes frente a este conjunto de graves violações dos direitos humanos perpetradas por um regime militar e de segregação imposto aos palestinos por Israel.