Além da saída ao mar, Bolívia quer águas desviadas do rio Lauca 

Desde 1962, a Bolívia deixou de receber 1 bilhão de metros cúbicos de água potável por conta de um desvio do rio Lauca, segundo dados divulgados nesta segunda-feira (28) pela chancelaria boliviana. A reclamação boliviana, contudo, remonta aos anos 1930, quando o governo do Chile começou a estudar o uso dos recursos hídricos do rio binacional para a irrigação agrícola.

Por Théa Rodrigues, da Redação do Vermelho

Além da saída ao mar, Bolívia quer águas desviadas do rio Lauca - Reprodução

O Lauca se origina no altiplano chileno e cruza a Cordilheira dos Andes até desembocar no lago Coipasa, na Bolívia. Em 1939, por iniciativa do então presidente do Chile, Pedro Aguirre Cerda, iniciou-se um estudo para permitir a utilização dos recursos hídricos do rio para irrigar cerca de 2 mil hectares do Vale de Azapa.

Nesta época, o governo boliviano pediu reiteradas vezes que o país vizinho firmasse um acordo de utilização e de direitos das águas, por uma preocupação em relação ao regime hidrológico do rio. No entanto, a justificativa dos representantes do governo chileno para a recusa é que as obras não modificariam o curso do Lauca, pois se tratava apenas de um “aproveitamento natural de suas águas”.

Há uma limitação de soberania para o uso de águas internacionais em razão do direito de propriedade compartilhada que o Estado vizinho tem sobre a parcela de água que entra no seu território. Devido a esta limitação da soberania, um país não pode fazer alterações de maneira unilateral, principalmente se isso prejudicar o curso das águas que chegam ao Estado seguinte.

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Após vários anos de debates e sem que houvesse uma solução diplomática para a questão, em 1962, o presidente chileno Jorge Alessandri Rodríguez autorizou a abertura das comportas da Central Hidroelétrica de Chapiquiña, construída utilizando os recursos do Lauca e sem levar em conta as demandas bolivianas.

Em 2010, uma comissão técnica efetuou uma medição nas nascentes do rio Lauca e nas obras civis que foram feitas há 52 anos no território chileno. A conclusão dos especialistas bolivianos foi que, desde 1962, cerca de 600 litros por segundo deixaram de passar pela fronteira entre os dois países.

“Se multiplicarmos o tempo (que ocorrer o desvio) por 600 litros por segundo, chegamos a cerca de 1 bilhão de metros cúbicos (de água) que a Bolívia deixou de receber”, explicou o vice-chanceler boliviano, Juan Carlos Alurralde, ao jornal La Razón.

Para Alurralde, a abertura das obras de desvio foi unilateral e, por isso, em 14 de abril de 1962, a Bolívia cortou relações com Chile e apresentou um recurso na Organização dos Estados Americanos (OEA).

Com o decorrer do tempo, uma das consequências do desvio do Lauca foi o êxodo rural das comunidades bolivianas que viviam na região fronteiriça. No entanto, de acordo com Alurralde, o dano ao sistema hídrico do altiplano é incalculável.

O presidente boliviano, Evo Morales, afirmou recentemente que o problema do Lauca faz parte das questões pendentes que podem ser retomadas na agenda do diálogo entre os Chile e Bolívia. A presidenta chilena, Michelle Bachelet, após assumir seu segundo mandato, disse que seu país estava aberto para reativar a agenda com a Bolívia, mas sem incluir o tema marítimo, porque, segundo ela, a questão já está sendo discutida na Corte Internacional de Justiça (CIJ).