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Política e os trabalhadores comunistas

Uma questão relativamente negativa, a meu ver, chamou a atenção nos debates do 8º Encontro Nacional. Quero polemizar sobre ela.

Muitos dos que intervieram referiram-se criticamente ao papel dos sindicalistas, sua suposta ou real ação excessivamente corporativista, ou mesmo “despolitizada”; ao menos, a dificuldade deles em encetar a construção política do partido entre os trabalhadores.

Mais do que o eventual exagero, preocupou-me o tom naturalizado com que foram asseveradas essas questões. Como algo já dado, consolidado e conhecido, generalizado enfim.

Não concordo com esse conjunto de assertivas, se é que elas convergem para uma crítica única. Há muito que vimos debatendo a questão dos trabalhadores no partido. Afirmamos que eles seguem sendo o sujeito social decisivo de qualquer projeto revolucionário nos tempos contemporâneos inclusive. Chamamos a descortinar em chave mais ampla o que é realmente o proletariado brasileiro, não apenas sua fração mais organizada. Dissemos que para tanto são necessários estudos empíricos e não apenas escatologias de princípios. Em termos políticos, reiteramos sempre o papel indispensável do sindicalismo classista para tanto, a unidade classista e a ação política de massas, bem como o trabalho de bases.

São notórias as dificuldades, aliás em todo o mundo, não só do trabalho direto entre os trabalhadores, como igualmente do trabalho sindical, às voltas com burocratismo, corporativismo, falta de horizontes políticos. Não se poderia, entretanto, atribuí-las aos trabalhadores eles próprios, ou aos sindicalistas tão somente. Isso em primeiro lugar.

Em segundo, o fato que parece motivar as críticas que julgo mal formuladas é a falta de maior protagonismo político dos trabalhadores e sindicalistas na ação partidária nos dias atuais. Haveria que considerar as fases de fluxo e refluxo da luta dos trabalhadores em cada conjuntura política, sua maior ou menor unidade e as plataformas mais ajustadas ou menos das entidades da classe. Haveria que considerar ainda que, na situação presente brasileira, é o caso mesmo de dizer que se necessita reativar o papel dos trabalhadores enquanto o sujeito social e político enquanto base fundamental das vitórias ocorridas desde 2002 – construídas desde o fim da ditadura militar -, e igualmente da luta por novo patamar nas mudanças estruturais exigidas pelo projeto nacional de desenvolvimento. O caso é que as vitórias e conquistas acomodoram um tanto esses segmentos; e a hegemonia neoliberal, num tempo de grandes transformações tecnológicas e na base produtiva do capitalismo, desnorteiam parâmetros tradicionais do trabalho sindical e no chão da empresa. Haveria de considerar, ainda – nem se pense em esquecer – nas formas modificadas das relações sociais, da perda de centralidade relativa ou absoluta dos trabalhadores no conjunto da luta social e até nas formas de urbanização, que exigem deles outras formas de lutas, de organização e de interrelação de sua luta com o conjunto das contradições que afetam as massas de milhões de populares, notadamente nos grandes centros urbanos, sem o que seu protagonismo ficaria reduzido às demandas econômicas imediatas, portanto corporativistas.

O que considero real e concreto, é que a corrente sindical classista organizada na CTB tem um claro delineamento do projeto político avançado necessário ao Brasil e organiza sua luta nos termos possíveis, embora a capacidade de mobilização – não só dela – é escassa. Igualmente, considero que os trabalhadores comunistas tem claro projeto estratégico em mente, embora muitos ainda não tiraram todas as consequências do Programa Socialista para a ação política oriunda do projeto estratégico nele contida.

O mais claro, para mim, é que nenhum reducionismo pode ter lugar nesse debate, de parte a parte. Aliás, eles esterilizariam o debate, cada qual fechado em suas certezas e preconceitos. O mais claro, também, é que o papel dos trabalhadores comunistas, além de liderarem seus sindicatos como escolas de consciência política primária de classe, é se fazer o portador de um projeto político para a nação brasileira, de soberania, afirmação nacional, liberdade e progresso social, com o fito de um novo patamar civilizatório da formação da nação. Despertar o apetite político dos trabalhadores, para que assumam em suas mãos, crescentemente, o papel central que lhe compete, segundo pensam os comunistas. Não só mais sindicalismo, mas mais política na relação entre nossos sindicalistas e a base da classe, bem como com suas lideranças sem-partido, seus líderes espirituais fora da classe, em suas vivências e percepções como cidadãos e não apenas como trabalhadores.

Para que não seja mal-compreendido: os comunistas privilegiam a ação nos lócus essenciais das relações de exploração e opressão, daí a centralidade da relação capital-trabalho e dos sindicatos. Mas há opressão fora dessa relação, como se pode depreender do papel cada vez mais ativo das mulheres e dos jovens na realidade social, econômica e cultural, nem por isso isento de opressão. E as contradições se expressam também nas condições de cidadania, outro modo de abordar o mesmo trabalhador, que no mais das vezes é jovem e mulher ao mesmo tempo.

Daí que o mínimo que quero dizer é que não se pode encerrar o trabalho entre os trabalhadores em marcos estreitos. E, diretamente, os comunistas trabalhadores não podem se perder em abstrações, como a de atribuir – eventualmente – as incompreensões de parte a parte entre eles “e o Partido” a uma pretensa prioridade ao trabalho institucional… Nem é verdade e nem ilumina a verdadeira questão.

Alcançar protagonismo político em torno de seu projeto exige do PCdoB mais força eleitoral. Não há muralha da China entre as formas que convergem para fazer da ação política, influência social e cultural, trabalho em governos e luta de massas e de ideias, e transformá-las em força eleitoral. Ao contrário, todas são premissas uma das outras e se retroalimentam. E alimentam a construção da força partidária indispensável, o PCdoB, que vai muito além da organização sindical.

O que acho é que os próprios trabalhadores comunistas e sindicalistas precisam despertar mais seu apetite político, eles próprios, crescentemente, criarem condições para fazer de sua liderança uma força política capaz de alcançar representação eleitoral, parlamentar, de governos etc. É meridianamente claro que só o trabalho da categoria dificilmente elege alguém: cumpre alargá-lo para mais amplas massas, partindo do núcleo central. E também gastar mais energia em organizar e dar vida regular ao Partido em seu local de atuação, pois essa é a séde do debate estratégico dos comunistas para o Brasil. Parar, enfim, de se julgar bom comunista porque se reúne no sindicato o tempo todo e leva a luta sindical no cotidiano.

Assim, ajudarão os trabalhadores a compreender que a Política é a forma mais elevada da consciência social e a luta política é o modo de transformar a sociedade. Mais sindicalismo, apenas, não basta. É preciso mais política, estudar mais, ampliar as relações sociais e os conhecimentos em função dos interesses do Programa Socialista.

Em lugar nenhum está escrito que os trabalhadores não devam ser seus principais protagonistas. Antes pelo contrário, no caso do PCdoB.