Horário de verão revigora luta pela redução da jornada 

A jornada de trabalho menor é instrumento eficaz também para a distribuição de renda, num esforço para diminuir a concentração de renda, as desigualdades sociais e de oportunidades no país.

Por Jacy Afonso* 

Toda vez que tem início o horário de verão, quase que unanimemente todo mundo resmunga por perder uma hora de sono. É comum também a reclamação por ter de sair ainda escuro de casa para o trabalho. Não foi diferente nesta última segunda-feira (21). Acordei meu relógio já marcava quatro horas, fui para o aeroporto de Brasília a tempo do embarque para São Paulo, tinha compromissos na sede nacional da CUT. Fiquei contrariado e fiz coro com os que lamentam a “perda” de uma hora de sono em função da adoção, em seus estados, do horário de verão. Desaprovei o horário.

Ao final do expediente, ainda com a luz de um dia ensolarado, tive a mesma impressão de outros anos. Ao contrário da madrugada, estava contente, com a sensação de ter terminado tudo mais cedo e que poderia aproveitar mais o restante do dia para jogar conversa fora e usufruir do lazer. Fiquei satisfeito e aprovei o horário.

Uma contradição manifestada por amigos em conversas. Reclamamos do sono encurtado na noite anterior e manifestamos contentamento com aquela (falsa) sensação de uma hora a menos de trabalho.

Papo vai, papo vem, surgiu então a proposta de se criar o “horário de verão classista”. Em vez da alteração de todos os horários, haveria apenas a redução da jornada de trabalho em uma hora. Assim como o horário de verão a proposta proporcionaria redução no consumo de energia elétrica, mas também geraria mais empregos e melhor qualidade de vida a todos.

Lancei, em tom de brincadeira, a ideia no facebook, a qual provocou inúmeros comentários favoráveis e divertidos.

Na verdade, por trás dos comentários e da grande adesão à ideia, estava o anseio de todos nós, trabalhadores e trabalhadoras, pela redução da jornada de trabalho, sem redução de salários, uma das principais bandeiras de luta da classe trabalhadora, assumida há muito tempo pela CUT.

Neste ano estamos comemorando os 25 anos da Constituição. Foi com ela que tivemos a segunda e última redução de jornada de trabalho desde a escravidão. A primeira foi em 1943 e a outra em 1988, que estabeleceu a jornada em 44 horas semanais. Faz um quarto de século então que ainda mantemos uma das maiores jornadas de trabalho do mundo.

Desde 1995 o movimento sindical vem pressionando o Congresso pela aprovação da redução da jornada para 40 horas semanais e a elevação da hora extra para 75% sobre o valor da hora normal. Esse é o teor da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 231/95) do senador Inácio Arruda (PCdoB-CE). Aprovada em Comissão Especial da Câmara dos Deputados em 2009, aguarda votação em plenário desde então.

A CUT e as demais centrais sindicais têm realizado inúmeras manifestações pedindo a aprovação da PEC. A reivindicação encabeça a pauta dos trabalhadores que está em discussão com a Presidência da República, que se comprometeu a estudar a sua implantação. Não há quem discorde que a diminuição da jornada refletirá no tempo de vida do trabalhador, no maior convívio familiar, em mais horas dedicadas ao estudo e aperfeiçoamento, em mais atividades culturais, lazer e descanso, entre outros benefícios. Mas é preciso derrubar resistências de setores empresariais que apenas vislumbram aumento de lucros, cegamente, sem preocupações sociais.

Com estudos reunidos pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o movimento sindical tem procurado mostrar ao governo e parlamentares a urgência da redução da jornada sem redução de salários, apontando vantagens como a redução no desemprego, diminuição de horas extras e doenças laborais, crescimento da produtividade do trabalho.

Temos a certeza que no atual estágio da economia do Brasil existem condições favoráveis para a adoção de jornada de 40 horas, sem redução de salários. Temos obtido crescimento econômico apesar da crise financeira internacional.

A jornada de trabalho menor é instrumento eficaz também para a distribuição de renda, num esforço para diminuir a concentração de renda, as desigualdades sociais e de oportunidades no país. E, certamente contribuirá na qualidade de vida no que diz respeito à interação social e familiar pouco vivida por grande parcela dos trabalhadores e trabalhadoras, o que afeta negativamente a toda sociedade.

Esses argumentos não são balelas. Estão comprovados por mais de 30 categorias de trabalhadores que já reduziram a jornada de trabalho, sem redução de salários no país. É hora de intensificar a luta para usufruir melhor todos os dias do ano e dos anos futuros e não ter apenas a falsa sensação de ganho de hora no verão.

*É Secretário Nacional de Organização da CUT