Demarcações fazem vítimas nos dois lados, diz consultor da Fetag

A questão fundiária passou a ser discutida com maior intensidade no estado após o enfrentamento entre a Brigada Militar e indígenas na Praça da Matriz, na última sexta-feira (30). Na manhã desta segunda-feira (2), o governo estadual ofereceu cerca de seis mil hectares de terras para contemplar os interesses de agricultores e indígenas – que disputam os mesmos territórios na Região Norte do Rio Grande do Sul.

Por um lado, os povos indígenas se amparam na Constituição federal para requisitar terras a que teriam um direito originário por terem habitado os territórios ao longo de determinadas épocas. No entanto, agricultores recordam que foram para essas mesmas áreas por conta de iniciativas de colonização e que possuem as escrituras legais das terras em disputa.

Ainda que a responsabilidade pelas demarcações seja do governo federal, o estado do Rio Grande do Sul tem buscado assumir uma posição de mediação quanto ao tema, reunindo-se com representantes das federações de agricultores e dos povos indígenas. Caberá ao estado, também, buscar saídas para o pagamento da indenização aos agricultores que serão terão de ser reacomodados em outro local – caso as demarcações deixem de ser suspensas.

Para o consultor da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Rio Grande do Sul (FETAG), Gitibá Guichard Faustino, a atmosfera constante tem sido a da “insegurança” para os pequenos produtores rurais. “Este conflito que envolve a demarcação de terras para indígenas e quilombolas é relativamente novo no Rio Grande do Sul, embora já ocorresse em outros estados há mais tempo”, afirma.

Faustino afirma que “cerca de 95%” dos agricultores envolvidos não são grandes proprietários de fazendas, mas trabalhadores da agricultura familiar. “Eu penso que os dois lados são vítimas de um processo. Não entendo como dívida histórica (a reivindicação indigenista), mas concordo que eles sofreram injustiças e devem buscar a reparação”, relativiza o consultor.

“Admito que ainda não entendi muito bem esta mediação do governo estadual. Não se pode resumir tudo à questão fundiária. É certo que os indígenas têm uma justificativa antropológica, mas o agricultor também tem uma profunda ligação com a terra, de pertencimento e de compadrio nestas áreas”, questionou. Para Gitibá Faustino, a Constituição federal prevê direitos para as duas partes envolvidas – tornando, desta maneira, a situação ainda mais complexa.

Na tarde desta segunda-feira, em entrevista à Rádio Guaíba, o presidente da Federação, Helton Weber, sinalizou que a entidade não deve aceitar a proposta que o governo anunciou na coletiva de imprensa, já que os agricultores em questão possuem as escrituras das terras em que vivem. Na próxima quarta-feira (4), representantes dos povos indígenas devem ter nova reunião com o governo estadual em Porto Alegre. Será a primeira após o enfrentamento que envolveu gás lacrimogêneo, lanças e flechas e foi alvo de uma nota crítica do Comitê Indígena Missionário (CIMI) no fim de semana.

Além de indígenas, pequenos agricultores e representantes do Executivo, membros da bancada ruralista do Congresso Nacional também têm se ocupado das indefinições deste processo. Presente na inauguração da última Expointer em Esteio, a senadora Kátia Abreu (PSD-TO) defendeu o projeto de lei que impede, por dois anos, a demarcação de “terras que tenham sido invadidas”.

Fonte: Sul21