Espionagem: Brasil reitera indignação e cobra explicações dos EUA

O governo do Brasil reiterou nesta segunda-feira (2) a indignação às autoridades dos Estados Unidos em meio às denúncias de espionagem de agências norte-americanas sobre dados da presidenta Dilma Rousseff e assessores, conforme divulgado neste domingo (1º) no programa "Fantástico", da TV Globo.

Os ministros José Eduardo Cardozo (Justiça) e Luiz Alberto Figueiredo Machado (Relações Exteriores) reiteraram ser inadmissível aceitar qualquer tipo de violação. Cardozo e Figueiredo cobraram dos Estados Unidos explicações, por escrito e formais, sobre as denúncias. “A violação da soberania não pode acontecer sob nenhum pretexto, quando a violação se dá não para investigar ilícitos”, disse Cardozo, lembrando que a indignação foi exposta aos norte-americanos. “Nós confrontamos com aquilo que foi revelado.” (Foto: Valter Campanato/ABr)

Em seguida, o ministro da Justiça reiterou que “a violação da soberania não pode acontecer sob nenhum pretexto”. Segundo ele, a situação se agrava quando a violação ocorre “sob o ponto de vista político e empresarial”. “Essa situação fica, sem sombra de dúvidas, piorada”.

Figueiredo acrescentou que a violação da privacidade e dados pessoais, sejam de autoridades, como a presidenta da República, e dos cidadãos em geral, é “incompatível” com a parceria existente atualmente entre Brasil e Estados Unidos. “É uma violação inconcebível e inaceitável da soberania brasileira”, ressaltou.

Pela manhã, Dilma convocou ministros para duas reuniões de emergência no Palácio do Planalto para discutir as denúncias de espionagem. As reuniões ocorreram em duas etapas: a primeira, que começou por volta das 10h, teve a presença dos ministros Cardozo, José Elito (Gabinete de Segurança Institucional), e Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência).

A segunda reunião ocorreu logo depois, com Cardozo e os ministros Paulo Bernardo (Comunicações), Celso Amorim (Defesa) e Luiz Alberto Figueiredo Machado (Relações Exteriores).

Reunião com o embaixador norte-americano

Antes das reuniões, o ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo Machado, convocou o embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Thomas Shannon, para prestar esclarecimentos formais ao governo brasileiro e cobrou explicações por escrito das autoridades norte-americanas.

“Convoquei o embaixador dos Estados Unidos ao meu gabinete e disse a ele da indignação do governo brasileiro, dos fatos constantes, dos documentos revelados, das violações das correspondências da senhora presidenta”, ressaltou Figueiredo.

Na reunião com Shannon, Figueiredo disse que as suspeitas sobre o Brasil envolvendo riscos à democracia e solidez do Estado brasileiro são inadmissíveis. “O Brasil é um país democrático, um Estado sólido, em uma região democrática e sólida, que busca a convivência com seus parceiros de forma amistosa. Não se pode admitir, nem em sonho, que é um país de risco ou problemático”, disse.

Figueiredo assegurou que a conversa com Shannon foi dura e o tom claro. “Foi uma conversa que ele [Shannon] entendeu o que foi dito. As coisas, quando têm de ser ditas de forma clara, são ditas de forma clara. Ele tomou nota de tudo o que eu disse”, ressaltou o ministro.

“Hoje é feriado [Dia do Trabalho] nos Estados Unidos, mas ele [Shannon] se comprometeu a entrar em contato com a Casa Branca, para que eles nos enviem por escrito [as explicações sobre as denúncias]. Eu quero que o governo dos Estados Unidos dê as explicações, não necessariamente o embaixador. Nós estamos esperando a resposta. Na minha conversa, ficou claro que esperamos uma resposta ainda esta semana”, disse Figueiredo.

Em seguida, o ministro ressaltou que: “A violação da soberania brasileira é inconcebível e inaceitável. Esse tipo de prática é incompatível com a parceria estratégica entre os países. O governo brasileiro quer prontas explicações”.

O governo brasileiro cogita levar a questão da espionagem de dados por agências norte-americanas a foros internacionais, inclusive aos relativos aos direitos humanos. Além da soberania do país, o entendimento é que, caso seja confirmada, a interceptação de dados seja uma violação da privacidade e da presunção da inocência – que são considerados direitos humanos.

"Deve haver uma governança internacional que proíba a exposição dos cidadãos a escutas, violação de dados, de privacidade e ataques cibernéticos. A agenda que deve ser adotada na arena internacional é para regulamentar o uso da internet. Não para cercear direitos, mas para proteger direitos", disse o chanceler Luiz Alberto Figueiredo.

Segundo o ministro da Justiça, Luiz Eduardo Cardozo, o governo brasileiro vai aguardar o posicionamento formal dos Estados Unidos a respeito da questão, que deverá ser feito ainda nesta semana, para então tomar as medidas cabíveis.

No Congresso, parlamentares haviam mencionado a possibilidade de levar a questão da espionagem a órgãos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU). No entanto, hoje foi a primeira vez em que foi citado o acionamento de organismos de direitos humanos – como pode ser feito no âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA), por meio da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

"Precisamos acabar com o ciclo do que está acontecendo. Cheguei dos Estados Unidos no final da semana e no domingo já tivemos uma nova denúncia", reclamou José Eduardo Cardozo. 

No Brasil, a interceptação de dados telefônicos ou virtuais só pode ser feita por meio de autorização judicial. No caso, se os Estados Unidos quisessem ter acesso a dados do país – de pessoas, de empresas ou mesmo do governo –, teriam de tomar a via judicial para isso, por meio de tribunais, que poderiam, ou não, acatar o pedido.

Viagem aos Estados Unidos

O jornal Folha de S.Paulo, com informações não confirmadas, divulgou que a presidenta Dilma Rousseff cogita a possibilidade de cancelar a viagem oficial que faria aos Estados Unidos em outubro, caso o presidente Barack Obama não dê "respostas satisfatórias" sobre as ações de espionagem da NSA (Agência de Segurança Nacional) que a teriam atingido.

Ainda não há uma decisão final sobre a possibilidade de cancelamento da viagem de Estado, e o Palácio do Planalto espera que o presidente Obama explique de forma cabal e tome as medidas necessárias para contornar o "grande mal-estar" que foi gerado pela informação de que a presidenta Dilma foi alvo direto da espionagem feita pela NSA.

Oficialmente, o Palácio do Planalto informa que "esta possibilidade [cancelamento da viagem] não está na mesa" e não está em análise.

Com agências