De Córdoba aos dias atuais, a luta pela reforma universitária

Os estudantes são protagonistas de uma grande discussão em curso no país: a reforma da universidade brasileira, assunto que diz respeito a toda a sociedade e deve ser tratado com prioridade pelo governo federal. O tema será amplamente debatido durante o 14º Conselho Nacional de Entidades de Base (Coneb), da União Nacional dos Estudantes (UNE), que acontecerá entre os dias 18 e 21 de janeiro, em Recife (PE). O objetivo é debater e formar um posicionamento da entidade para o próximo período.

A Reforma Universitária está para a UNE assim como a reforma agrária está para o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Essa sempre foi uma bandeira defendida pela entidade que, mesmo nascendo em 1937, viu em 1918, no manifesto escrito pelos estudantes argentinos da Universidade de Córdoba, uma maneira de pensar e construir uma rede de ensino livre e democrática.

A chamada Reforma de Córdoba é considerada um marco na história das universidades latino-americanas por ser pioneira na construção de um modelo institucional que atribuiu uma identidade e um modelo de atuação renovado no ensino superior. Foi a primeira vez aqui na América Latina que houve uma inserção dos estudantes no debate da função e do papel de uma universidade. Córdoba serviu de exemplo para que, em 1961, a UNE se debruçasse nas primeiras reivindicações de reforma aqui no país.

Surge o movimento nacional

A partir da década de 1960 era consensual o movimento em prol da Reforma Universitária, pois havia uma necessidade obvia de reestruturação do universo acadêmico. No bojo das contradições político-ideológicas que acontecia na sociedade, legitimava-se uma luta para fundamentar a efetiva reforma para a universidade.

O primeiro documento, “A Declaração da Bahia”, foi o resultado do I Seminário Nacional da Reforma Universitária promovido pela UNE, em 1961. Na época, a entidade se preocupava porque a instituição universitária falhava com sua missão cultural, profissional e social, agindo num caráter antidemocrático do acesso ao ensino superior e formando profissionais individualistas, sem maior preocupação com os problemas da sociedade.

Na época, praticamente todas as greves estudantis aconteciam devido à situação do ensino. Em Pernambuco, Minas, Bahia, Paraíba e em todos os estados, com maior ou menos repercussão, as greves se sucediam, ganhando as ruas e clamando pela urgente necessidade de uma reforma universitária.

Um ano depois, em 1962, o II Seminário Nacional da Reforma Universitária em Curitiba foi, por assim dizer, o ponto de encontro de estudantes de todo país, unidos por um mesmo problema em busca de uma mesma solução. Lá, as resoluções do Seminário de Salvador foram desenvolvidas e analisadas.

Em termos práticos – e até teóricos – o Seminário de Curitiba superou o de Salvador. Os universitários concluíram que a reforma é, antes de tudo, uma mudança na estrutura. Na época, avaliaram que, como todas as reformas de base, a reforma universitária interessava fundamentalmente o povo, pois somente para o povo o ensino superior era um problema grave e quase inalcançável.

Nessa altura, a UNE assumia papel principal na defesa da educação de qualidade e para todos no Brasil. Do encontro em Curitiba resultou a Carta do Paraná, que passou a ser a orientação básica do movimento estudantil.

Vale ressaltar que a Reforma Universitária proposta pelos Seminários da UNE estava ligada sempre às questões políticas mais globais e os problemas da reforma da sociedade. Procurava-se também uma Reforma Universitária como parte das reformas de base. Os estudantes universitários tomavam consciência da sociedade nacional e ampliavam uma articulação entre a reforma da universidade e as transformações gerais da sociedade.

Ditadura

Com a ditadura militar, os estudantes foram reprimidos, perseguidos e assassinados por se organizarem e por sonhar com um Brasil e uma universidade diferente.
Após 40 anos, o debate continua a ser o centro da luta estudantil

Passados quatro décadas, a entidade continuou com o debate sobre reforma universitária, entendendo ser imprescindível para o desenvolvimento nacional e que muito ainda deve ser feito.

“A UNE sempre colocou em pauta a luta pela Reforma Universitária, mas o mote da discussão muda conforme o momento político que o país vive. Na década de 1990, com o boom das privatizações, a UNE levantava a bandeira da resistência contra a precarização da universidade pública. Já em 2003, com a eleição do presidente Lula, o discurso já pendeu para a necessidade de se discutir programas de acesso e planos de extensão”, explicou a diretora de universidades públicas, Carina Vitral.

Vale destacar que entre os meses de abril e maio de 2004, a gestão da UNE colocou o pé na estrada com a chamada “Caravana UNE pelo Brasil” para ouvir e conhecer de perto as opiniões dos estudantes a respeito da reforma universitária. O resultado da coragem e ousadia da UNE resultou no entendimento por mais políticas de acesso e assistência estudantil, ampliação das vagas e reestruturação das instituições por meio do Programa de Apoio e Planos de Expansão das Universidades Federais (Reuni).

Em 2009, uma proposta de um projeto de Reforma Universitária foi enviada para o Congresso via parlamentares. O debate tem sido intensificado ao longo dos anos permeando todas as bandeiras da entidade . Para o presidente da UNE, Daniel Iliescu, “os estudantes debatem o assunto há 40 anos de maneira organizada e sentem-se respaldados para lutar pela vitória de sua concepção de universidade”.

Iliescu ainda ressaltou que é preciso reafirmar o caráter publico da educação, “colocando-a como direito de todos e percebendo que não se pode encaixar nos ´gastos sociais´ o que significa investimento insubstituível a nossa soberania e emancipação”.

“Estamos diante de uma oportunidade histórica e não vamos desperdiça-la. A UNE vai estar onde sempre esteve, fazendo o que sempre fez, e defendendo o que sempre defendemos – nas ruas, na luta e pela universidade, gratuita e de qualidade, e socialmente referenciada”, pontuou o presidente.

Dos pontos defendidos pela UNE hoje, pode-se destacar a luta por uma universidade autônoma, democrática e acessível, com garantia de permanência, por uma assistência estudantil compreendida como política pública fundamental, além da defesa pela reserva de vagas e mais controle sobre o ensino pago.

Fonte: Site da UNE

(texto e fotos)