Aldo Rebelo: Pacificar as torcidas organizadas

A torcida foi a primeira e maior consequência do futebol. Ela fez o esporte crescer e cresceu com ele, desde o jogo inicial, organizado por Charles Miller, na Várzea do Carmo, em São Paulo, a 15 de abril de 1895, entre funcionários de empresas inglesas, até ao que arrastou a maior multidão já vista em uma praça de esportes, em 31 de agosto de 1969, quando 183.341 torcedores pagaram ingresso para ver Brasil e Paraguai no Maracanã.

Por Aldo Rebelo*

O nome torcida, um neologismo de acepção, foi dado pelo escritor Coelho Neto (1864-1934), ao observar senhoras elegantes enroscando as luvas a cada lance emocionante de um jogo. Chamou-as “torcedoras”.
 
Em fenômeno social comum ao século XX, a torcida também se institucionalizou, e, como os clubes, organizou-se em associações civis com estatuto e diretoria. Seu objetivo era reunir torcedores mais apaixonados, como uma seita dentro da religião. Mas gerou deformidades que instilaram seu próprio veneno.

Há um movimento para extingui-las, ou, ao menos, proibi-las nos estádios. Vândalos, nem sempre desestimulados pelas direções, canalizaram para as torcidas organizadas o espírito das antigas gangues e agridem-se sobretudo a caminho do estádio. Felizmente nunca atingimos no Brasil o grau de violência de torcedores da Europa, que já deixaram em seu rastro de Átila dezenas de mortos após um jogo de futebol.

A solução não é extinguir nem proibir as torcidas organizadas nos estádios, mas construir uma negociação multilateral que as reconduza a seu papel original, livrando-as da delinquência. Punir e banir os baderneiros e criminosos, e preservar o espetáculo paralelo das bandeiras, batucadas, coreografias, lemas e cantos. O exemplo vem das escolas de samba, mais antigas e não menos inflamadas, que concorrem para oferecer o melhor desfile e se respeitam fora do sambódromo.

*Aldo Rebelo é ministro do Esporte.

Fonte: Diário de São Paulo