Zilah Branco: Pingue-pongue da responsabilidade pela educação

Os atos de violência de jovens nas escolas se sucedem como uma onda nova de comportamento social descontrolado entre estudantes considerados normais. Os pais culpam as escolas e os professores "que não educam" e os responsáveis pela educação atiram as "culpas" para o Estado e o governo "que não cria condições adequadas para evitar vandalismos e proteção policial", mas também para as famílias "que não educam nem controlam os filhos".

Por Zillah Branco*, especial para o Vermelho

Trata-se de um pingue-pongue absolutamente irresponsável enquanto a juventude é vista como uma peteca em uma sociedade caótica onde ninguém quer assumir a responsabilidade vista como "culpa".

Em primeiro lugar, será interessante discutir alguns conceitos de origem cultural-religiosa muito repetidos em uma análise "paternalista" das questões sociais. A "culpa"corresponde a um "juízo moral" dos que estão em uma situação "superior" à população em geral e aos seus filhos e "dependentes familiares".

Não há "culpas", mas sim responsabilidade humana e social. Não se pode falar na responsabilidade familiar sem referir as instituições disponíveis no Estado e coordenadas pelos poderes políticos – Executivo, Legislativo e Judiciário -, que organizam a sociedade e apoiam os cidadãos e suas famílias.

E os poderes – Executivo e Legislativo – são formados pela via das eleições democráticas que depende do voto do cidadão adulto.

A democracia deveria abranger também o terceiro poder, Judiciário, e garantir aos cidadãos a capacidade de escolha dos seus candidatos sem fazer uso de recursos promocionais (de altíssimo custo financeiro que onera os recursos públicos) e não informam com isenção sobre os reais compromissos do candidato. Mas isto ainda não acontece, o que limita a educação social dos cidadãos e reforça o poder da elite que é mais organizada e dispõe de propriedades, recursos financeiros e acesso às técnicas e instrumentos de informação.

Diante deste quadro, as reações individuais aos problemas sociais dividem-se em dois campos: o dos conservadores que são beneficiados e dos submissos que desanimam diante da necessidade de mudar a situação social, por um lado; e dos que trabalham por mudanças onde a democracia é a referência fundamental, buscando informação e formação para participar com determinação. A formação cívica será decorrente dos passos deste segundo lado. Entre os descontentes, principalmente os mais jovens, muitos resolvem agir pessoalmente e com as suas forças para impor as mudanças.

Frequentemente é detonada a violência entre os dois lados. A responsabilidade por tais ações voluntaristas é da situação social onde a democracia não foi implantada devidamente.

Começar por onde? Não há uma ponta inicial, o processo de mudança depende de todos os participantes. O lado conservador sofreu dois abalos no seu antigo poder: os atuais poderes governamentais receberam elementos não conservadores e apresentaram programas de mudança democrática para as instituições do Estado e, a nível internacional, o sistema capitalista sofre uma profunda crise que só será superada se aceitar a democracia como base de atuação.

Objetivamente estamos perante o caos que abre a possibilidade de mudança. Deixemos de lado a ideia de "punir os culpados" e vamos promover a participação dos cidadãos e a colaboração entre todos os que desejam realmente a democracia.

Os que agem ao nível das famílias vão perceber que a criança ao nascer encontra uma mãe em luta pela sua emancipação para não ser dominada pela velha cultura machista. Mas não há estrutura de apoio para esta mãe tornar-se uma educadora. Ela não tem tempo para se dedicar maternalmente ao filho e recorre às fórmulas de "compra" do sorriso da criança (que se tornará manhosa e exigente, em consequência, e angustiada como se fosse órfã). O pai, privado das condições do machismo que liberavam o homem das tarefas domésticas e de criação dos filhos, perde também a sua autoconfiança baseada no poder.

A família hoje está desestruturada pela mudança cultural da sociedade e não pode solucionar os problemas que enfrenta, sem o apoio institucional e coletivo que a sociedade cria. A disciplina, como instrumento de equilíbrio, deixou de ser considerada com a quebra dos valores conservadores, tanto nas famílias como na sociedade em geral.

Os poderes políticos que coordenam o Estado têm a função de legitimar a disciplina para garantir a segurança pública e a liberdade de crescimento saudável das crianças e jovens. Impedir os abusos e imposições dos que se consideram "superiores" não se confunde com autoritarismo nem com o paternalismo dos conservadores que protegem os "inferiores", pois é a defesa da democracia que assegura a liberdade de todos e não de uma elite.

É na educação coletiva da creche que a criança começa a ser educada. Ali existe uma disciplina que é comum para todos e aparece como um recurso para gerir o tempo e os recursos e não como um privilégio de alguns ou uma limitação ao que cada criança deseja. Mas há poucas creches no país, faltam estruturas e a formação profissional é deficiente em todo o país.

Com os mesmos problemas educativos e sociais segue o sistema escolar, o que vai ser agravado pela educação e cultura veiculados pela mídia sem qualquer controle democrático e institucional. Existem sérias contradições entre a educação transmitida pela mídia, a publicidade, os eventos culturais, os abusos da elite poderosa, e a orientação pedagógica do sistema escolar. A criminalidade crescente nas ruas cerca a juventude nas escolas, criando a necessidade da defesa civil fora dos muros da escola e também dentro, entre os alunos.

O atual governo prossegue a criação de uma política pública de educação e a criação de uma rede escolar. Grandes passos foram dados com a implantação da alimentação e com a compreensão holística da educação ligada ao esporte e ao ambiente. Os temas das aulas conduzem à consciência de cidadania, portanto ao civismo. A distância que ainda existe entre uma riquíssima base pedagógica que no Brasil foi legada por brilhantes educadores desde o início do século 20 (Lourenço Filho, Anísio Teixeira, Paulo Freire e tantos outros) e a implantação de uma moderna política educacional em todo o território
nacional, depende da participação dos cidadãos e da interligação entre todos os níveis administrativos e dos três poderes nacionais.

O processo de democratização de um país não está isolado no mundo. A luta travada pela população brasileira passa pela defesa em relação às ameaças externas que estão presentes nos meios de informação, como no aprendizado diante da realidade de outros povos. O cidadão forma-se politicamente fortalecendo a solidariedade que faz parte do civismo.

A violência como moda internacional

A falta de estabilidade familiar e social cria o ambiente propício para a formação da criança individualista, fechada em si, egoísta por não reconhecer o outro como seu complemento na vida. Estas características coincidem com o estímulo do sistema capitalista no indivíduo, na elite, na apropriação dos recursos naturais, na escravização da população mediante a diferenciação de renda, na criação de corporações e multinacionais poderosas cujo poder é maior que o do Estado.

Solitária no seu casulo antissocial, a criança elabora uma personalidade agressiva e violenta que vai se espelhar no modelo de força mundial que predomina nos jogos, vídeos, músicas, novelas, cenários de guerra, notícias de invasões, políticas terroristas e toda uma forma publicitária de ameaças de vírus e doenças para subordinar as pessoas aos produtos defensivos oferecidos pelos donos do poder planetário.

Qualquer pessoa capaz de observar com afeto uma criança no seu desenvolvimento percebe a necessidade urgente de lutar pela sua defesa.

Desde a primeira infância ela está exposta ao egoísmo de adultos que a tratam como objeto lúdico sem qualquer preocupação com os efeitos das suas atitudes sobre a saúde física e mental do bebê. O comportamento será o reflexo deste "uso" feito pelo adulto que, quando se desinteressa do jogo exerce autoridade para inibir respostas e lágrimas.

A sociedade, através das imagens transmitidas repete o modelo onde os heróis (que se identificam com os primeiros adultos que despertaram o seu amor e medo) comandam os mais fracos. Nas escolas os adolescentes se confrontam diretamente com a situação que define a humanidade dividida em superiores e fortes ou inferiores e fracos. As duas opções deformam psicologicamente o ser humano e deixam a violência como solução de sobrevivência.

A alteração social desse comportamento destrutivo que se consolida na cultura nacional exige a interação institucional e a participação cidadã para aplicar uma política educacional amplamente analisada à luz dos princípios éticos democráticos que a pedagogia encerra. Os meios de informação devem assumir as suas responsabilidades para corroborar como instrumento de cidadania. O entendimento da liberdade de expressão supõe bom senso e respeito pela sociedade com seus valores e políticas educacionais. Os temas impactantes, como, por exemplo, os de promoção do herói-vilão, não devem estar ao alcance das crianças como espectadoras, apesar da sua importância como reveladores de uma realidade. Assim como as críticas a posições religiosas ou características culturais de seitas e setores raciais, não devem ser divulgadas como formas de preconceitos e armas políticas de conflito social.

A elaboração de imagens e textos que respeitem os princípios estabelecidos a nível nacional enfrentará contradições com a violência dominante no palco internacional onde atua o império agressor sobre povos enfraquecidos pela miséria e infiltrações criminosas.

Socióloga, militante comunista e colaboradora do Vermelho