Denúncia contra Curió é avanço para democracia, diz Aldo Arantes 

“Os juízes estão tendo a coragem política e contribuindo para aprofundar o processo democrático no país”, declarou em entrevista à Rádio Vermelho Aldo Arantes, secretário Nacional do Meio Ambiente do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) que integra o Grupo de Trabalho Araguaia (GTA), ao falar sobre decisão inédita da Justiça de Pará, ao aceitar denúncias do Ministério Público Federal.

Joanne Mota, da Rádio Vermelho com agências

Em decisão inédita, apresentada nesta quarta-feira (29), a juíza federal Nair Cristina Corado Pimenta de Castro, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, Subseção de Marabá, no Pará, recebeu as denúncias do Ministério Público Federal contra o coronel da reserva do Exército brasileiro Sebastião Curió Rodrigues de Moura e o major da reserva Lício Augusto Maciel.

Leia também:

Guerrilha do Araguaia: Justiça acata denúncia contra militares

Em declaração à imprensa, a juíza Nair Pimenta de Castro considerou presentes os requisitos para transformar os militares nos primeiros réus da Justiça brasileira por crimes cometidos durante a ditadura. Os dois são acusados de sequestro qualificado de militantes capturados durante a repressão à guerrilha do Araguaia na década de 70, e até hoje desaparecidos.

Segundo Aldo Arantes,  a decisão representa um avanço democrático. “A Justiça vem acumulando decisões que significam um passo adiante, especialmente na adoção de medidas em relação àqueles que cometeram crimes, ou seja, aqueles que assassinaram e torturam os que lutaram contra a repressão da Ditadura Militar”, reafirma.

Para Arantes, “no caso da Guerrilha do Araguaia, está mais do que caracterizado a participação destes dois militares, especialmente do Cúrio, nos crimes cometidos durante a Ditadura na região do Araguaia. Diante disso fica claro que precisamos ainda avançar no que se refere a operação limpeza realizada para encobrir o crimes naquela região”, lembrou.

Ele lembrou que os guerrilheiros mortos foram enterrados em cemitérios da região ou em valas comuns e depois transferidos, o que dificulta a busca pelos desaparecidos na Guerrilha. “Não sabemos se os corpos foram incinerados ou jogados no Rio Araguaia. Quando começaram a matar muita gente, passaram a enterrar nas proximidades dos lugares onde as pessoas morriam. Na fase final da repressão tomaram a decisão de limpar ao máximo os vestígios das violências praticadas0”.

Segundo Arantes alguns guerrilheiros tiveram a cabeça cortada quando ainda estavam vivos. “Queriam impedir que as gerações futuras conhecessem a dimensão do que havia ocorrido ali”, continuou. “Fizeram várias operações com o objetivo de retirar os mortos dos locais onde estavam. Em geral isso era feito com mateiros, que tinham conhecimento da área, ou soldados. Eles tiravam os corpos e entregavam para oficiais.”

Para o Ministério Público Federal a responsabilização penal de Sebastião Curió e Lício Maciel é obrigação do Estado brasileiro diante da sentença da Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre o tema, e não contradiz a Lei de Anistia ou o julgamento do Supremo Tribunal Federal. Os procuradores responsáveis pelos dois casos sustentam as acusações em investigações próprias e apontam os acusados como responsáveis por crimes contra a humanidade.

Crimes

Sebastião Curió comandou a repressão à Guerrilha do Araguaia usando o codinome de doutor Luchini, e é acusado dos sequestros de Maria Célia Corrêa (Rosinha), Hélio Luiz Navarro Magalhães (Edinho), Daniel Ribeiro Callado (Doca), Antônio de Pádua Costa (Piauí) e Telma Regina Cordeira Corrêa (Lia). Todos eles foram capturados por tropas comandadas por Curió, entre janeiro e setembro de 1974, e, após terem sido levados às bases militares coordenadas por ele e submetidos a “grave sofrimento físico e moral”, desapareceram.

Lício Augusto Maciel usava, na época da repressão à guerrilha, o codinome de doutor Asdrúbal, e foi responsável pela captura de Divino Ferreira de Souza, o Nunes, ilegalmente detido pelo exército em 1973. De acordo com as investigações do MPF, Divino foi emboscado no dia 14 de outubro de 1973 pelos militares chefiados por Lício, quando estava ao lado de André Grabois (o Zé Carlos), João Gualberto Calatroni (o Zebão) e Antônio Alfredo de Lima (o Alfredo). Apesar de ferido, Divino foi interrogado e submetido a grave sofrimento físico em razão da natureza da detenção. Após isso, não foi mais visto.

Ouça a íntegra da entrevista: