Em reunião com Fasubra governo diz que reajuste será parcial

Depois de sinalizar que não apresentará até terça-feira (31) a proposta de reajuste esperada pelos servidores federais, em greve há um mês e meio, cancelando uma série de reuniões, governo afirma a dirigentes que reajuste só sairá para uma parte da categoria. Em entrevista ao Vermelho, João Paulo Ribeiro, da CTB e Fasubra, relata uma reunião que participou nesta segunda-feira (30), com o ministro da Educação, Aloizio Mercadante.

Por Deborah Moreira, do Vermelho

João Paulo Ribeiro, mais conhecido como JP, é secretário Nacional de Serviços Públicos e do Trabalhador Público da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e coordenador de Organização Sindical da Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores das Universidades Públicas Brasileiras (Fasubra Sindical), que representa 47 sindicatos, somando 61 instituições federais e 183 mil servidores de nível técnico.

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Os trabalhadores estão concentrados nas universidades federais e, juntamente com os professores, paralisaram as atividades para reivindicar reestruturação da carreira com reajustes salariais e políticas de incentivo.

Nesta terça-feira (31), haverá o Dia Nacional de Luta dos Servidores Federais, mobilização que acontecerá em todos os estados, com atos em defesa da valorização do trabalhador e do serviço público para exigir negociações efetivas com os servidores.

“Um ato que foi chamado pelas centrais, a CTB, CUT e Conlutas, e endossado por todo o Fórum Nacional de Entidades, com 29 entidades nacionais de servidores públicos federais, representa o total de um milhão e 200 mil trabalhadores. Será mais um dia de grande mobilização dos trabalhadores em greve”, destacou JP durante a entrevista.

Em Brasília, a concentração será a partir das 9h da manhã, em frente à Catedral, de onde seguirão em marcha até o Ministério do Planejamento. A maior parte dos atos estará concentrada no período da manhã. Acompanhe a entrevista:

Vermelho: O governo federal nesta segunda-feira (30) recuou na negociação, anunciando o adiamento das reuniões marcadas com as entidades representativas. Foi estipulado o dia 31 de julho como prazo para apresentar uma proposta governamental, pelo próprio governo. De que maneira a categoria avalia esse recuo?
JP: O governo soltou um documento hoje (30), avisando que adiou todas as reuniões entre 13 e 17 de agosto, justificando que farão reuniões internas para chegar a soluções no processo de negociação. A data final de incluir previsões orçamentárias no Orçamento de 2013 é 31 de agosto, o que nos deixa com pouco tempo para negociar, caso o governo apresente uma proposta muito em cima do prazo. Na prática, isso enfraquece o poder de negociação do trabalhador, o que demonstra que eles não querem negociar ou que não têm proposta de fato, ainda.

Vermelho: Mas, nesta segunda-feira (30), o ministro da Educação, Aloysio Mercadante, recebeu a Fasubra, entidade que você representa?
JP: Sim. Juntamente com o secretário executivo, Henrique Pain, e o secretário nacional do Ensino Superior [Sisu], Amaro Lins.

Vermelho: Como você avalia o resultado da reunião?
JP: Julgamos que foi uma reunião positiva, fruto da movimentação que a gente vem fazendo todos os dias. Eles estão preocupados em fazer com que a universidade volte à sua normalidade por conta das matrículas da Sisu. Mas, enquanto não negociar com todos os setores da educação, professores e técnicos servidores, a universidade não vai voltar à sua atividade normal. Então, o ministro nos chamou para demonstrar que ele está empenhado em negociar pelos servidores.

Vermelho: Então há chances da greve ser encerrada?
JP:
A greve só vai terminar a hora que o governo colocar concretamente uma proposta efetiva e positiva ao trabalhador. Caso contrário, não terá vestibular, não terá matrícula, vamos inviabilizar o segundo semestre. A disposição de luta ainda é muito grande da categoria. Não é possível depois de quase 50 dias de greve não termos nenhuma proposta deles [governo]. Isso é uma falta de respeito com a categoria. Inclusive nosso slogan agora é: “Se não negociar, não tem matrícula nem vestibular”.

Vermelho: O que efetivamente foi colocado na reunião?
JP:
Ele nos contou que o ministério está empenhado em intervir por um reajuste para os técnicos, porém não sabem se é possível fazer reestruturação de carreira, porque envolve um número muito grande de trabalhadores. Eles adiantaram que estão empenhados em resolver o problema dos professores, apresentaram a proposta afirmando que é o limite deles, e não haverá outra. Na visão do ministro, segue uma lógica interessante que dá um reajuste geral e empenho em garantir capacitação para valorizar as carreiras. Eles esperam o retorno das assembleias dos professores, esperando que eles aceitem essa proposta. Só depois de resolvida a questão com os docentes é que eles vão se debruçar sobre a proposta dos técnicos. Mas há ministérios que não terão propostas.

Vermelho: Então não haverá reajuste para todos os servidores?
JP: A afirmação categórica feita pelo ministério foi a seguinte: não dá para apresentar uma proposta agora e algumas categorias não terão reajuste. Como ministro da Educação ele se comprometeu a tentar o reajuste para o setor, mas já deixou claro que não tem pra todo mundo. A informação vem depois de uma reunião ocorrida com todos os ministros, que foram comunicados de que algumas pastas não receberão recursos. A prioridade é a vigilância estrema da conjuntura internacional de crise.

Vermelho: Qual é o índice que vocês estão pedindo?
JP: Nosso último reajuste foi em 2007, com impacto financeiro em 2008, 2009 e 2010. Em 2011 e 2012 não tivemos nada. Precisamos tentar corrigir esses dois anos sem reajuste e uma ampla reestruturação da nossa carreira, já que hoje temos o menor piso e menor teto entre os servidores da Esplanada. Queremos pelo menos a isonomia. Atualmente, nosso piso é de R$ 1.034 e estamos reivindicando no mínimo três salários mínimos, o que dá R$ 1.800. E o governo diz que haverá um impacto muito grande [na folha de pagamento]. Mas, avaliamos que não é grande já que se trata de um setor importante, que é a Educação, então deveria ser prioridade para o governo.

E vale lembrar que acabaram de aprovar uma isenção na ordem de R$ 14 bilhões para as instituições privadas [decreto 12.688 publicado em 19 de julho deste ano, que institui o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior (Proies), que assegura a estabilidade das particulares em grave situação financeira]. Vale, então, pontuar qual é a prioridade do governo, que hoje é o superávit e o pagamento de dívida e ajuda a empresários do setor privado. Ou seja, a lógica do governo é no mínimo confusa, que é priorizar o emprego privado ao invés do público, investindo muito mais na iniciativa privada.

Vermelho: O que o governo argumenta sobre a proposta da categoria?
JP: Eles [governo] argumentam que na atual crise não será possível e, além disso, houve um investimento durante mais de 10 anos na reestruturação de algumas carreiras públicas. Ora, não estamos pedindo tudo de uma vez. Façam uma contraproposta, coloca em patamares mais justos, levando em consideração a atual crise, não somos irresponsáveis. O grande problema é que nem sequer tivemos reunião para negociar, desde o final da greve do ano passado. Em todas as reuniões que tivemos o argumento é sempre o mesmo [a crise econômica mundial].
 
Vermelho: E isso causa um desgaste da categoria…
JP: Nós estamos perdendo funcionários. Os técnicos administrativos qualificados não ficam nas universidades públicas por causa dos salários. Há uma grande rotatividade nos setores. Em um concurso público de médicos e enfermeiros no Hospital de Clínicas de Goiás, por exemplo, dos 10 que entraram, hoje só tem três. Uma lei recentemente aprovada vai incluir 77 mil novos cargos de servidores na educação pública federal, por concurso público, entre professores e técnico administrativos. Só estes somarão 43 mil.

Vermelho: Do ponto de vista da carreira, a pauta dos técnicos nas universidades federais é a mesma dos professores, então. E se não houver entendimento sobre reestruturação, a greve será mantida?
JP: Sim, Nós seguimos uma lógica onde é preciso que o trabalhador se dedique ao Estado, onde tenha uma ampliação do desenvolvimento universitário. Nós apoiamos sim, porque a reestruturação da carreira é a forma mais correta de incentivar o trabalhador para progredir.

Vermelho: Esse é o posicionamento da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB)?
JP: Nós defendemos a greve dos trabalhadores, de maneira ampla e irrestrita, tendo em vista que a central defende os trabalhadores sempre. Não cabe a nós julgar se está certo ou errado, cabe ao trabalhador julgar suas demandas. E há, ainda, um apelo social por se tratar de universidade pública, que precisa ter pessoal bem remunerado para que possa haver qualificação e que a distribuição do saber tenha mais embasamento. Não é possível seguir a lógica do capital, onde o ensino privado tem prioridade. Então, apoiamos tanto os docentes quanto os técnicos e acreditamos que é um momento de luta e a universidade não pode ser punida pela crise gerada pelo capital. Inclusive argumentei isso na reunião: temos superávit primário, e guardamos as reservas para momentos que precisam como o de agora.

Vermelho: Aí chegamos ao cerne da questão, que é condução da política econômica do país? Quer dizer, o governo diz que não avançará mais na proposta, enquanto que os trabalhadores também não aceitam as argumentações do governo?
J
P: O governo não avança mais porque está numa lógica de subserviência ao capital, adotando medidas conservadoras. Porque não parar de pagar a dívida pública, por exemplo? Vivemos um momento de crise? Então não vamos alimentar o Fundo Monetário Internacional [FMI]. Deveríamos fazer um grande pacto para fortalecer o Estado, investindo no seu bem maior que é o trabalhador e suas estruturas, mantendo o serviço público funcionando com qualidade, e não o contrário, de alimentar os cofres da iniciativa privada, nem do FMI. É preciso fortalecer o mercado interno apoiando o funcionário público, mantendo o serviço funcionando e fazendo a economia interna girar. Não basta só baixar os juros, como vem sendo feito.

Vermelho:
Chegou-se a uma encruzilhada?
JP: Desde o governo Fernando Henrique Cardoso nunca teve uma movimentação tão grande na Esplanada de greves, ações conjuntas. Não que o governo Dilma se compare ao de FHC, mas falta habilidade para negociar com as categorias. Falta uma abertura de negociação concreta por parte do governo. E, por conta disso, não descartamos a possibilidade de uma ampla greve do funcionalismo público em defesa do salário, de um Estado forte para atender à população. Por que o que está na ordem do dia na Europa é a redução de salários do servidor, privatização. E não vamos deixar que isso aconteça aqui.

Vermelho: Vocês temem que eles ameacem cortar o ponto, por exemplo?
JP: Não. Eles não falam isso, mas estão cautelosos ao extremo. Durante a reunião foi dito o seguinte para nós: hoje a prioridade do governo é salvar empregos da iniciativa privada, alegando que nós do serviço público temos estabilidade, portanto, não perderemos o emprego.

Vermelho: Como vocês estão vendo a cobertura na mídia da greve e como fazer com que o público entenda a gravidade da situação dos trabalhadores?
JP: A mídia tenta confundir a população. E não explica, por exemplo, a situação dos médicos nos hospitais universitários, onde ele entra ganhando R$ 2 mil e acaba indo para a iniciativa privada para ampliar a remuneração, abrindo mão de dedicação exclusiva ao serviço público. Essa é a realidade do trabalhador, principalmente na região Sudeste. No Nordeste, todos querem ir para o Sul e o Sudeste, onde a remuneração é maior. Por isso faltam profissionais no Norte e Nordeste. Eles não denunciam também que mais de 30 mil trabalhadores nos hospitais universitários federais são terceirizados e precarizados. São 46 hospitais universitários no país. E esses terceirizados acabam trabalhando sem motivação nenhuma. Então aí entra a lógica da carreira. O trabalhador entra ganhando menos, mas tendo capacitação e incentivo de crescimento na carreira, ele acaba trabalhando mais motivado. E essa é uma prioridade da nossa pauta.

Vermelho: Vocês têm receio de o governo endurecer de vez na negociação?
JP: Não. Até agora eles têm falado em cortar o ponto. A AGU [Advocacia-Geral da União] quer entrar com improbidade administrativa contra os reitores, obrigando-os a efetuar os descontos nos vencimentos dos trabalhadores. Agora, isso é uma ingerência da AGU que, com isso, pretende acabar com a autonomia universitária que permite aos reitores tomarem decisões independentes do governo. A AGU está fazendo um desserviço à sociedade e deve repensar essa atitude.