Edgar Alan Poe não salva filme O Corvo da mediocridade

Não, esta não é a continuação (ou o remake) do clássico cult The Crow (1994) estrelado por Brandon Lee. O filho do mítico Bruce Lee morreu durante as filmagen daquele e, mesmo se este fosse o caso de um remake, John Cusack certamente não seria o protagonista. Este O Corvo, dirigido por James McTeigue (do satisfatório V de Vingança), conta a última história vivida pelo escritor Edgar Allan Poe antes da sua morte precoce em 1849, aos 40 anos.

Encontrado em estado catatônico num banco de praça em Baltimore (não se preocupe, isso é história, não spoiler), as causas da morte do poeta norte-americano até hoje são indefinidas, o que as tornam um terreno fértil para várias teorias. Essa é a premissa que O Corvo utiliza para seu roteiro, que começa relativamente bem, até o malfadado segundo ato que leva o longa para uma conclusão definitivamente tosca.

Quando uma mãe e sua filha são encontradas brutalmente assassinadas na Baltimore do século 19, o detetive Fields (Luke Evans, insípido como sempre) reconhece as pistas deixadas na cena do crime: são as mesmas escritas num dos romances do escritor Edgar Allan Poe. Ao procurar o poeta para dar um depoimento e auxiliar nas buscas (já que é óbvio ele próprio não ser o assassino), Fields se depara com um Poe falido, bêbado, mas ainda extremamente sarcástico.

Este é o ponto forte do longa. Apesar dos conhecidos altos e baixos da carreira de Cusack (para ficar apenas nos números, lembremos das atuações no suspense 1408 e no apocalíptico 2012), ele consegue passar, de forma efetiva, credibilidade à sua versão de Allan Poe. Se o roteiro de Ben Livingston e Hannah Shakespeare não se esforçasse tanto para tornar o filme um clichê, no sentido mais banal possível do termo, poderíamos dizer que O Corvo seria um marco na carreira de Cusack. Só que não, infelizmente…

Sequências tediosas

Voltando à trama. Allan Poe só decide ajudar nas investigações quando o caso se torna pessoal. Lógico. Na recriação de uma das tragédias literárias, em uma festa à fantasia (um clichê bem empregado), o misterioso assassino sequestra a mocinha Emily Hamilton (Alice Eve, que também está em cartaz em MIB III). Para salvar a amada, o escritor precisa ajudar a polícia a pegar o serial killer.

O romance, apesar de breve, é bem trabalhado, e é impossível não se encantar com a beleza e os traços marcantes de Eve no papel de uma jovem determinada que, em pleno século 19, pretende enfrentar o pai (Brendan Gleeson, em mais um papel severo) para se casar com o homem que ama. No caso, um poeta com poucos resquícios de ainda ser o “grande Edgar Allan Poe”.

Pois bem, a trama segue para um segundo ato recheado de sequências longas, tediosas e às vezes sem sentido. O que dizer da cena do cemitério, em que o auxiliar de Fields é esfaqueado, o próprio detetive toma um tiro, e só resta a Poe correr atrás do assassino em um bosque. Não antes de Luke Evans, numa atuação digna do "Framboesa de Ouro", gritar o óbvio “Vá atrás dele, Edgar!“. Patético.

Desfecho nonsense

Outro elemento falho do roteiro é a maneira que o serial killer escolhe para agir. E pare por aqui se não quiser saber fatos importantes da trama. Ele quer que Poe volte a escrever, estipula o jornal na qual a coluna sobre o caso deve ser publicada – o editor interpretado por Kevin McNally, de Piratas do Caribe, é uma boa surpresa -, mata um crítico literário que era desafeto de Poe e que, grande surpresa, era funcionário no jornal. Difícil descobrir de quem se trata, não? Pois, mesmo com todas essas dicas, a trama parece tão complicada para as mentes do escritor e do detetive que o assassino praticamente se entrega no último ato, provavelmente não acreditando na inapetência de seus perseguidores.

O desfecho é tão nonsense que é melhor não comentar. Até porque parte dele já nos é apresentado no início do filme: lembram que Allan Poe foi encontrado quase morto num banco de praça? Ninguém tem esperanças de uma conclusão feliz (ou de qualquer solução diferente) quando o desfecho é mostrado logo no começo. Bota anti-clímax nisso…

No fim das contas, O Corvo vale a pena pela atuação de Cusack, pela boa química entre o casal, pela competente direção de arte (com figurinos fiéis à época), e pelos coadjuvantes bem empregados. Com a exceção de Evans, claro. Até agora, não vi um filme em que ele tenha atuado bem, e esta já é a quarta vez, contando com Imortais, Os Três Mosqueteiros e Fúria de Titãs. E a lista deve continuar.

Em todo caso, não vá para o cinema com grandes expectativas. Com a mesma pegada de O Corvo, temos os filmes e a série Sherlock Holmes – e até o longa brasileiro O Xangô de Baker Street – como melhores opções de “suspense literário” em nosso cinema atual.

The Raven
EUA – 2012
Filme – 111 minutos
Direção: James McTeigue
Roteiro: Ben Livingston e Hannah Shakespeare
Elenco: John Cusack, Alice Eve, Luke Evans, Brendan Gleeson e Kevin McNally

Fonte: A Mosca Branca