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Deputadas elogiam voto do relator sobre aborto de anencéfalo

As parlamentares do PCdoB repercutiram positivamente o voto do ministro-relator Marco Aurélio Melo no julgamento da ação que pede a descriminalização do aborto em caso de feto anencéfalo, nesta quarta-feira (12), no Supremo Tribunal Federal (STF). A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ-foto) destacou que o ministro considerou inconstitucional a interpretação do Código Penal brasileiro sobre a interrupção da gravidez de feto anencéfalo.

“Pela importância do tema e em reconhecimento à brilhante argumentação do relator, solicito o registro deste voto nos anais desta Casa. Espero que a Câmara dos Deputados tome conhecimento dos argumentos apresentados à Suprema Corte e avance garantindo, em Lei, a possibilidade do aborto em casos de anencefalia”, disse a parlamentar.

Em seguida, a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA-foto) também saudou o ministro Marco Aurélio Mello, que defendeu a garantia legal de a mulher ter a opção de não esperar nascer uma criança sem cérebro. “O ministro fez um mergulho profundo nessa análise, que é uma análise humana, uma análise humanista e uma análise que vem, efetivamente, calçada nas questões de saúde, a sua principal argumentação”, disse a parlamentar.

Para a deputada, “é uma situação difícil a mulher sair da maternidade para enterrar a criança que não dura de 24 à 48 horas, e o ministro foi sensível a essa condição, exarou seu voto sob o aplauso das mulheres conscientes deste país que defendem a maternidade saudável e a opção que a mulher tem de interromper a gravidez de um feto anencéfalo”.

O Supremo analisa a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), ajuizada em 2004 pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), que defende a descriminalização do aborto em caso de gravidez de feto anencéfalo (sem cérebro). A entidade defende que existe ofensa à dignidade humana da mãe por ela ser obrigada a carregar no ventre um feto que não sobreviverá depois do parto.

Cárcere privado e tortura

O ministro Marco Aurélio Melo considerou procedente o pedido feito pela CNTS, para declarar inconstitucional a interpretação dada ao Código Penal que criminaliza a antecipação terapêutica de parto nos casos de anencefalia.

“A incolumidade física do feto anencéfalo, que, se sobreviver ao parto, o será por poucas horas ou dias, não pode ser preservada a qualquer custo, em detrimento dos direitos básicos da mulher”, afirmou o ministro. Para ele, “é inadmissível que o direito à vida de um feto que não tem chances de sobreviver prevaleça em detrimento das garantias à dignidade da pessoa humana, à liberdade no campo sexual, à autonomia, à privacidade, à saúde e à integridade física, psicológica e moral da mãe, todas previstas na Constituição”.

Em voto longo e baseado nas informações colhidas durante quatro dias de audiência pública realizada pelo STF para debater o tema, o ministro Marco Aurélio concluiu que a imposição estatal da manutenção de gravidez cujo resultado final será a morte do feto vai de encontro aos princípios basilares do sistema constitucional.

Para ele, obrigar a mulher a manter esse tipo de gestação significa colocá-la em uma espécie de “cárcere privado em seu próprio corpo”, deixando-a desprovida do mínimo essencial de autodeterminação, o que se assemelha à tortura.

“Cabe à mulher, e não ao Estado, sopesar valores e sentimentos de ordem estritamente privada, para deliberar pela interrupção, ou não, da gravidez”, afirmou, acrescentando estar em jogo a privacidade, a autonomia e a dignidade humana dessas mulheres, direitos fundamentais que devem ser respeitados.

Na interpretação do ministro, ao Estado cabe o dever de informar e prestar apoio médico e psicológico à paciente antes e depois da decisão, independente de qual seja ela, o que hoje é perfeitamente viável no Brasil.

Estado laico

Ao proferir seu voto, o ministro reforçou ainda o caráter laico do Estado brasileiro, previsto desde a Constituição de 1891, quando da transição do Império à República. “A questão posta nesse processo – inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual configura crime a interrupção de gravidez de feto anencéfalo – não pode ser examinada sob os influxos de orientações morais religiosas”, frisou.

Assim como ocorreu no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) sobre possibilidade de realização das pesquisas científicas com células-tronco embrionárias, em que o STF primou pela laicidade do Estado – para o ministro, as concepções morais e religiosas não podem guiar as decisões estatais, devendo ficar circunscritas à esfera privada. “O Estado não é religioso, tampouco é ateu. O Estado é simplesmente neutro”, concluiu.

De Brasília
Márcia Xavier