José Flávio Saraiva: Unilab e inserção internacional no Ceará

Por *José Flávio Saraiva

A história da inserção internacional do Ceará é oscilante. Ondas ascenderam e baixaram em conjunturas diferentes. Estudo original publicado pelo Instituto Brasileiro de Relações Internacionais – escrito por Bessa Maia e Leal Farias, no ano de 2006 – desvendou parte dessa lógica do ir e vir das relações internacionais do Ceará. Ora é um caso de internacionalização exemplar do Brasil subnacional, ora impera um olhar sonolento e equidistante das possibilidades externas.

Há uma sensação que a internacionalização se resume ao turismo internacional, a empréstimos do BID e Bird, além dos empreendimentos e apropriações externas do doméstico por grupos transnacionais. As lições do estudo de 2006 são atuais. Em que quadra estaria o Ceará de hoje? Há exploração racional das oportunidades no momento que se insere o Brasil de forma mais complexa na rede societária internacional? Talvez fosse hora para a atualização do estudo de 2006, então intitulado Do nacional-desenvolvimentismo à internacionalização do Brasil subnacional: o caso do Ceará.

Um novo capítulo da inserção internacional do Ceará são suas relações com a franja atlântica da África. Região do planeta que, apenas depois da China e seus satélites, cresce PIB anual em torno de 6% há cerca de uma década, o continente africano tenderá a manter esse padrão nos próximos anos. Há elevação da governança e melhoria na auto-estima das elites. Mas há em especial um avanço agressivo da pax sínica (não confundir com cínica) e a caça de matérias primas e minerais para o sustento das ambições da China.

O Brasil está alerta ao tema. E parece que o Ceará vem acordando para tal assunto. Os empresários já aproveitaram em parte essa brecha. Mas isso já vem de antes. Estratégico é o movimento de criação de uma universidade com as características da Unilab – Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira.

A Unilab, embora nacional e internacional, um esforço brasileiro, é uma universidade federal localizada em um dos corações de nosso Ceará. Tem todas as condições de ajudar na inserção internacional do Ceará com a África. Foi essa uma das mensagens do produtivo seminário lá realizado há duas semanas. Voltado para a cooperação internacional África-Brasil, o seminário permitiu analisar os entraves para a construção das relações Brasil-África. De preconceitos a visões modernas acerca da emergência da África contemporânea no sistema internacional na última década, tudo passou em revista. Professores africanos de várias matérias e seus colegas brasileiros puderam dividir opiniões, concordar e discordar no bom espírito acadêmico.

Lá lancei, com emoção, meu último livro. Intitulada África parceira do Brasil atlântico: relações internacionais do Brasil e da África no início do século XXI (Belo Horizonte: Traço Fino Editora, 2012), a obra foi escrutinada por pesquisadores, alunos e gente do Ceará, Brasil, África e Europa. A Unilab e o Ceará juntos têm muito a oferecer ao caminho da ciência, educação e profissionalização da internacionalização do Ceará. E aí talvez as ondas do Atlântico tragam mais mundo ao nosso. E possamos realizar os outros sonhos de Martins Filho.

*José Flávio Sombra Saraiva é Professor titular de Relações Internacionais da UnB

Fonte: O Povo