Sem categoria

Antonio Rondón: A proposta eleitoral de Putin

A apresentação da plataforma eleitoral preliminar de Vladimir Putin como candidato presidencial ocorre em condições diferentes das participações anteriores na contenda pela chefia do Estado russo.

Por Antonio Rondón*

Putin se dirige aos eleitores, depois de uma pausa de quatro anos no Kremlin, que lhe permitiu acumular experiência como primeiro-ministro no trabalho executivo direto, escutar as queixas da população sobre seus problemas e os herdados.

Por isso, o programa, dividido em seis capítulos, se inicia com um balanço de mais de uma década de governo, nos quais entrelaça seus anos de trabalho anterior como mandatário russo e os correspondentes a seu cargo de chefe de governo.

Entre as principais conquistas concretas que Putin mostra em seu programa como candidato, diferentemente de seus competidores, está ter tirado a economia russa de sua condição semidestruída na década de 1990 e a ter levado à posição de sexta economia do mundo ao final de 2011.

Ademais, a Rússia ocupa agora o terceiro lugar no mundo quanto à taxa de crescimento econômico do Produto Interno Bruto (PIB), só superada pela China e Índia, enquanto que a renda real da população cresceu 2,5 vezes nesse lapso de tempo.

A Rússia passou de uma inflação de 20 por cento no ano 2000 a 6,2 por cento em 2011, o desemprego se reduziu nesse período em 35 por cento, a população abaixo do nível de pobreza é agora duas vezes menor, enquanto que em 2010 houve 40 por cento mais nascimentos que no ano 2000.

Putin recorda, ademais, que no período 2008-2009, em pleno auge da crise econômica, o governo russo incrementou a ajuda social, mas, reconhece, os cidadãos resolveram problemas fundamentais e agora saltam à vista outros temas pendentes desde há tempos.
Muitos assuntos nos incomodam a todos como a pobreza latente, o negativo clima empresarial, a corrupção e a falta de efetividade de funcionários para resolver problemas essenciais dos cidadãos, incluída a segurança, admite o chefe de governo.

Analistas consideram que tais afirmações coincidem com estudos realizados entre participantes de protestos multitudinários, nos quais muitas pessoas expressam em Moscou seu descontentamento com a situação em geral, sobretudo, com a corrupção.

Isto reflete mais as exigências da classe média das grandes cidades, embora as demandas de grande parte da população fora dos centros urbanos sejam bem diferentes e isto deve ser levado em conta por todos os candidatos presidenciais, estimam analistas.

A plataforma de Putin se baseia em um total de um milhão e meio de e propostas de um grupo de trabalho multidisciplinar de especialistas e da Frente Patriótica de Toda a Rússia (FPTR), assinalou Nikolai Federov, presidente do Instituto de Estudos Sócioeconômicos e Políticos.
Muitas das iniciativas e conceitos introduzidos à discussão desse grupo levaram em conta as mais de 17 milhões de perguntas e preocupações recolhidas em meados de dezembro passado, quando Putin conversou por mais de quatro horas com a população pela televisão.

Seu programa propõe elementos novos como a criação do fundo estatal e municipal de habitação para garantir teto a famílias de baixa renda, algo que não existiu em duas décadas, recorda Federov. Tal plano deve ser posto em prática em um ou dois anos, enquanto que quase todo o programa e as medidas propostas por ele têm um limite concreto de entre cinco e seis anos para a ação.

Uma das principais tarefas que a plataforma eleitoral de Putin propõe se refere à efetividade econômica que passa por uma maior produtividade do trabalho e rendimento energético, parâmetros nos quais a Rússia está duas ou três vezes abaixo dos países desenvolvidos.

Para isso será necessária uma modernização econômica em grande escala e um aumento da atividade empresarial e dos investimentos, considera, ainda que o país deverá lutar para evitar a repetição de uma fuga de capitais como a de 2011: quase 85 bilhões de dólares.

Ademais, o chefe de governo considera importante tomar em conta os 143 milhões de russos que vivem nas cidades, para o que será necessária uma política de desenvolvimento mais além das grandes cidades.

Contudo, o experimentado político esclarece que a centralização de recursos em um centro federal permitiu dirigir o desenvolvimento de regiões economicamente atrasadas.
Nesse sentido, se pronuncia agora a favor de deixar grande parte dos impostos arrecadados às formações regionais e municipais para que contem com financiamento suficiente para seus projetos.

Por outro lado, propõe formar fundos especiais, com apoio do orçamento federal, para o desenvolvimento municipal de infraestrutura, zonas rurais, aquedutos, redes de esgotos, estradas, creches e ginásios desportivos, entre outros projetos.

Com respeito a aspectos essencialmente sociais o candidato às presidenciais de 4 de março próximo sugere melhorar a situação atual em que muitos cidadãos trabalham, recebem salários e ainda assim se mantêm abaixo da linha de pobreza.

No tema dos serviços públicos, sua qualidade e as tarifas dos mesmos, um dos temas mais tratados pelos candidatos, por ser um ponto sensível para a sociedade russa, o estadista busca atrair o investimento privado para resolver o dilema nessa esfera.

O próprio Putin chegou a ameaçar em uma das primeiras reuniões do gabinete, depois dos feriados de Ano Novo que, se vencer as eleições presidenciais, aplicará medidas organizativas no caso de funcionários que sejam incapazes de lidar com o mencionado problema.

Por outro lado, ao referir-se à perspectiva do desenvolvimento do país, constata que a economia russa baseada na produção de combustíveis e em um capital de base da época da União Soviética, já esgotou seus recursos e por isso é necessário mudar o modelo.

O chefe de governo considera que para criar 25 milhões de empregos nas duas próximas décadas será necessário aumentar os níveles de investimento até 25 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) e criar condições para acelerar a aplicação na produção de avanços
tecnológicos.

Outra das viragens importantes do citado documento é o conceito de que nesta nova etapa o papel dos órgãos da ordem pública deve ser apoiar e proteger a atividade empresarial, em lugar de lutar contra ela.

Ademais, Putin se pronuncia a favor de submeter as leis nacionais a uma ampla discussão com os cidadãos, o empresariado e as organizações sociais e sindicais.

Quanto à política externa russa, a proposta de Putin se mantém no marco das expectativas, tanto dentro como fora da Rússia, de uma maior defesa dos interesses nacionais e uma aproximação mais estreita no marco da Comunidade de Estados Independentes.

Assim, o primeiro-ministro busca reforçar a integração no espaço pós-soviético, um processo que tomou força com a entrada em vigor neste ano do Espaço Econômico Comum entre a Rússia, o Cazaquistão e a Belarus.

Ademais, Putin considera que em matéria de segurança coletiva deverá tomar em conta a posição da Rússia e evitar as medidas unilaterais nessa esfera, o que receberá nossa adequada resposta, assinala o documento.

As Forças Armadas contarão com armamento moderno, elevados salários e condições de vida, e deverão ser capazes de rechaçar qualquer ameaça externa e contar com grande mobilidade, afirma Putin em seu documento eleitoral.

Os oponentes

Diferentemente deste, o magnata Mijail Projorov, com uma fortuna pessoal de cerca de 18 bilhões de dólares, promete uma fórmula de programa de ideias curtas, saída da sugestão de seus assessores, que inclui jornalistas de televisão e a outras personalidades.

Projorov, do qual muitos recordan os bons nexos no passado com o governo, agora, depois de fracassar em seu projecto de reviver o partido de direita Causa Justa, propõe um programa que compara suas visões políticas, econômicas e sociais com as de Putin.

O multimilionário pretende posicionar-se como a representação do futuro e apresentar o chefe de governo como um símbolo do passado.

Mas as pesquisas estão muito afastadas de seus propósitos. O Centro Levada assinala que Putin tem por ora cerca de 42 pontos de apoio popular e Projorov conta apenas com um por cento de intenções de voto.

Outro aspirante à presidência, o líder do Partido Comunista da Federação Russa, Guennadi Ziuganov, também apresentou seu programa que se baseia em um resgate do controle estatal sobre os recursos naturais e esferas estratégicas do país.

Assim, Ziuganov propõe regressar o controle do Estado sobre os recursos naturais mediante leis como a dos Bosques, da Terra, do Código Acuífero e sobre solos.

O dirigente comunista defende nacionalizar, em estrito apego à lei, a banca e o setor energético, enquanto detalha um plano para lidar com a crise que, segundo ele, afeta a esfera aeroespacial, de navegação, de construção de máquinas e do complexo militar-industrial.
Ziuganov também propõe criar um governo de unidade nacional de patriotas e profissionais para lutar contra a desigualdade social.

Igualmente, se refere à necessidade de incrementar a ajuda estatal à esfera agrícola até mais de 10 por cento do PIB.

O dirigente comunista é partidário, ademais, de efetuar novas eleições parlamentares em finais deste ano e considera que o roubo de votos deve ser um delito sem data para prescrição.

A campanha eleitoral apenas começa, pois ainda se devem definir todos os candidatos na contenda. Por ora se trata de uma etapa de primeira apresentação de ideias ao público em uma competição na qual quem sobressai é Putin.

*Da sucursal da Prensa Latina em Moscou