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Brasil além da eterna promessa de ‘País do futuro’

Próxima década mostra cenário exuberante, segundo alardeiam especialistas e mesmo porta-vozes do governo, mas exige atenção redobrada para resolver questões que gabaritem o Brasil a deixar de ser uma eterna promessa de “País do futuro”
 

OK. Vamos considerar que os consultores Maias tenham se equivocado em suas previsões e o mundo não acabe em 2012. A notícia soa fantástica sob diversas perspectivas. Um deles tocaria, em especial, o Brasil, uma vez que se vive uma euforia em território nacional causada pelas oportunidades que se abrem ao País na próxima década.

As animadoras projeções apontam para uma meta de crescimento da economia brasileira na ordem de 4,5% ao ano para os próximos dez anos e foram apresentadas por Fabio Giambiagi, um dos autores de “2022: Propostas para um Brasil melhor no ano do bicentenário”. O economista exibiu o gráfico durante um evento da Brasscom (Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação) em São Paulo.

“O Brasil fez muitas coisas positivas ao longo dos últimos 15 anos e hoje está muito melhor em comparação ao começo da década de 90. Mas não podemos nos enganar por um conjunto de elementos do ambiente econômico internacional”, pondera o especialista, sinalizando que o mundo voltou a ser um lugar bastante hostil nos últimos meses. Em meio a isso, o País cresceu, ocupou gente e chegou a uma taxa considerada como “pleno emprego”, com apenas 6% de desempregados.

Some o “pleno emprego” ao envelhecimento da população e à saturação no processo de migração do campo para os centros urbanos, e verá o surgimento do desafio da produtividade, que pode emperrar o futuro maravilhoso. Afinal, como produzir mais sem ampliar os recursos humanos? Só investimentos em educação podem responder tal pergunta. “Vamos encarar limites”, adverte o economista, salientando que o cenário desenhado no livro foi feito em 2010, e já é prudente fazer uma redução nas projeções.

Perigosa autocomplacência

Desafios – que, convenhamos, são inerentes a toda evolução – à parte, o contexto brasileiro nunca antes pareceu tão favorável. Parece que chegou a hora de jogar no lixo o slogan que há algum tempo ganhou contornos de chacota e que nos taxa como o eterno “país do futuro”. Fundamental transformarmos o Brasil numa nação do presente. “O momento é glorioso. Há uma janela de oportunidade”, reforça Antonio Gil, o otimista presidente da Brasscom, que enxerga um povo que trabalha duro e revela confiança para atingir seus objetivos.

O executivo lembra que o País respondia, no ano passado, pela sétima economia do globo, podendo chegar à quinta posição nesse ranking em 2022. Na onda de avanços, a entidade espera que o mercado de tecnologia e terceirização de processos de negócio (BPO, na sigla em inglês) salte dos 85 bilhões de dólares verificados em 2010, para algo entre 150 bilhões e 200 bilhões de dólares no intervalo de doze anos, com as exportações com base no Brasil sendo multiplicadas oito vezes, saindo de 2,4 bilhões de dólares para 20 bilhões de dólares. Atualmente, cerca de 1,8% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro destina-se à TI, que lidera investimentos na América Latina.

Rogério Oliveira, presidente do conselho da Brasscom, observa três componentes e aspectos econômicos afetando e abrindo oportunidades à TI. O primeiro, e bastante batido, refere-se à transformação social vivida com expansão da classe média brasileira; o segundo ponto toca telecomunicações, com volumes de acessos chegando à casa dos milhões; por último, o surgimento de novos conceitos tecnológicos (nuvem, por exemplo), que descem à base da pirâmide e chegam a empresas de menor porte em busca de eficiência.

“O perigo do bom momento é autocomplacência”, balanceia Gil, enfatizando que o momento é olhar o País dentro de uma perspectiva de longo prazo, com atenção a temas de fundo que muitas vezes ficam esquecidos na correria do dia a dia. A ordem é atacar problemas fundamentais – e aqui entra a famigerada mão de obra escassa e o desafio da produtividade já citado acima.

Agora ou nunca

Enquanto o capitalismo torna fronteiras cada vez mais abstratas, a indústria nacional de TI parece um tanto apática. Soa como se houvesse uma dificuldade no trato com uma economia global, pois há indicação de redução nas exportações. Em meio a isso, alguns poucos provedores nacionais conseguem sucesso ao estabelecer-se fora do território brasileiro. Na outra frente, vê-se um aquecimento local com a chegada de indústrias estrangeiras interessadas em uma fatia desse mar de oportunidades que representa o mercado doméstico, que cresce a taxas atrativas em um período onde a situação econômica internacional apresenta-se incerta.Nelson Barbosa, secretário-executivo do Ministério da Fazenda, deixa claro que interessa ao poder público ter uma indústria nacional forte composta tanto por representantes locais quanto estrangeiros. “Queremos as duas coisas. Há espaço para todo mundo”, estabelece.

Há uma oportunidade única para desenvolver o mercado interno e, igualmente, conectar-se à economia global. “Há um interesse local e um momento único. Precisamos surfar essa onda. É agora ou nunca. A indústria de TI tem de dois a três anos para tornar-se relevante em um contexto global”, arrisca Cassio Dreyfuss, vice-presidente de pesquisa do Gartner. Dá para ver que há uma rota cheia de percalços para transformar o Brasil no país do presente em 2022, isso, claro, se os consultores Maias não tiverem acertado suas previsões sobre 2012.

Hora da exceção

Enquanto caminhamos em direção ao futuro, a tecnologia avança de uma forma absurda rumo a um patamar mais barato e massificado. Estima-se que nos próximos dez anos, o mundo gere um trilhão de dólares de oportunidades adicionais em tecnologia (hoje, algo da ordem de dois trilhões). O Brasil estaria preparado para abocanhar uma fatia considerável desse mercado? O governo tenta se mexer para viabilizar isso. Recentemente, lançou programas para suportar inovações, formação de capital humano, infraestrutura e competitividade (leia-se Ciência Sem Fronteira, Pronatec, Plano Nacional de Banda Larga e Brasil Maior).

“Formar pessoas e criar condições de Pesquisa & Desenvolvimento adequadas são apostas que sempre dão certo”, comenta o secretário de política de informática do Ministério de Ciência e Tecnologia, Virgílio Augusto Fernandes Almeida, apontando que existem esforços políticos independentes, mas correlacionados aos esforços específicos em TI. O executivo bate, ainda, na tecla da atração de players em semicondutores e displays acarretando expansão de outros segmentos da economia e que ajudariam a reduzir o déficit na balança comercial da indústria eletroeletrônica. Outra frente direciona-se para defesa cibernética e computação em nuvem. “Há setores transversais que são essenciais, além de direcionamentos específicos de tecnologia e telecomunicações”, pontua.

Fonte: Por Felipe Dreher, jornalista da CRN