Comunicação – Venício de Lima: “Concessão é terra de ninguém”

Na noite da última sexta-feira, dia 16 de setembro, a Universidade Federal do Ceará através da Coordenação do Curso de Comunicação Social em parceria com o Coletivo Brasil de Comunicação (Intervozes), iniciou o Ciclo de debates “A Sociedade quer discutir a sua mídia”.

O evento, realizado no auditório da Reitoria da UFC, tem como objetivo promover consulta pública sobre um novo marco regulatório para a comunicação e também buscar a efetivação das resoluções aprovadas na I Conferência Nacional de Comunicação, realizada em 2009.

Como convidado para discorrer sobre o tema “Donos de mídia ou mídia sem dono”, Venício de Lima, o professor da Universidade de Brasília (UNB), fez um balanço histórico sobre a detenção do poder da comunicação no Brasil. Ele dividiu sua exposição em tópicos: infraestrutura da comunicação, propriedade e sistema de concessões.

Para o professor, o Brasil é um caso particular quando se refere à infraestrutura de mídia, envolvendo aspectos culturais, como o acesso a leitura tardia. “A imprensa para existir depende da capacidade dos indivíduos de lerem e isso começou tarde demais”, apontou.

Venício pontuou, dentro de uma perspectiva histórica, que a relação da imprensa com o Estado sempre foi complicada devido a certa proximidade. Ele exemplificou que mesmo com a “reforma” da imprensa na década de 50, a dependência com o Estado continuou. “Vimos formas diretas de corrupção. O Estado comprava jornalistas, existia o controle oficial de cotas de papel e da publicidade governamental, ou seja, o Estado é a fonte de recurso que faz com que a imprensa viva”.

Segundo o professor, os principais grupos de mídia que se consolidaram com essa vinculação ao Estado, hoje se revelam independente. “Os Diários Associados e as organizações Globo se forjaram na crise do Getúlio Vargas e assim conseguiram se manter independentes”.

Sistema de concessões

Além dos aspectos de infraestrutura, Venício destacou como questão principal o processo de concessões, definindo como diferenciado de qualquer serviço público. “O processo é assimétrico a qualquer outro serviço. O Estado não tem autonomia. É necessária uma decisão judicial e os prazos são dilatados, isso não existe em lugar nenhum do planeta”.

Para o professor, as concessões ainda são moedas de barganha política e até hoje as renovações de outorgas são feitas pelos próprios parlamentares, e muitos deles são proprietários indiretos. “Já presenciei cinco deputados presentes na renovação de suas próprias outorgas”, denunciou.

O professor também afirmou que, segundo o Ministério das Comunicações, não existe a condição de o órgão de fiscalizar quem são os concessionários. “O processo licitatório para concessões é terra de ninguém, porque o Ministério não fiscaliza e a Anatel também não”.

Propriedade cruzada

Uma das discussões mais complexas durante a CONFECOM foi a questão da propriedade cruzada, ou seja, um sistema de comunicação não pode obter vários veículos de mídia. De acordo com Venício, os grandes grupos de mídia no Brasil se consolidaram como multimídia justamente porque não existe fiscalização sobre esse artigo previsto na Constituição. “Nossa mídia é concentrada tanto no ponto de vista vertical quanto o horizontal. Isso resulta em uma arquitetura de mídia onde fazem parte poucos grupos e é nessa encruzilhada que precisamos discutir um novo marco regulatório”, afirmou.

Para o professor os desafios são muitos, mas houveram avanços nas discussões e se descortinou um processo de diálogo mais amplo na sociedade. “E isso é necessário para garantir que o indivíduo possa buscar informação, ser informado e, principalmente, ter voz”, concluiu.

O Ciclo de Debate continua com mais atividades neste sábado. Veja aqui o restante da programação.

De Fortaleza,
Ivina Carla (estagiária do Portal Vermelho)