Câmara Federal debate drogas no Acre

 

 O combate ao tráfico de drogas, a recuperação de dependentes e sua reinserção social só alcançarão resultados práticos no Brasil se o Governo Federal destinar mais recursos financeiros e rever suas políticas públicas que foram criadas ainda no tempo em que a maconha era a substância ilícita mais consumida no país. Esta é a síntese da audiência pública realizada nesta segunda-feira no auditório da Aleac pela Comissão Especial sobre Políticas Públicas de Combate às drogas da Câmara Federal.
“Considerando que a bebida alcoólica é a porta de entrada para as drogas ilícitas, o Governo tem que ter coragem de tomar posições mais duras contra o seu consumo, ampliando a margem de imposto, como está fazendo com o cigarro, e aplicar estes recursos na recuperação de dependentes químicos e na prevenção ao tráfico e consumo”, defendeu o deputado federal Gilvaldo Carimbão (PSB-AL), relator da Comissão.
A audiência teve a participação, também, da deputada federal Perpétua Almeida (PCoB), que coordenou os debates, do deputado federal Pastor Eurico (PSB-PE), de 13 deputados estaduais, representantes do Governo, do Ministério Público Estadual, casas de acolhimento e recuperação de dependentes químicos, ONGs, escolas, autoridades policiais e da área de saúde. O Acre foi o 19o Estado a receber os integrantes da Comissão que seguiu ainda nesta tarde para Porto Velho (RO) e amanhã se reúne em Cuiabá (MT).
O deputado Elson Santiago (PP), presidente da Aleac, comemorou a visita dos parlamentares federais e elogiou a presença de mais da metade do parlamento estadual no evento. “Ter no plenário mais da metade dos deputados em plena segunda-feira mostra o compromisso de todos com a causa”, disse ele. Participaram da audiência os deputados Helder Paiva (PR), vice-presidente; Ney Amorim (PT), 1o secretário; José Luis Tchê (PDT), 2o secretário; Lira Moraes, 3o secretário; Moisés Diniz (PCdoB), líder do Governo; Geraldo Pereira, líder do PT; Astério Moreira (PRP), Major Rocha (PSDB), Marileide Serafim (PMN), Chagas Romão (PMDB), Eber Machado (PSDC) e Eduardo Farias, líder do PCdoB.
A deputada Perpétua Almeida explicou que a meta da Comissão em sua visita aos Estados é colher informações e sugestões para o relatório final que deverá ser apresentado em outubro deste ano para poder justificar a apresentação de emendas parlamentares ao Orçamento da União que serão destinadas a este setor. “Não consigo ver o Congresso Nacional e a presidente Dilma discutindo este tema sem ouvir o Acre, que faz fronteira com dois países amigos, irmãos, mas que são os maiores produtores mundiais de cocaína do mundo e que tornam nosso Estado num dos maiores corredores de drogas do País”, justificou Perpétua.
Recursos
Carimbão lembrou que não é combatendo o tráfico nas fronteiras que o Brasil vai solucionar o problema e impedir o avanço das drogas no país. “São mais de 1.600 mil km de fronteira só no Acre com o Peru e a Bolívia, os dois maiores produtores de cocaína do mundo. É preciso ampliar os recursos para o combate ao tráfico e também à recuperação dos dependentes para que não haja reincidência”, disse, adiantando que vai incluir em seu relatório final a necessidade de que as empresas também criem uma cota de vagas aos jovens que deixam as casas de recuperação, à exemplo do que fazem hoje com os portadores de deficiências. “Ninguém quer dar trabalho para um ex-maconheiro”, argumentou.
O deputado federal Pastor Eurico, titular da Comissão, comentou que no Brasil existem fanáticos que desejam até a pena de morte para os usuários de entorpecentes, mas também há os que defendem uma segunda oportunidade para todos. Ele confidenciou aos participantes da audiência que, assim como o deputado Carimbão, foi vítima de traficantes com tanta violência que ambos poderiam ser defensores da pena de morte, mas preferiram defender a sua recuperação. Eurico relatou que em estados e datas diferentes, ele e um filho foram sequestrados e Carimbão teve uma filha sequestrada por traficantes. “A guerra contra o tráfico e pela recuperação dos jovens não tem partido, todos têm que dar as mãos e ninguém pode avocar para si a solução do problema”, disse.
O procurador de Justiça, Carlos Maia, coordenador da Defesa da Infância e da Juventude do Ministério Público e o promotor Almir Fernandes, do Juizado da Infância e da Juventude, fizeram pronunciamento concluindo que o maior problema enfrentado por ambos é a falta de um local para encaminhamento de dependentes para tratamento, pois as entidades trabalham com recursos escassos e o Estado não atende este público. Os dois defenderam uma ampliação das parcerias do Estado com as igrejas e outras entidades.
O pastor Wellington Antunes, do Ministério Peniel, que mantém a casa de recuperação Desafio Jovem Peniel, observou que o Governo do Estado tem destinado recursos paras as casas de recuperação, mas não tem considerado o crescimento da demanda por vagas. “É preciso rever os convênios. É angustiante quando a gente tem que dizer que não tem vagas, volte outro dia, sabendo que muitos não voltarão”, comentou.
O psiquiatra José Rosa Paulino, diretor do Hospital de Saúde Mental do Acre (Hosmac), informou que o Governo já garantiu a volta das vagas destinadas à desintoxicação dos dependentes no Hospital de Urgência e Emergência de Rio Branco (Huerb). É que, com a reforma do hospital, estes pacientes tiveram que ser removidos para o Hosmac que, segundo ele, deve ser exclusivo para doentes mentais.
Mais Estado
Em sua intervenção na audiência pública desta segunda-feira, o deputado Eduardo Farias defendeu maior presença do Estado junto às casas de recuperação e comunidades terapêuticas que acolhem dependentes químicos. “É preciso definir uma fonte de recursos, como a taxação de cigarro e álcool, como em Alagoas e promover a terceirização do atendimento através de ONGs e Igrejas, com supervisão do Estado”, defendeu.
O deputado Astério Moreira disse que a repressão ao tráfico é imprescindível e deve ser ampliada com maior alocação de recursos para os estados de fronteira e um maior quadro de agentes, além de equipamentos como helicópteros. Mas também defende a ampliação dos recursos para a recuperação, pois disse que o esforço tem sido apenas simbólico tanto do governo estadual quanto do município e da União.
Para o deputado Geraldo Pereira (PT), o Governo Federal precisa desde já definir um percentual da arrecadação do petróleo do Pré-Sal para ser investido em educação em período integral para as crianças. . “O segundo tempo em todas as escolas pode ser a salvação da lavoura”, disse. Pereira também contestou a informação de que existem duas mil bocas de fumo em Rio Branco. “Considerando que uma boca de fumo é uma empresa e que cada empresa tem de ter no mínimo 50 consumidores, chegaríamos ao número de um milhão de consumidores só em Rio Branco”, calculou.
Penas alternativas
O líder do Governo, deputado Moisés Diniz, justificou o alto índice de presos no Acre pela baixa aplicação de penas alternativas no Estado. Segundo ele, em Brasília 51% dos condenados vão para regime aberto ou semi-aberto, enquanto no Acre este índice não chega a 20%. “O garoto rouba um bicicleta e mandado para a escola de bandidos. É preciso debater com o Poder Judiciário”, sugeriu.
Para Moisés, os empresários acreanos também precism participar destes debates, pois até hoje não se tem notícias de que eles contribuam para com as entidades de recuperação. “Em Cruzeiro do Sul e Tarauacá, a violência cresceu assustadoramente com a abertura da estrada e só reduziu graças às igrejas evangélicas. Nos locais mais distantes as igrejas são erguidas mesmo que cobertas de palhar e aqueles jovens que viviam drogados hoje estão virando pastores”, revelou.
Moisés também defendeu aumento de recursos para a Polícia Federal que sequer possui um helicóptero e mais de 1600 km de fronteiras para patrulhar. “Jordão é região de fronteira. As drogas estão chegando lá nas cabeceiras dos rios”, disse.
Henrique Corinto, subsecretário de Justiça e Direitos Humanos, sugeriu a constituição de um fórum interinstitucional permanente para debater o problema. Ele também considera fundamental a participação do Poder Judiciário nos debates, pois entende que há distorções entre as penas aplicadas pela Justiça Federal e a Estadual. “Condenados por tráfico internacional pela Justiça Federal têm pena equivalente a 1/3 dos condenados pela Justiça Estadual”, comparou.
O relator da Comissão, deputado Carimbão, apoiou a iniciativa e anunciou que participará do Forum participando das reuniões sem despesas para o Estado ou para a Câmara Federal. “Pago as passagens e as refeições”, disse, afirmando que o Acre pode ensinar o caminho para o Brasil no combate e prevenção às drogas. Perpétua anunciou que o debate realizado na Aleac será transmitido pela TV Câmara.