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Política externa turca: Estado laico e sensibilidade islâmica

A terceira sucessiva vitória eleitoral de Erdogan, com crescente percentual de votos, representa – em grau elevado – produto da incompetência de seus adversários para perceberem a nova realidade que tem sido conformada no país ao longo dos últimos oito anos e meio.

Por Georges Pezmatzoglu, no Monitor Mercantil

Uma parcela majoritária da opinião pública tem abolido as linhas que separam o estado laico e a sensibilidade islâmica, exatamente como as tinha traçado o establisment kemálico, conformando um mix que influencia, decisivamente as críticas opções governamentais, tanto na política externa, quanto na interna.

Com relação à política externa, as opções de Erdogan, com ponto de partida a recusa de permitir a passagem de tropas norte-americanas pelo território turco na primavera de 2003, cujo objetivo era o ataque do Iraque pelo norte, até os dramáticos acontecimentos no litoral de Gaza, envolvendo o navio Maví Marmará, há um ano, representam uma guinada irreversível da política externa turca.

Para o futuro próximo, a solidariedade às populações muçulmanas e países constitui um caminho sem volta obrigatório, tanto para o Erdogan, quanto para qualquer sucessor seu. Qualquer papel possível da Turquia entre os EUA, a União Européia e o Mundo Árabe-Muçulmano deverá estar próximo em ponto de referência à aceitação acima e só.

A definição da política externa turca, pelos objetivos internos, principalmente, foi fator decisivo para a conformação da política externa de Mustafá Kemal "Ataturk" (Pai dos turcos) e dos mantenedores de sua herança: o isolamento pelo Mundo Árabe-Muçulmano, funcionava, também, como blindagem da sociedade turca contra influências externas, enquanto a "relação especial" de cooperação militar com o Estado de Israel que formalizou a liderança militar turca no início de 1996, não tinha como alvo único a Síria, mas era apoiada sobre a preocupação e a incerteza com relação as evoluções no total dos países muçulmanos.

Aliás, até a aliança com os EUA a partir de 1947 e depois, assim como a integração a uma aliança militar ocidental, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), após 1952, blindava mais o autoritarismo laico dos herdeiros de Kemal, do que evitava uma ameaça soviética de duvidosa representatividade.

Assim, a guinada da política externa, iniciada pelo Abdullah Ghul e concluída pelo ministro de Relações Exteriores de Erdogan, Ahmet Davutoglu, não é somente continuação de sua eficácia quanto a consolidação da influência e suporte no Grande Oriente Médio, mas encontra-se em continuação direta com os equilíbrios internos da Turquia.

Tudo isso é de importância estratégica, considerando que define limites, tanto em qualquer reaproximação com os EUA, quanto também com futuro da negociação de integração à União Européia, mesmo caso desapareçam todas as reservas atuais e oposições da França e da Alemanha.